Pela terceira vez na sua história o Benfica marcou três golos e perdeu a jogar em casa para a I Liga portuguesa. A última vez que tal tinha sucedido fora em 1996/97. A outra datava da década de 1930. Pode ser uma simples curiosidade, mas é um entre vários dados estatísticos que confirmam que algo vai (muito) mal no reino da 'águia'.

Há outros: cinco jogos seguidos sem ganhar em casa (segunda pior série da história do clube), apenas duas vitórias nos últimos 12 jogos (nos quais sofreu quatro derrotas), três derrotas caseiras numa mesma edição da I Liga (algo que não acontecia desde 96/97)...Afinal, o triunfo conseguido já perto do fim frente ao Rio Ave, na anterior jornada, serviu apenas para 'camuflar' uma crise que está à vista de todos.

Esta terça-feira, nem todas as armas - e são muitas - que Bruno Lage se pôde dar ao luxo de guardar no banco para lançar quando foi necessário chegaram para evitar mais um desaire. Preocupante. O rumo, por mais passeios que treinador e presidente façam para ver o mar, teima em não mudar e a liderança está, agora, a três pontos (que na prática são quatro) de distância. O título está a escapar por entre as mãos dos 'encarnados'...

É preciso voltar ao antigo estádio para encontrar um jogo onde as 'águias' sofram quatro golos
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Mas o mau momento que o Benfica atravessa não tira mérito ao brilhante triunfo do Santa Clara. Os açorianos fizeram história ao somarem um triunfo inédito: nunca antes na sua história tinham vencido o gigante lisboeta e tinham saído derrotados de todas as anteriores visitas ao Estádio da Luz. Esta terça-feira, o Santa Clara não foi grande, foi gigante. Afinal de contas, não é qualquer equipa que marca quatro golos na Luz e não é qualquer equipa que consegue voltar a virar um resultado no terreno de tão cotado oponente depois de ter estado por duas vezes a ganhar e ver o adversário passar para a frente do marcador.

Ao contrário do Benfica, o Santa Clara atravessa um momento verdadeiramente mágico. Somou o quinto jogo seguido sem perder (2 vitórias, 3 empates) e só perdeu dois dos últimos onze jogos que disputou, dos quais ganhou seis. Além disso, forçado a mudar-se para o continente e a fazer da Cidade do Futebol sua casa nestes tempos de pandemia, o conjunto açoriano parece ter ganho ainda mais ímpeto face a essa contrariedade, sendo uma das equipas ainda invictas neste retomar da I Liga.

O JOGO: Aposta em Seferovic saiu furada, Lage pensou ter conseguido 'corrigir a mão' a tempo, mas Santa Clara tinha outras ideias

Quem pensou que o Benfica poderia entrar em campo transfigurado em relação aos últimos tempos, aliviado por ter sentido enfim, em Vila do Conde, o sabor da derrota, depressa percebeu que estava enganado. Cedo no encontro o Santa Clara mostrou ao que vinha e pertenceram aos açorianos as melhores ocasiões de golo do primeiro tempo.

Bruno Lage resolveu premiar o Seferovic, que tinha sido importante na vitória sobre o Rio Ave, com a titularidade, mas o suíço esteve longe de corresponder e o ataque do Benfica pouco se viu na primeira parte, exceção a um livre de Weigl e a um lance em que Rafa, desmarcado por Taarabt, não conseguiu marcar.

O Santa Clara, que já tinha desperdiçado uma grande situação para ganhar vantagem, acabou mesmo por  ser a primeira equipa a marcar. Num lance em que o jovem Nuno Tavares não fica isento de culpas, Anderson Carvalho aproveitou da melhor forma para capitalizar e levar - com alguma justiça - os visitantes em vantagem para os balneários.

Lage corrigiu ao intervalo, mas não chegou porque o Santa Clara também tinha as suas armas

Bruno Lage percebeu que tinha de mudar algo na equipa para a segunda parte. Fez então sair Seferovic para entrar Carlos Vinícius e trocou Gabriel por um Zivkovic que ainda não tinha jogado para a I Liga esta temporada e somava apenas 68 minutos na Taça da Liga.

