Aos 21 anos, atual número 149 do ranking ATP, vive desde os 15 no CAR Jamor. Uma decisão conscientemente tomada, seguindo o conselho do antigo treinador na Maia.

Tem uma direita poderosa e Roger Federer como ídolo. Procura a consistência e um serviço melhor. Bebe shots de vinagre para recuperar.

Em pequeno, no Porto, ao lado do irmão e dos avós, ia ver os aviões a levantar voo e gostava de ter sido piloto.

Falou com o SAPO DESPORTO num banco com vista para os courts do Jamor, em Oeiras.

Frequenta o CAR do Jamor (Centro de Alto Rendimento do Jamor) desde os 15 anos?

R: É verdade.

O que o fez vir parar aqui? 

R: Bem, na altura treinava na Escola de Ténis da Maia, com o professor João Mário.

Que foi o primeiro “culpado”?

R: Foi o primeiro culpado disto tudo (sorrisos). Estive lá sete ou oito anos, enquanto treinava na Maia. Tive um convite e vim para o CAR. O João era muito apologista que viesse juntar-me ao CAR, porque achava que era um bom caminho, o caminho certo, devido a toda a equipa, à qualidade dos treinadores e o ambiente também era mais específico em termos de escola e tudo mais. Era mais fácil para treinar mais horas.

O tenista Henrique Rocha precisa desse ambiente específico, mais dedicado?

R: Sim, claro. Acho que é essencial para estarmos totalmente focados nisto. Decidi aos 15 anos vir para cá (CAR Jamor), fui bom aluno e consegui acabar a escola, embora o meu foco fosse mais o ténis. Treinava todas as semanas, várias horas por dia, andei na escola à noite, o que me permitiu ainda estar mais focado no ténis.

Ténis e estudos de mãos dadas até quando?

R: Vim para cá no 10.º ano, fiz a escola online durante o dia e ajustava bastante os horários. Do 10.º ao 12.º ano tinha aulas das 18h30 às 23h, mais ou menos. Durante o dia treinava das 9h00 às 11h00 e à tarde ainda conseguia gerir o treino físico. Eram dias complicados, admito. O cansaço depois de um dia de treino, estar atento nas aulas, nem sempre era fácil. Mas era a minha vida.

Depois colocou as “fichas” todas no ténis. Entrou nalguma universidade? 

R: Não entrei, acabei com a média de 14 e tal...No exame da matemática não consegui passar e precisava desse exame para me candidatar.

Para que faculdade? 

R: Se tivesse de escolher, provavelmente iria para Economia. Era para onde estava inclinado, o que queria na altura. Mas também sempre tive um bocadinho, uma cena na cabeça, que era ser piloto, não sei porquê. Sempre gostei de ser piloto.

Não é, mas pelo menos viaja muito no ténis, de torneio em torneio? 

R: Sim, já estou muito habituado. Se calhar ganhei um bocadinho disso desde que era pequenino que ia com os meus avós e o meu irmão (Francisco Rocha) para o aeroporto do Porto. Íamos ver os aviões a levantar voo.

“Anda comigo ver os aviões...”. tal como na música! 

R: É verdade (sorrisos), já cantava o Miguel Araújo ... ia com os meus avós. O meu irmão sabia as marcas dos aviões todas, via um avião ao fundo e dizia: este é um Boeing. Acho que, desde aí, desenvolvi esta parte de gostar tanto de viajar. Agora viajo com muita frequência por causa do ténis e é uma das partes que mais adoro.

Faz muitas viagens, muitos torneios. Há uns anos, o Gastão Elias disse que, às vezes, nos torneios Future e Challenger, tinha muita dificuldade em retirar dinheiro dos torneios e havia torneios que serviam para pagar as próprias viagens e para participar noutro torneio. Já passou essa fase? 

R: Sim. Já estou a jogar Grand Slams. A partir do momento que começas a entrar nos qualifying dos Grand Slams, começas a passar rondas, neste caso, já consegui entrar no quadro principal (Roland Garros)...Mas, há torneios em que se perdesse na primeira ronda de um Challenger, na América do Sul, se calhar fica ali um bocadinho...  

Apertado? Mas hoje os tenistas conseguem ganhar muito mais dinheiro. Ou não? 

R: Na época toda, ganhamos mais dinheiro do que o que gastamos. Neste momento, se calhar se não jogar tantos qualisde Grand Slam, fica mais complicado. Mas um quali de um Grand Slam dá 10 Challengers. E, os Challengers estão a pagar mais. Do ano passado para este ano, há diferença e todos os anos têm subido muito. Um vencedor de Challengers 125 já dá cerca de 20 mil euros. Claro que não ganhamos Challengers todas as semanas, como é óbvio, mas, fazer meias e finais, já dá uma boa bagagem.

Aplaude, então, o aumento do número de torneios?

R: Sim, claro. Acho que acima de tudo, a nossa relação com a ATP, organização de torneios e jogadores, está cada vez mais a melhorar. Acho que os Grand Slams podem ainda evoluir muito mais. Ainda há pouco tempo houve essa carta de todos os melhores jogadores. Porque de facto, a percentagem que os Grand Slams dão de prize money é muito reduzida quando comparado com os outros desportos.

