O presidente destituído da Federação Francesa de Futebol (FFF), Noël Le Graët, rejeitou hoje “todas as acusações de assédio moral ou sexual” que motivaram a abertura de uma investigação por parte do Ministério Público de Paris.

Em comunicado enviado à AFP, Le Graët manifestou-se surpreendido por ter tomado conhecimento do inquérito da justiça francesa através dos órgãos de comunicação social e denunciou as “numerosas interferências e pressões políticas”, em especial por parte da ministra dos Desportos, Amélie Oudéa-Castera.

Le Graët sustentou que as intervenções públicas de Oudéa-Castera “não respeitam os princípios fundamentais da separação de poderes, nem da presunção de inocência”, na nota transmitida pelos seus advogados, “desmentindo todas as acusações de assédio moral ou sexual ou quaisquer outros ilícitos criminais”.

O inquérito, iniciado na segunda-feira e tornado hoje público pelo Ministério Público de Paris, surgiu na sequência do depoimento de Sonia Souid, representante de vários jogadores internacionais franceses, perante a Inspeção-Geral da Educação, Desporto e Investigação, encarregada pela ministra dos Desportos de auditar o funcionamento da FFF.

“Neste processo administrativo, manifestamente incriminatório, não foi dado ao senhor Le Graët, nem conhecimento dos elementos [acusações] que lhe dizem respeito, nem a oportunidade de se defender, o que é gravemente atentatório dos seus direitos”, indica o comunicado.

Na semana passada, Souid já tinha acusado o presidente destituído da FFF, em entrevista ao diário desportivo L'Équipe e à rádio RMC: “Disse-me na cara, no apartamento dele, muito claramente, que, se pretendia contar com a sua ajuda, teria de ‘ir para a panela’ [expressão francesa, que significa, entre outras, a obrigatoriedade de aceitar um ato sexual]”, revelou.

“Parabéns pela sua coragem. A nossa auditoria será merecedora dela”, reagiu Oudéa-Castera na conta oficial no Twitter, o que, segundo os advogados de Le Graët, constitui mais um sinal de que “a independência da auditoria administrativa está seriamente posta em causa”.

A investigação judicial a Le Graët, presidente da FFF desde 2011 e cujo mandato terminaria em 2024, é conhecida menos de uma semana após a decisão do Comité Executivo do organismo federativo de afastar o seu líder, substituído de forma interina pelo vice-presidente Philippe Diallo.

Le Graët não resistiu a mais uma polémica, na sequência de declarações efetuadas sobre o treinador Zinedine Zidane que o próprio reconheceu terem sido “desajustadas” e motivaram um pedido de desculpa ao antigo futebolista internacional, considerado um dos melhores jogadores franceses de sempre.

Em 08 de janeiro, pouco depois de a FFF ter prolongado até 2026 o contrato com o selecionador Didier Deschamps, Le Graët efetuou comentários pouco respeitosos sobre Zidane, apontado por alguns órgãos de comunicação social como um possível sucessor do atual técnico dos vice-campeões mundiais.

“Se Zidane tentasse falar comigo, nem falaria com ele. O que lhe iria dizer? Provavelmente: Olá senhor, não se incomode, procure outro clube. Acabei de acertar tudo com Didier [Deschamps]”, afirmou, em entrevista à rádio RMC.

Questionado sobre a possibilidade de Zidane ocupar o lugar de Tite à frente da seleção do Brasil, Le Graët respondeu: “Não sei, ficaria surpreendido. Mas, pouco me importa, ele que vá para onde quiser. Vocês são muito pró-Zidane, dediquem-lhe um programa especial para que encontre um clube ou uma seleção”.

O longo ‘consulado’ de Le Graët ficou marcado por várias polémicas e comportamentos, alegadamente, sexistas, do líder federativo, que deveria disputar com Fernando Gomes, presidente da Federação Portuguesa de Futebol, a candidatura da UEFA a um lugar no Conselho da FIFA.

“É importante que o Comité Executivo da FFF avalie bem a situação, num momento de reflexão que o convido a ter”, declarou Amélie Oudéa-Castera, antes da reunião do órgão federativo, assinalando que existem membros no seu seio com capacidade para “colocar esta federação no bom caminho”.

Segundo a ministra, Le Graët teve uma “falha na função de representação” do futebol gaulês, com declarações que “falharam seriamente”, pelo que deixou um aviso: “Não quero mais estas situações. Ele acostumou-nos com estes despropósitos”.

A governante apontou para algumas frases polémicas do dirigente, em relação a fenómenos de racismo e homofobia no futebol, considerando que as mesmas “podem chocar as comunidades”, além de prejudicarem a imagem de França e ofenderem os franceses.