Os avanços em matéria de direitos humanos no Qatar “tardam” e “não são consequentes”, defende a Amnistia Internacional Portugal, a seis meses do arranque do Mundial de futebol, cuja preparação tem causado mortes e abusos de trabalhadores migrantes.

Para Paulo Fontes, diretor de comunicação e campanhas, nos últimos tempos “têm-se visto muito poucos passos, e os que foram sendo dados não são consequentes”, o que é “um problema muito grave” a seis meses do início da competição.

Em entrevista à Lusa, Paulo Fontes explica que, além das já levantadas questões quanto aos trabalhadores, cujos abusos “prevalecem, com 12 horas de trabalho por dia, sete dias por semana, por meses ou anos a fio sem um único dia de folga”, multiplicam-se os relatos de discriminação e racismo.

“Empresas que dizem, por exemplo, que se o trabalhador é africano, consegue aguentar mais o calor, e metem-no a apanhar mais sol, durante o dia. Há diferenças de salários entre pessoas da Tunísia, das Filipinas, ou do Quénia, em que os tunisinos ganham bastante mais que os quenianos. No fundo, estes problemas prevalecem, apesar de alguns passos legislativos para que sejam minorados, na prática isso não acontece”, denuncia.

Um dos casos recentes prende-se com os trabalhadores de segurança, objeto de um alerta em abril por parte da Amnistia Internacional, que os acompanha desde há muito.

O relatório, que tem “Eles pensam que somos máquinas” como título, relata a forma como guardas são forçados a trabalhar 12 horas por dia, sete dias por semana, não respeitando a lei qatari, que estipula um dia de descanso semanal, e aplicando deduções de salário arbitrárias, com um homem citado no documento a descrever a experiência de trabalho como “sobrevivência dos mais fortes”.

A Amnistia Internacional Portugal pede, assim, que as autoridades “implementem mecanismos de verificação e garantia de que a lei é colocada em prática, porque a impunidade por parte dos empregadores é contínua, prevalece e dá azo a estes abusos”.

Olhando para soluções, o que as autoridades qataris podem fazer, sugere a Amnistia, “é uma mudança na legislação, e uma mudança efetiva no sistema de ‘kafala’, de patrocínio dos empregadores com os migrantes e que faz com que na prática os trabalhadores fiquem superdependentes dos empregadores”.

“Não podem mudar de trabalho, pedir os dias de folga a que têm direito, não podem pedir os seus direitos, mudar de trabalho, ficam ali quase em regime de escravatura, ligados a este seu empregador. Numa definição daquilo que a Organização Internacional do Trabalho considera como sendo trabalho forçado. Há trabalho forçado devido à legislação no Qatar”, resume.

Mecanismos de verificação e controlo são outra solução apontada, pedindo ao mundo que possa fazer “pressão a todos os níveis”, a nível da sociedade civil.

As declarações do presidente da FIFA, Gianni Infantino, em maio, quando confrontado já este mês com as milhares de mortes que têm sido reportadas – e que o Estado qatari nega – na construção de infraestruturas e outros trabalhos, têm gerado polémica.

“Quando se dá trabalho a alguém, mesmo em condições difíceis, dá-se-lhes dignidade e orgulho. Não é caridade. Não se faz caridade”, declarou.

Para Paulo Fontes, isto “é olhar para a questão na forma contrária ao que devia ser”, porque “a diferença de poder entre empregadores e trabalhadores não dá dignidade”, com exemplos da construção à segurança e a trabalhadoras domésticas, seguindo-se a “mortes inexplicadas em que os relatórios médicos são feitos à pressa”.

“O líder máximo da FIFA, nesta fase em que o organismo já deveria ter um compromisso grande e sólido com a melhoria dos direitos no Qatar, é completamente inconcebível, uma alienação da realidade e muito preocupante”, atira.

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