Conquistou um Challenger, em Múrcia, no ano passado, um Future, foi o mais jovem de sempre e primeiro português a fazer os quatro Grand Slams, fez a estreia no quadro principal em Roland Garros. Sente-se um bocadinho precoce, quando comparado com o Nuno Borges ou o João Sousa. 

R: Já disse isto várias vezes, cada um tem o seu caminho, os seus timings. O primeiro não vai ser necessariamente o melhor e o último, não será o pior. Consegui ter a vantagem de ser, mais cedo, um bocadinho mais maduro, talvez. E, sem dúvida, que a oportunidade de vir para aqui desde os 15 anos foi reflexo disso.

Veio para o CAR mas o seu irmão, Francisco Rocha, foi para os Estados Unidos, ingressou no ténis universitário. Nunca pensou ir?

R: Decidi vir para cá aos 15 anos, tirei um bocadinho logo isso da minha cabeça. E a verdade, é que desde daí, sabia que queria seguir a parte profissional do ténis. Tinha capacidades desde miúdo, aos 18 anos consegui ganhar um Future. Sabia que aqui era o melhor caminho para mim, segui este caminho e espero continuar por cá.

Está a retirar os dividendos da aposta no CAR?

R: Tudo isto me ajudou a ser um bocadinho, se calhar, mais precoce do que a realidade portuguesa. O João e o Rui foram para a Espanha muito cedo, é um ambiente diferente, ainda mais longe de casa. Claro que são grandes oportunidades para eles e foram onde evoluíram mais se calhar na carreira, mas estar aqui tão perto de casa, e ao mesmo tempo ter um grupo tão forte, ajudou-me a crescer mais rápido e melhor.

É capaz de bater o norueguês Casper Ruud (top-10) na Taça Davis (setembro de 2024), mas perde no torneio seguinte. Como explica essa oscilação?

R: Acho que perdi um Challenger em Portugal (Oeiras, Lisboa). É um bocadinho a beleza e a realidade do ténis. Todos os jogos são muito diferentes e a verdade é que há muitas surpresas no ténis, para o bom e para o mau. Claro que o meu objetivo é ser sempre o mais consistente possível, ganhar aos melhores sem perder com os piores, mas a verdade é que vai sempre acontecer e tento ao máximo que não. E tento melhorar ao máximo para que o nível desses jogadores seja menos distante.

Há uma opinião generalizada sobre Henrique Rocha: talhado para os grandes palcos, mas quando desce aos Challengers, contra adversários a baixo, falta-lhe consistência. Como é que se trabalha essa consistência?

R: Dia a dia, todos os dias a melhorar e à procura de mais e melhor, porque isso vai melhorar o nosso nível médio. E, quanto mais alto for esse nível médio, esses jogos vão parecer cada vez mais fáceis, ou com menos dificuldades e adversidades para nós.

Não houve registos da passagem por Roland Garros, nem televisão, nem internet. Gravou ou conseguiu rever os jogos?

R: Por acaso, na aplicação oficial de Roland Garros, acho que consigo ver os jogos todos. Sim, é sempre bom rever estes bons jogos e ver o que fizemos de bom.  

Li numa entrevista sua que bebe shots de vinagre. Pode partilhar a razão?

R: A primeira vez, foi no CAR do Jamor. Estava com cãibras. E pedi shots de vinagre porque a nutricionista da equipa disse-me que era das coisas a que mais rapidamente recupera as cãibras. São mais ou menos 100 a 200 mililitros de vinagre, por isso, é uma quantidade aceitável. Não vou dizer que aquilo se sabe bem, mas é preciso fazer sacrifícios. É um pequeníssimo sacrifício comparado com aquilo que nós fazemos.

É também a confiança em toda a equipa? 

R: Sim, sem dúvida. Eles dizem-me que aquilo vai ajudar-me. Essa confiança é  essencial, é o básico. E, sem dúvida, tenho muita confiança em todos os momentos.

É treinado pelo Pedro Sousa e André Lopes. Como é a relação com os treinadores? 

R: Agora tenho viajado bastante com o André Lopes. É mais ou menos 50-50. Este ano, até estou a viajar mais semanas com o André Lopes. Mas tanto com o Pedro Sousa ou o André sinto-me muito contente e estamos a fazer cada vez um trabalho melhor. É preciso ainda melhorar muitas coisas, mas acho que eles têm bem noção do que é que preciso melhorar e transmitem-me bem isso.

Este ano, o que prevê fazer ou alterar? Está preparado para uma maior aposta em torneios ATP e não tanto Challenger, como fez até agora?

R: Acima de tudo queria ganhar essa tal consistência que estava a falar nos Challengers. De facto, é onde estou neste momento, é o ranking que estou neste momento. E para subir nesse ranking e conseguir jogar mais vezes ATP´s e entrar nos quadros principais dos Grand Slams, é preciso melhorar essa consistência e, todas as semanas, continuar a construir e construir. É, sem dúvida, o meu foco.