Os frutos da mudança foram quase imediatos. O Benfica começou a jogar melhor e, passados cinco minutos após o reatamento, empatou, numa bonita jogada que levou a bola a passar pelos pés de vários jogadores - entre eles Zivkovic - antes de chegar  a Rafa, que marcou. Um golo cedo na segunda parte. Era o que as 'águias' precisavam para se lançarem em busca da reviravolta no marcador. Uma reviravolta que viria a acontecer, mas não sem que antes o Santa Clara voltasse à vantagem, por intermédio de Zaidu.

João Henriques: "Muitas vezes falam do Benfica e esquecem-se de quem cá vem jogar..."
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Seria Vinícius o responsável por essa reviravolta. Com dois golos de cabeça, o brasileiro, que não marcava há seis jogos, chegava aos 17 golos na I Liga (melhor marcador da prova) e colocava o Benfica na frente. As armas lançadas do banco correspondiam e pensou-se que, a partir daí, os 'encarnados' seguiriam rumo ao triunfo. Puro engano!

É que o Santa Clara também tinha as suas armas. Logo a seguir ao segundo golo de Vinícius, João Henriques fez entrar Cyzan e Zé Manuel, precisamente os dois homens que viriam a apontar os golos que selariam o triunfo açoriano. O primeiro marcou na conversão de uma grande penalidade a castigar mão na bola de Rúben Dias e o segundo marcou já bem para lá do minuto 90, quando se pensava que o Benfica ia somar mais um empate na prova. Afinal, foi uma derrota...que pode ter consequências (irremediavelmente) graves na luta pelo título.

VEJA OS SETE GOLOS DO ENCONTRO

O MOMENTO: Rúben Dias faz penálti e abre caminho a nova reviravolta

Decorria o minuto 77. O Benfica estava, enfim, em vantagem e até parecia ter as operações controladas. Mas, depois de um lançamento de linha lateral enviado para a grande área 'encarnada', tudo iria mudar. O lance até acabou por prosseguir, mas o VAR chamou a atenção do árbitro, João Pinheiro. Rúben Dias tinha tocado com a mão na bola. Depois de ver o lance, o 'juíz'  da partida apontou mesmo para a marca de grande penalidade, a qual viria a ser concretizada por Cryzan.

OS MELHORES: Vinícius e Zivkovic deram alma ao Benfica, Sanusi brilhou no Santa Clara

Do lado do Benfica, depois de uma primeira parte desinspirada, foi com as entradas de Carlos Vinícius e Andrija Zivkovic que o futebol 'encarnado' ganhou outra cor. O brasileiro voltou aos golos, quatro meses depois, com dois cabeceamentos certeiros, mostrando classe e faro para o golo; o sérvio voltou a jogar na I Liga ao fim de 15 meses e mostrou o suficiente para que se questione por que razão não foi opção até aqui.

No Santa Clara, Sanusi brilhou mais que todos os outros. Excelente a defender na primeira parte, melhor ainda a atacar no segundo tempo, acabou por ver a sua exibição coroada com um golo de cabeça, então a colocar a sua equipa a vencer por 2-1.

OS PIORES: Nuno Tavares errou quando não podia, Seferovic não 'apareceu' e desapareceu ao intervalo

O jovem lateral-esquerdo do Benfica, Nuno Tavares, fica diretamente ligado à derrota das 'águias'. Foi de um erro seu que nasceu o primeiro golo do Santa Clara, quando errou um passe em zona proibida ao tentar uma saída rápida para o contra-ataque. Depois, talvez marcado por esse lance, mostrou sempre muita ansiedade no segundo tempo, quem sabe com (excessiva) vontade de se redimir.

Já Seferovic recebeu honras de figurar no 'onze' inicial, depois de ter regressado aos golos na jornada anterior, mas praticamente não se viu no jogo. A exceção foi um lance, a meio da primeira parte, em que surgiu isolado e não conseguiu concretizar, mas em que estava em posição irregular. Foi, com naturalidade, que saiu ao intervalo e será com naturalidade que deverá regressar ao banco no próximo jogo, ainda para mais face ao 'bis' de Carlos Vinícius, que entrou par o seu lugar.

AS REAÇÕES

Bruno Lage: "Não podíamos oferecer quatro golos, não podemos andar a lamentar nada"

Bruno Lage: "Desde a terceira jornada que estão muito preocupados com o meu lugar"

João Henriques: " Houve um Santa Clara muito competente e com muita qualidade"

João Henriques: "Muitas vezes falam do Benfica e esquecem-se de quem cá vem jogar..."

O RESUMO