A seleção portuguesa de andebol masculino voltou a dar uma enorme alegria a Portugal ao conseguir a inédita qualificação para os Jogos Olímpicos do próximo verão. Num jogo fantástico, impróprio para cardíacos, os Heróis do Mar venceram a poderosa França por 29-28 em Montpellier, com o golo do triunfo a surgir a cinco segundos do final. A França ainda conseguiu introduzir a bola no fundo da baliza de Portugal, num golo que daria empate, mas o tento foi conseguido já para lá do final.
Assim que se ouviu a buzina a assinalar o fim do jogo, a emoção tomou conta dos jogadores e restante equipa técnica e staff, no pavilhão, num triunfo dedicado ao malogrado Alfredo Quintana, guarda-redes da Seleção de Andebol falecido no dia 26 de fevereiro, após uma paragem cardiorrespiratória num treino do seu clube, o FC Porto.
Neste torneio de apuramento olímpico, Portugal começou por vencer a Tunísia, mas perdeu no segundo jogo com a poderosa Croácia por apenas um golo, antes de voltar a bater os gauleses (também eles apurados), num jogo fantástico onde Portugal esteve a perder por cinco golos em duas ocasiões, mas nunca atirou a toalha ao chão.
À chegada a Portugal, na tarde desta segunda-feira, o selecionador nacional, Paulo Jorge Pereira, concedeu uma entrevista exclusiva ao SAPO Desporto, onde falou da emocionante vitória frente a França, a terceira nos últimos cinco jogos, todas elas muito importantes: a primeira abriu caminho para o apuramento ao Euro2020, a segunda ajudou Portugal a passar à segunda fase do Europeu da categoria e esta última a valer um bilhete para Tóquio, palco do Jogos Olímpicos de 2020.
Paulo Jorge Pereira, selecionador português de andebol falou ainda da evolução da equipa e daquilo que Portugal poderá alcançar no torneio olímpico, onde vão estar as 12 das melhores seleções do Mundo.
SAPO Desporto: O que sentiram quando ouviram a buzina final após a vitória com a França?
Paulo Jorge Pereira: "Tendo em conta que estabelecemos objetivos muito difíceis de alcançar e todo o contexto que rodeou estas últimas semanas que vivemos, é como se fosse uma sensação de alívio. Alívio de certa forma para honrar o nosso grande Quintana, aquele pulso de energia que tivemos durante a competição também veio dele, de certeza absoluta. Alívio de tudo que fizemos para que as coisas nos corressem bem. O culminar de todo o esforço de todos. Os jogadores foram atletas de um caráter imenso. Seria quase impossível fazer o que nós fizemos se tivéssemos jogadores com um caráter diferente, com uma forma diferente de estar na competição diferente. Eles procuram sempre superarem a si próprios, esse registo é que nos permitiu atingir este objetivo. Sair de um momento difícil, conseguimos reorganizar-nos em tempo recorde para abordar a competição e depois foi a resposta destes guerreiros que nos permitiu atingir os objetivos."
SAPO Desporto: Como é que viveu a montanha de emoções no jogo com a França, onde Portugal esteve a perder por cinco golos de diferença em duas ocasiões?
Paulo Jorge Pereira: "Fizemos algumas alterações em relação a aquilo que era o plano de jogo. Depois do jogo com a Croácia tivemos de fazer mais adaptações, alterações, sobretudo por várias coisas. O jogo da França foi aquele em que foi correndo mais ou menos tudo como estava planeado, de certa forma mais estável em termos de aplicação de plano de jogo. A diferença no marcador, bom estávamos a jogar contra atletas que são dos melhores que há no mundo, quando se fazem duelos, seja de guarda-redes, de defensores, podemos perder como podemos ganhar, é jogo. Mantivemos sempre a estabilidade emocional, nunca deixámos de pensar que podíamos vencer o jogo, isso permitiu-nos permitir focar no processo e atingir o resultado."
SAPO Desporto: Cinco duelos com a França, três vitórias para Portugal. Ajudou conhecer melhor a França?
Paulo Jorge Pereira: "Jogar com a França é sempre jogo de altíssima dificuldade, independentemente de os conhecer mais ou menos e eles também a nós. Interessante como conseguimos ganhar a França, uma equipa de referência mundial, em 2019, 2020 e 2021, três anos seguidos. Isto é um indicador que estamos num registo elevado de produtividade enquanto equipa. Para Portugal isto tem de ser algo extraordinário. Foram todas vitórias de alto calibre."
SAPO Desporto: Como viu o evoluir da seleção de andebol nos últimos anos?
Paulo Jorge Pereira: "O facto de estarmos em maior permanência em duelos de elevada exigência, vai nos ensinando a lidar com este tipo de competições, com jogos sucessivos com um dia ou dois de intervalo no máximo. Para quase todos os atletas são modelos de competição completamente distintos dos que estão habituados a fazer. Acabamos por ter mais experiência de como nos mantemos focar no processo, nas coisas que devemos focar para depois poder ganhar, com um pouco mais de facilidade. É certo que ainda temos de ganhar mais de estatuto, nomeadamente a forma como os outros nos vêem, não só os árbitros, mas também todos, e isso é ganho com mais presenças em grandes provas.
SAPO Desporto: Estas presenças sucessivas em grandes provas irão ajudar os jogadores a nível mental para que Portugal se torne um habitué nestas competições?
Paulo Jorge Pereira: "Já temos aqui atletas com bastante experiência, que jogam ao mais alto nível nos seus clubes, na Liga dos Campeões, habituados a jogos de grande exigência, à pressão. Pode diferir um pouco neste tipo de competições com jogos sucessivos que nos obriga, no espaço de 15 dias, onde temos de nos ligar no primeiro e desligar no último dia. Isto exige muito de toda a gente. No meu staff cada um tem o seu papel, todos ajudam, e estão sempre disponíveis para ajudar no que for necessário. Os atletas têm de ter cuidado com a recuperação após os jogos para estar no melhor possível no dia seguinte para treinar ou jogar. Isto é um processo em que as pessoas se vão habituando, a experiência acaba por ser uma vantagem para quando nos andarmos lá mais vezes. É obrigatório andarmos lá mais vezes".
SAPO Desporto: E agora os Jogos Olímpicos. Quais serão os objetivos?
Paulo Jorge Pereira: "Se nós respeitamos o nosso potencial, temos de jogar por uma medalha. Sabemos que será uma coisa extremamente difícil, estamos a falar de seleções a nível mundial, estamos a falar de 12 seleções, as melhores que se apuraram dos continentes, da Europa teremos sete ou oito. Será um torneio extremamente difícil. Estabelecemos o objetivo de passar a fase seguinte primeiro, e, se o fizermos, vamos tentar lutar pelas medalhas, isto é seguro. Não quer dizer que só o facto de o queremos e dizermos que vamos lutar por uma medalha, vamos ter uma medalha, isso não é possível. Estar entre os melhores e poder jogar um torneio olímpico é um orgulho para o nosso país e para toda a gente e um sinal de que quando acreditamos que podemos fazer bem, podemos fazer bem. Os fatores mentais são fundamentais quando nos predispomos a atingir objetivos extramente ambiciosos."
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