De ascendência sefardita, Michal Zrihen logrou a nacionalidade portuguesa, e foi a ‘nova’ bandeira, das suas referências ancestrais, que elevou ao pódio do Europeu de taekwondo de Manchester, já neste mês de maio, depois de um processo iniciado em setembro de 2021, apontando já a Paris2024.
A história começa ainda antes da pandemia de covid-19, quando conheceu as pessoas que agora a orientam no Hankuk, uma escola e centro de treinos renomada na modalidade, com vários atletas olímpicos, em Madrid, e se encontrava sem clube e treinador.
Conheceu a olímpica finlandesa Suvi Mikkonen e Jesús Ramal, que a ‘abraçaram’ durante uma prova, na Polónia, em que a finlandesa “praticamente treinou” Zrihen até ao ouro, conta a atleta em entrevista à agência Lusa.
“Disse-lhe que queria ir treinar com ela, percebi que tinham atletas fantásticos. Vim três semanas e tornaram-se meses. Não queria ir embora, só queria treinar. A pandemia começou, tivemos de parar tudo. (...) Quando surgiu a oportunidade de representar Portugal, de conseguir a nacionalidade, as permissões, etc, isso foi o momento em que disse: ‘vou atirar-me a isto’. Liguei à Suvi e ao Jesus e organizámos tudo”, conta.
Para já, tem “muita paixão e o objetivo continua”. “Não vou desistir. É duro, com a distância de casa, da minha família, e por vezes chego ao treino triste. Mas não tenho dúvidas, sei que é aqui que devo estar”, assume.
Sobre a medalha de bronze no Europeu, confessa, ainda está “a tentar entender” o que aconteceu.
“Foi uma experiência fantástica, diverti-me imenso. A minha família chegou de Israel, as minhas pessoas. Foi uma festa grande, para mim. Diverti-me antes e depois dos combates. A aquecer, nos dias antes, toda a experiência, sentia-me bem e preparada, para competir e dar o meu melhor”, conta.
A competição em si “foi de loucos, tão bom”, e se “há um ano parecia impossível chegar lá”, com “tanto apoio e confiança, uma equipa, uma treinadora”, na prova chegou a “um taekwondo muito bom”, perante adversárias em que se pode “perder contra qualquer uma e ganhar contra qualquer uma”.
A treinadora Suvi Mikkonen conta à Lusa que este resultado “é importante” também por causa dos patrocínios e apoios, que mesmo que escasseiem em desportos de combate, podem fazer a diferença, bem como o apoio estatal, ao inserir-se no programa olímpico nacional.
De resto, a ligação do Hankuk a Portugal já vem de há vários anos, com Joana Cunha, entre outros, a treinarem no clube, e a ligação a Michael Zrihen, por seu lado, é por uma “história similar”.
“Sou da Finlândia, e vim para Espanha viver. A minha família voltou, quando eu tinha 18 anos, e eu fiquei por causa do taekwondo. Tenho estado sozinha desde então. Este clube tornou-se a minha família”, refere.
César Valentim, encarregue da gestão do processo da atleta junto do Taekwondo Clube Santo António dos Cavaleiros, que Michal representa, explica à Lusa que assim que ficou tratada a inscrição e nacionalidade da lutadora, tem somado “pódios e bons resultados”.
Uma “conversa de balneário” fez algumas atletas portuguesas, acompanhadas por César, notar no caso da então israelita, de 27 anos, e direcioná-la, tendo agora “um caminho suave” até Paris2024.
“A Michal estava desamparada, sem nacionalidade e treinador, e não faria sentido treinar em Portugal, onde não há atletas para ela, quando há possibilidade da Hankuk”, explica.
Para a frente, os olhos estão postos nos Mundiais, ainda referentes a 2021, adiados dada a pandemia de covid-19, e mais para a frente “os Jogos Olímpicos” Paris2024. Vai “fazer tudo para lá estar”, destaca.
Porque é “difícil encontrar” uma atleta mais determinada do que Zrihen, o foco está nos próximos dois campeonatos do mundo, este ano e em 2023, a caminho dos Jogos, para já com o apoio dos pais e o ‘respaldo’ dos bons resultados.
Está “a treinar a 100%”, à exceção de algumas aulas ‘online’ que leciona “para ter algum dinheiro”, tem “algumas poupanças” e o apoio dos pais, mas o ‘all in’, como lhe chama, manter-se-á enquanto a chama da “paixão pelo taekwondo” permitir, como já permitiu deixar tudo para trás e mudar-se sozinha para a capital espanhola.
“Agora que conseguimos este grande objetivo, vou olhar para os Mundiais, e claro que parece que podemos chegar, depois desta medalha, e não só a medalha, mas todo o processo. Dois anos [até Paris2024] parecem muito, mas não são. Estão já aqui. Quero lá estar, ser a melhor”, garante.
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