A análise da vitória do Benfica em Faro começa, inevitavelmente, pelo fim.
Foi nessa altura que a comitiva encarnada, incluindo Roger Schmidt, saiu do relvado do São Luís sob uma vaia descomunal por parte dos adeptos (benfiquistas) que assistiram ao jogo. Os mesmos que presenciaram o triunfo da equipa da Luz por 3-1 diante do Farense. Estará a perguntar-se: Mas a equipa jogou muito mal? Mas os jogadores ripostaram contra os adeptos? Nem uma coisa nem outra. Curiosamente, ao contrário de grande parte dos jogos esta época, o Benfica fez mais do que o suficiente para vencer a partida. E, segundo sabemos, em momento algum houve qualquer jogador, ou mesmo treinador, com uma atitude menos correta em direção à bancada.
É por isso um caso de estudo a reação intempestiva como os adeptos do Benfica trataram a equipa, com cânticos insultuosos dirigidos ao presidente Rui Costa e ao técnico Roger Schmidt.
É certo e sabido que a relação de Schmidt com os adeptos está longe de ser pacífica. Mas caramba, vencer por 3-1 em Faro, onde, por exemplo, o Sporting ganhou por 3-2, num triunfo suadíssimo, e terminar a partida daquela forma?
Quanto ao jogo, começou animado. A necessidade da conquista dos três pontos aguçou a astúcia de ambas as equipas nos primeiros minutos de jogo. Apesar de ser o Benfica a equipa mais discernida e com mais bola, o Farense revelava aos poucos que estava longe de ir a jogo apenas para agarrar o pontinho. Não, José Mota queria mais. Mas para querer mais, verdade seja dita, teria de estar apetrechado de outros argumentos defensivos.
A partida gozava de alguma falta de governança, no bom sentido do termo, e era o Benfica que mais a sabia aproveitar. Aliás, o pináculo desse aproveitamento chegou cedo, logo aos 16 minutos, depois do Benfica ter descoberto um buraco bem escavado no lado direito da defesa. Di María acelerou, Bah passou nas costas sem qualquer oposição e encontrou Kokçu na área. O médio turco desviou para o fundo das redes, mas nem parecia muito feliz pelo golo marcado. Lá celebrou com os colegas o 1-0 que, apesar de não se justificar inteiramente, não chocava ninguém.
O golo fez bem à equipa encarnada, que num curto espaço de tempo soube criar um par de oportunidades dignas de registo, mas sem as concretizar. E é nestas alturas que a gíria do futebol faz juz à sua sabedoria: quem não marca...? E sim, foi contra a corrente de jogo que surgiu o golo do empate. Belloumi encheu o pé (oh, se encheu) e fuzilou a baliza de Trubin, apesar do pouco ângulo. O golo, na sequência de uma bola parada, parecia vir baralhar as intenções audazes do Benfica, mas foi só parecer.
Novamente pela direita (uma autoestrada sem portagens para Alexander Bah), o neerlandês desencantou Arthur Cabral no meio da área, que com um toque sublime de calcanhar devolveu a vantagem no marcador às águias. Quase poética a forma como o físico corpulento do brasileiro proporcionou aquele suave a delicado toque, que só parou no interior da baliza de Ricardo Velho, que nem em novo a apanharia.
Era a vantagem assegurada ao intervalo, que traria um novo jogo, muito diferente do primeiro. A loucura tática da primeira parte deu lugar a um jogo mais ponderado, sobretudo das águias, que mantiveram o domínio do jogo de forma extremamente segura, salvo raras exceções.
O jogo era de teste, alto teste, para o Benfica, mas sobretudo para Schmidt. Apostou em Carreras na lateral esquerda e foi precisamente do espanhol que nasceu o terceiro, aos 67 minutos. Foi já depois de uma quantas traquinices de Di María, todas elas lindas, mas todas elas sem quererem nada com o fundo da baliza, que o espanhol chegou ao golo da tranquilidade a praticamente vinte minutos o fim (uma vez mais, com o argentino no lance do golo)
Num jogo em que Rafa, Aursnes e João Neves começaram no banco, Schmidt, tantas vezes criticado, merece uma nota positiva pela forma corajosa como arriscou... e soube petiscar. A ele, que tantas vezes é acusado de alguma inércia na forma como reage ao que o jogo vai pedindo, não se pode acusar ter lido mal o jogo diante do Farense. Opinião contrária terão tido os centenas de adeptos que, no momento da saída de Schmid do relvado, decidiram pedir satisfações pelo rendimento na presente temporada. É caso para perguntar: como teria sido se o Benfica tivesse saído derrotado?
O momento
O segundo golo do Benfica apontado por Arthur Cabral. É uma finalização que parece simples, mas está longe de o ser. O gesto técnico é perfeito, no tempo certo, e Arthur Cabral deixou (uma vez mais) a certeza de que pode e deve ser uma escolha mais frequente e preferencial face a outros jogadores. Foi, sem dúvida, um dos momentos mais cativantes de toda a partida, a par de uns quantos lances absolutamente geniais de Di María, que apesar da magia deixada em campo não conseguiu concretizá-la em golos.
O melhor
A prova de que a exibição do Benfica valeu realmente pelo é todo é esta: o facto de ser quase impossível destacar alguém, sob pena de ser injusto com mais de meia equipa. Numa avaliação mais distanciada, e mesmo não tendo marcado, talvez seja justo entregar a distinção a Di María. Tem dois ou três lances maravilhosos, mas acabou a partida sem abanar as redes. Também acontece. Mas é inegável o contributo do argentino na vitória das águias em Faro, funcionando como um verdadeiro motor refinado, revestido a elegância, magia e acutilância. É prova disso o facto de ter tido ligação aos três golos dos encarnados. Só faltou marcar, e não esteve longe disso, mas a noite era sobretudo para dar e não tanto para receber.
O pior
A defesa do Farense, especialmente no lado esquerdo, apresentou enormes dificuldades em conter a produtiva parceria entre Di María e Alexander Bah. Foi nesse espaço que nasceram os dois primeiros golos do Benfica. Marco Matias, que pouco cumpriu defensivamente e Talys, um lateral aos papéis, terão sido, porventura, os principais rostos do fracasso defensivo dos leões de Faro - sobretudo no primeiro tempo.
Também no lado negro da história, obviamente, o momento lamentável durante e após a partida, com insultos gratuitos dirigidos a Schmidt (e também a Rui Costa). No caso do técnico alemão, chegou mesmo a ser atingido com uma garrafa no momento em que se dirigia para o túnel. Por mais razões que existam - o que após uma vitória por 3-1 se tornam ainda mais difícil de explicar - é inqualificável o que se passou no São Luís com os adeptos do Benfica. Um comportamento que merece a reflexão de todos, especialmente para os lados da Luz.
O que disseram os treinadores
Roger Schmidt, treinador do Benfica
José Mota, treinador do Farense
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