No meio da sua guerra comercial e da sua política de fronteiras, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, está a gerar tensões com o Canadá e o México, co-anfitriões do Campeonato do Mundo que será realizado no próximo ano, isto para além de uma dose de incerteza relativamente à forma como os adeptos serão recebidos.

Em 2017, com a Estátua da Liberdade ao fundo, uma "candidatura conjunta" dos Estados Unidos, Canadá e México para o Mundial de 2026 foi apresentada com uma mensagem de paz e harmonia.

"Não acreditamos que o desporto possa resolver todos os problemas do mundo. Mas acreditamos que é um sinal muito positivo e um símbolo de unificação para os povos dos nossos três países", previu Sunil Gulati, diretor executivo da federação norte-americana de futebol.

Oito anos depois, essas boas vibrações viram-se ofuscadas pela geopolítica, e a eleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos no final de 2024 lança uma sombra sobre certos aspectos dos preparativos para o primeiro Mundial com 48 seleções.

Embora tenha demonstrado o seu compromisso e relacionamento próximo com o presidente da FIFA, Gianni Infantino, Trump tem criticado repetidamente o Canadá e o México desde o início de seu segundo mandato na Casa Branca.

O presidente norte-americano tem variado nos ataques, seja o desejo de restringir o acesso de visitantes estrangeiros ao país, ou querer tornar o Canadá o "51º estado" dos Estados Unidos.

"O relacionamento de longa data que tínhamos com os Estados Unidos, baseado na profunda integração das nossas economias e na estreita cooperação em segurança e defesa, acabou", respondeu o primeiro-ministro canadiano, Mark Carney.

"A tensão é boa"

Questionado sobre o impacto que as tarifas impostas ao Canadá e ao México poderiam ter no Mundial, Trump respondeu que "a tensão é boa; torna as coisas mais interessantes".

No entanto, a guerra comercial iniciada pelo presidente americano parece já estar a prejudicar o setor de turismo. Dados do governo preveem uma queda de 11,6% nas visitas em março de 2025, em comparação com março de 2024.

Andrew Zimbalist, professor de economia no Smith College em Northampton, Massachusetts, não prevê um "impacto significativo" no torneio.

"A menos que a situação política internacional se deteriore significativamente e um boicote em larga escala seja organizado, não prevejo um impacto significativo", disse à AFP.

Uma experiência "sem problemas" para os adeptos

A imprensa tem vindo a questionar o potencial impacto da postura radical de Trump nas fronteiras nos futuros espectadores, uma vez que visitantes oriundos de França, Alemanha, Austrália e Canadá já tiveram a sua entrada nos EUA negada recentemente, ou então foram submetidos a interrogatórios prolongados por parte das autoridades.

"Será que adeptos de futebol realmente vão querer entrar no país agora, ser examinados pelas autoridades simplesmente por falarem uma língua latina e correrem o risco de serem detidos?", questiona o jornal Washington Post.

Para piorar a situação, o presidente dos EUA acaba de decretar uma "proibição de viagens" que restringe a entrada nos Estados Unidos a cidadãos de 12 países, e impõe restrições a outros sete.

Esta medida incide principalmente no Irão, que já se apurou para o Mundial, e potencialmente na Venezuela, que sonha com o seu primeiro Mundial. Contudo, segundo a Casa Branca, as seleções participantes do Mundial não serão afetadas por esta política.

O comité de organização do Campeonato do Mundo, liderado por Trump, garantiu aos adeptos no mês passado que todos seriam bem-vindos e teriam uma "experiência tranquila ao longo de toda a sua visita".

"Queremos que eles venham, que se divirtam, assistam aos jogos. Mas quando acabarem, eles terão que ir embora", acrescentou o vice-presidente JD Vance.

Para o especialista em comunicação desportiva John Zerafa, o governo de Trump terá que "dar um curto-circuito" no atual sistema de vistos e nas suas longas demoras.

"Acredito que os Estados Unidos e o governo Trump farão o possível para tornar esse processo o mais tranquilo possível", disse Zerafa à AFP.

O especialista destacou a "dicotomia entre Trump e a sua base MAGA (referindo-se ao slogan Make America Great Again): trata-se de deixar o mundo entrar na sua casa enquanto se tenta mantê-lo fora dela".