A escravatura humana atingiu o seu ponto culminante na nossa época sob a forma do trabalho livremente assalariado.
É uma expressão do pensador George Bernard Shaw que o jurista e advogado Jerry Silva pega para falar sobre a linha ténue que separa o lado pessoal e o profissional dos jogadores de futebol nas redes sociais.
Estarão as publicações dos atletas de futebol cada vez mais instrumentalizados por parte dos clubes? Até onde vai a liberdade de expressão e onde fica o limite?
"A linha é muito ténue, sobretudo quando as publicações feitas pelos clubes ou jogadores entram em matérias que não dizem respeito à intimidade. O que não é privado, sem prejuízo de haver liberdade de expressão, entramos em áreas em que há conflitos de direitos e interesses. O direito à liberdade de expressão é um direito inequívoco, mas se é algo que emerge da relação profissional vamos ter um conflito. Existe também um dever de reserva e sigilo que resulta da relação profissional. Há que mitigar essa questão, embora me pareça que deverá haver um contenção por parte dos jogadores", explica Jerry Silva, jurista e advogado que integra o Tribunal Arbitral do Desporto, assim como a lista oficial de Peritos da Comissão de Arbitragem para a transferência de jogadores da FPF.
Ao SAPO Desporto, Jerry Silva recordou o episódio que envolveu Pepe e Loum, ambos jogadores do FC Porto, que se envolveram numa acesa discussão após o apito final do jogo em Faro. Os dois trocaram empurrões e algumas palavras e o ambiente não 'aqueceu' ainda mais graças a intervenção do árbitro Manuel Mota e de outros jogadores da equipa, que foram logo separá-los.
“Foi uma situação pública. Depois disso, houve certamente um debate no balneário, cada um dos intervenientes, e o próprio clube e grupo, manifestou o seu ponto de vista sobre o assunto. Provavelmente é algo que não está regulamentado, mas diz o bom senso, em prol dos interesses do clube, que se devem abster de comentar publicamente essa situação”.
Contudo, através do Twitter, Loum contrariou essa tendência - ou serviu de instrumento - explicando o sucedido: "Gostaria de pedir desculpas a todos os fãs do FC Porto pelo infeliz incidente que ocorreu esta noite. Isto nunca deveria ter acontecido. Pepe é um irmão mais velho e eu aprendi muito com ele. Às vezes o desejo de ganhar um jogo faz com que algumas coisas lamentáveis aconteçam de um lado ou do outro. Eu sempre fui um modelo de disciplina e devoção no clube e pretendo mantê-lo assim", pode ler-se em dois tweets.
Jerry Silva explica-nos que os jogadores têm de seguir o regulamente interno dos contratos com os clubes, existindo cláusulas do que pode e o que não pode ser publicado nas redes sociais.
"Está nos regulamento interno dos clubes. Os jogadores celebram os contratos de trabalho e há clausulas que vinculam o que está estabelecido no regulamente interno, onde está um conjunto de situações do que podem ou não comentar publicamente".
Outrora, antes do aparecimento dos canais especializados dos clubes, o acesso aos jogadores de futebol por parte da imprensa era mais fácil.
“Eu diria que estamos da vez mais estamos perante uma escravatura legalizada, cada vez mais presente. A preparação das entrevistas e o reflexo que essa preparação tem na qualidade das entrevistas é meritória, Coisa diferente é a predefinição dos conteúdos que hão, ou não, ser ditos. A relação laboral desportiva evoluiu para um patamar de tamanha exigência que tem como contraponto a redução do plano de liberdade dos intervenientes. Os jogadores são cada vez mais robotizados, automatizados e menos naturais".
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