Tem uma boa amizade com o Jaime Faria. 

R: Sim. Vivemos no CAR há 6 anos. Acho que ele veio passado dois dias de eu vir para cá. Por isso, sem dúvida, já vivemos no mesmo quarto muitos meses, muitos anos. Agora, somos vizinhos. Para além da irmandade, também temos uma boa rivalidade saudável, estamos sempre a puxar um pelo outro, treinamos muitas vezes juntos. E o facto de um ir subindo um bocadinho no ranking e o outro ir atrás, é uma rivalidade muito saudável e que, como dizem os big threes, são rivalidades que são necessárias para melhorarmos diariamente e termos cada vez mais motivação.

O Jaime tem enfrentado mais lesões. Como é que está nesse campo? 

R: Tenho-me sentido bem. Tive uma surpresa no início do ano, depois de Tenerife, lesionei-me no abdominal. Foram 3 semanas, bem tratado e já estou a 100%. Posso considerar-me um bocadinho sortudo, mas bato na madeira. Porque, de facto, não é sortudo. Trato bastante bem do meu corpo, é importante dormir bem, comer bem.

Dorme quantas horas? 

R: Tento dormir pelo menos oito horas e meia, nove horas sempre. Há dias, claro, que tento dormir um bocadinho mais, por me sentir mais cansado, tento ir um bocadinho mais cedo para a cama. Mas, sem dúvida, dormir e comer é o essencial.

Nunca sai fora da linha? 

R: Ah, isso sou o primeiro a dizer que há um dia ou outro, principalmente quando vou a casa, que faço umas asneiras, e sendo do Porto, como uma francesinha ou um sorvete. Acima de jogadores, somos também pessoas e estas coisas também são necessárias na nossa vida. Sinto que preciso disto, estar com os meus amigos. Às vezes, até se for beber um copito ou outro com os meus amigos e fazer esta companhia, é essencial e gosto muito disto. Há momentos que é preciso relaxar e é preciso escolher bem, claro. Mas, acima de tudo, é saber gerir tudo.

Última pergunta. O que é que o Norte tem? Porto, Guimarães exporta tenistas para o CAR do Jamor...

R: Isto vai-nos no sangue. Temos uma raça diferente, uma garra diferente. Desde pequeninos que somos muito competitivos e acho que em qualquer desporto, mas, acima de tudo, no ténis, é preciso ir com unhas e dentes para dentro do campo. E nós temos isso e isso dá-nos uma grande vantagem logo à entrada.

É geografia? Temperatura?

R: Não sei, mas a verdade é que somos pessoas mais quentes, como se diz. Vivemos mais e acho que isso dá-nos vantagem, no CAR é muita gente do Norte. Só o Jaime é que é um bocadinho de todo o lado, mas também já viveu no Norte. É de Portugal. Mas eu, o Nuno, a Matilde, a Francisca, somos todos de cima....


Perguntas de resposta rápida

Ídolo no ténis? 

Roger Federer.

E nacional?

João Sousa.

Porquê?

Cresci a vê-los jogar e foram os que ficaram como os meus modelos.

Diferenças entre eles?

R: São um bocadinho diferentes. O Roger é um bocadinho mais pela simplicidade e beleza que criava no ténis. O João, sempre gostei imenso da atitude e da garra que tinha, aquela forma de ganhar. Identifico-me um bocadinho com isso.

Partida no Corte Central (centralito do Jamor): quem convidava?

R: O Roger.

E ganhava ou não?

R: Neste momento, não sei, acho que era possível.

Quem ganha a um top 10 do mundo... Também pode ganhar o Roger.

R: Acho que, mentalmente, contra o Roger ia ser mais difícil.

Número 1 ou número 2 do ranking ATP Quem gosta mais?

R: Gosto e admiro muito tanto o (Jannik) Sinner (n.º 1) como o (Carlos, segundo da hierarquia) Alcaraz. O Alcaraz tem uma personalidade incrível, bate com uma força incrível, à direita. E, tendo uma boa direita, admiro-o muito isso. Mas o Sinner, está a fazer campanhas brilhantes, a jogar mesmo muito bem. Sinceramente, tenho dificuldades em escolher um, mas com a série da Netflix é sobre o Alcaraz, fiquei a gostar um bocadinho mais dele.

Qual é o seu ponto forte? 

A direita.

Tem uma pancada forte, mas no serviço não é tão forte.

Não, o serviço ... mas neste torneio (Roland Garros), por acaso, tenho que estar muito contente, porque é reflexo de muito trabalho. Notou-se mais a presença do meu serviço. É algo que tenho que agarrar, rever e ver muitas vezes, que é para ter estas boas referências para levar para os próximos torneios.

A quantos quilómetros por hora serve? 

Não sei. Acho que consigo servir facilmente a 200 km/h. Um ou outro a 210 km/h, mas não será tão controlado, digamos assim. A minha boa média, em que consigo ter boa consistência, é entre os 190 e 200 km/h.