A eurodeputada Ana Gomes destacou, esta segunda-feira, num debate sobre o 'Futebol Leaks' e a proteção dos denunciantes', a importância das informações divulgadas pelo informático Rui Pinto, para que se faça 'luz' sobre grandes processos de branqueamento de capitais e enriquecimento ilícito.

Francisco Teixeira da Mota, advogado do informático, considerou que a sua prisão é ilegal, relembrando que o único motivo para manter o suposto hacker na prisão é o alegado crime de extorsão ao fundo de investimento 'Doyen Sports'.

"O Rui Pinto está preso preventivamente porque o tribunal considerou que os crimes de que é suspeito justificavam a prisão preventiva...Tentativa de extorsão. (...) No nosso entender não recebeu um cêntimo. Nós entendemos que a sua prisão é ilegal".

William Bourdon, advogado que fez a defesa de outros denunciantes como Julian Assange e Edward Snowden, e representou o português na Hungria, considera "um orgulho" defendê-lo, frisando que este "pertence a um grupo muito restrito dos melhores 'whistleblowers' deste século".

Bourdon garantiu que o "lugar de Rui Pinto não é na prisão e não deve ser. Foi graças a um contexto específico que foi enviado para a prisão e temos a certeza que ele vai ser considerado inocente. Ele deve estar livre e a história está só a começar", avisou.

O defensor do português revelou ainda que as autoridades francesas fizeram uma cópia de toda a informação de que Rui Pinto dispunha no computador.

Questionado sobre como é que as autoridades gaulesas tiveram acesso à informação antes das portuguesas, Bourdon confirmou que o português foi interrogado, mas acabou por não dar detalhes, preferindo sublinhar que todos os cidadãos têm a expectativa de que estas informações possam levar a desmantelamento da "criminalidade organizada".

Já Ana Gomes acabou por salientar o papel de Antoine Deltour, um dos denunciantes que esteve na origem do processo 'LuxLeaks ' e que acabou ilibado. Na altura, Antoine Deltour foi acusado, juntamente com mais dois funcionários da PricewaterhouseCoopers (PwC), de divulgar informação sobre os acordos tributários internacionais.

"Ele disse que temia pela sua vida porque ele sabia que havia algumas pessoas corruptas no nosso sistema policial com relações muito próximas à Doyen. E isso é algo que tem que ser investigado."

Deltour, que também esteve presente na conferência, acabou por estabelecer um paralelismo com o processo em que está envolvido o português.

"O que aconteceu com ele, aconteceu comigo. Fui acusado duas vezes e depois ilibado. Tive acesso a documentos que não devia ter tido. Nunca ganhei dinheiro. Dei os documentos a um jornalista. Rui Pinto forneceu informações muito preciosas... e vão dar origem a condenações e as autoridades estão interessadas. Ele merece proteção enquanto decorre o processo. A liberdade de expressão é fundamental e é por isso que os 'whistleblowers' merecem proteção e ele faz parte dessa família", atirou.

Ana Gomes explica porque é que Rui Pinto temeu pela vida

Na sua intervenção, a deputada do Parlamento Europeu explicou porque é que Rui Pinto disse que temia pela vida em Portugal por causa das ligações de algumas pessoas à Doyen., quando foi interrogado na Hungria pelas autoridades judiciais daquele país.

"O que é a Doyen? É um fundo, sediado em Malta que podemos pesquisar na Google e vemos as ligações com a máfia cazaque, com negócios muito, muito estranhos", começou por dizer, explicando depois que ficou "chateada" por não ver as autoridades portuguesas investigar estas acusações.

"Fico muito chateada e não posso desconsiderar, inclusivamente, o que Rui Pinto afirmou em tribunal, na Hungria, em que ele disse que temia pela sua vida porque ele sabia que havia algumas pessoas corruptas no nosso sistema policial com relações muito próximas à Doyen. E isso é algo que tem que ser investigado", atirou, apesar de advogar que tem toda a confiança nas autoridades portuguesas.

"A criminalidade está infiltrada em todos os sectores da sociedade mas este é um combate europeu e global. Em certo sectores, do desporto, economia, há os corruptos infiltrados, para fazer a intoxicação da opinião e estamos a ver isso em Portugal e é por isso que estamos a debater. Como cidadã tenho que confiar na justiça, mas não sou ingénua e sei que há pessoas infiltradas", atirou, referindo-se a casos como os do "'e-toupeira', em que os principais responsáveis nem sequer foram beliscados."

Francisco Teixeira da Mota confirmou que Rui Pinto "se encontra bem" e que a sua segurança está "salvaguardada".

"Tem os períodos de recreio fora do período dos reclusos, mas ele tem encontrado algum apoio...nem tem sentido hostilidade".

Em relação aos conteúdos dos computadores do alegado hacker, o advogado relembrou "que estão nas mãos da investigação."

Sobre o facto de as autoridades não terem manifestado interesse na eventual colaboração do informático em outros processos, Teixeira da Mota desdramatizou.

"Não temos informação, mas não colocamos em causa que as autoridades queiram colaborar."

Já Ana Gomes, quando questionada sobre a possibilidade de haver um julgamento a nível europeu, e de Rui Pinto poder ser testemunha em outros processos, relembrou que "não há tribunais europeus para julgar este tipo de casos. O que há é a colaboração através do 'Eurojust'".

Recorde-se que quando Rui Pinto foi ouvido na Hungria, o informático disse que não acreditava no sistema judicial português.

"O sistema judicial português não é inteiramente independente; existem muitos interesses escondidos. Claro que há procuradores e juízes que levam o seu trabalho a sério. Mas a máfia do futebol está em todo o lado", sublinhou.

O debate "Futebol Leaks e a proteção dos denunciantes - o papel de Rui Pinto”, que teve lugar no Gabinete do Parlamento Europeu, em Lisboa, estiveram presentes os dois advogados de Rui Pinto (o francês William Bourdon e o português Francisco Teixeira da Mota), assim como Antoine Deltour, um denunciante associado ao caso 'Lux Leaks'.

Em prisão preventiva desde 22 de março, Rui Pinto, de 30 anos, foi detido na Hungria e entregue às autoridades portuguesas, com base num mandado de detenção europeu, estando indiciado pela prática de quatro crimes: acesso ilegítimo, violação de segredo, ofensa à pessoa coletiva e extorsão na forma tentada.

Na base do mandado estão acessos ilegais aos sistemas informáticos do Sporting e do fundo de investimento Doyen Sports e posterior divulgação de documentos confidenciais, como contratos de futebolistas do clube lisboeta e do então treinador Jorge Jesus, além de outros contratos celebrados entre a Doyen e vários clubes de futebol.

O colaborador do 'Football Leaks' terá entrado, em setembro de 2015, no sistema informático da Doyen Sports, com sede em Malta, e é também suspeito de aceder ao endereço de correio electrónico de membros do Conselho de Administração e do departamento jurídico do Sporting e, consequentemente, ao sistema informático da SAD 'leonina'.

No período em que esteve detido na Hungria, Rui Pinto assumiu ser uma das fontes do 'Football Leaks', plataforma digital que tem denunciado casos de corrupção e fraude fiscal no universo do futebol, no âmbito dos quais estava a colaborar com autoridades de outros países, nomeadamente, França e Bélgica.

*Artigo corrigido e atualizado

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