A paragem competitiva causada pela pandemia de covid-19 aumentou os níveis de ansiedade e baixou os de felicidade nos desportistas portugueses, concluiu um estudo da Universidade de Lisboa, que revela dados "preocupantes", disse à Lusa uma das investigadoras.
Segundo explicou Liliana Pitacho, docente universitária que assina a investigação, com Patrícia Palma e Pedro Correia, foram encontrados "níveis de stress bastante altos", com uma percentagem "acima dos 50% com stress patológico", isto é, níveis que, a permanecerem altos, podem trazer consequências para a saúde.
Por outro lado, há perturbações de sono numa porção significativa dos quase 1.500 inquiridos para este estudo, acima de 40%, com um número "realmente preocupante" de "perceção de diminuição de felicidade que os atletas tiveram nesta interrupção", entre março e o verão, dependendo da modalidade, quando se foi dando, de forma faseada, a retoma em alguns desportos.
"Temos 75% dos participantes com quebra acentuada, estão muito mais infelizes do que estavam, ou moderadamente mais infelizes. Em contrapartida, não há subidas no nível de felicidade durante a paragem. Temos quebras, e grandes, e essa é que é a preocupação, porque a felicidade pode ser vista como um fator protetor em situações adversas", aponta a investigadora.
O trabalho dos docentes do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) da Universidade de Lisboa, intitulado ‘Da paixão ao abismo: o impacto indireto da covid-19 na saúde psicológica dos atletas’, foi levado a cabo durante um mês e meio, com 45,2% dos inquiridos do género feminino e uma idade média de 20,32 anos.
Participaram atletas de oito modalidades distintas, com 48,7% a pertencerem aos escalões de formação, dos 13 aos 17 anos, e o resto em escalões competitivos, com 22,6% da amostra a indicar ser remunerada pela atividade.
"Também os cortes salariais parecem ser bastante relevantes. As pessoas que sofreram cortes apresentam níveis de stress mais elevados, também nas perturbações do sono, e maiores quebras de felicidade", nota Liliana Pitacho.
Há níveis mais baixos nos jovens, ainda que sejam "bastante preocupantes para a faixa etária", colocando em risco o seu desenvolvimento desportivo, mas também cognitivo e pessoal, uma vez que as perturbações do sono afetam o crescimento.
A incerteza que ainda recai sobre a retoma dos escalões de formação é outro dos dados que suscitam preocupação, com os investigadores a apelarem "para a necessidade de intervenção e maior apoio".
Pedem a clubes, entidades estatais e federações, no fundo ao ecossistema do desporto, que possam apoiar no que toca ao trabalho psicológico, de gestão emocional e outras formas de apoiarem atletas, após divulgarem "a situação atual dos atletas e o seu estado psicológico".
"Apenas 13% dos clubes dispõem de apoio psicológico para os seus atletas, o que é muito pouco. Percebo a questão financeira, mas tem de ser um esforço conjunto de clubes, entidades estatais, federações, [avaliar] o que pode ser feito e que medidas podem ser disponibilizadas, quer na formação quer na competição", reforça.
*Artigo publicado originalmente no dia 09 de outubro de 2020
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