
O FC Porto refinanciou contas no ano inicial de André Villas-Boas, pautado pela auditoria à anterior gestão e pelas punições de sócios visados na Operação Pretoriano, com julgamento posterior à morte do ex-presidente Pinto da Costa.
Desejosa de abater dívidas de quase 250 milhões de euros (ME) e um passivo acima dos 500 ME, a administração liderada pelo ex-treinador ‘azul e branco’ revelou em novembro passado ter feito a maior emissão de obrigações da história do futebol português, de 115 ME e por 25 anos, seduzindo investidores institucionais no mercado dos Estados Unidos.
Essa operação, intercalada por dois empréstimos no mercado de retalho, que granjearam 21 ME e 50 ME em dezembro passado e março de 2025, respetivamente, permitiu ao FC Porto emitir dívida com taxas de juro mais baixas e encetar a sua revitalização financeira.
Nessa lógica, foi também reforçada a posição do clube no contrato rubricado nos últimos dias da presidência do já falecido Pinto da Costa com a sociedade espanhola Ithaka Infra III para a exploração comercial por 25 anos do Estádio do Dragão, no Porto, cuja verba a embolsar subiu 35 ME face ao montante original de 65 ME, podendo chegar aos 100 ME.
“Em abril de 2024, o FC Porto tinha uma situação de quase calamidade, com uma rotura total de liquidez. Parece impossível pensar que, em 11 meses, se pagou 179 ME do seu passivo. É um passo fundamental e algo que nos orgulhará muito mais é a recompra dos direitos televisivos, que estavam antecipados até 2028. No campo financeiro, é uma das grandes vitórias da administração. Isto permite projetar de forma mais segura o FC Porto enquanto clube de associados, algo que nos parecia impossível quando aqui chegámos”, recordou Villas-Boas, em entrevista ao jornal O Jogo e ao Jornal de Notícias, em março.
A reposição de vencimentos em atraso no universo ‘azul e branco’ foi inquietando a nova gestão, que, ao ser notificada de uma multa de 1,5 ME da UEFA devido a irregularidades da equipa antecessora, entrou pressionada a liquidar dívidas de curto prazo, sob pena de ser aplicada a exclusão das provas europeias - suspensa por duas épocas de probatório.
Apesar do crescimento do passivo, de 520,9 ME para 547,9 ME, e da perda estimada de 40 ME pela ausência da Liga dos Campeões, o FC Porto registou resultados positivos de 334.000 euros no primeiro semestre de 2024/25, reconquistou credibilidade e cumpriu os controlos trimestrais da UEFA, melhorando em outras fontes de receita, entre as quais a bilhética, além de reduzir custos e o capital próprio negativo - de 113,8 ME para 47,4 ME.
O recorde de 173 ME fixos embolsados com transações de futebolistas ajudou também a alavancar a sustentabilidade dos ‘dragões’, que denunciaram em janeiro um total de 58,7 ME perdidos na última década em bilhética, transferências e despesas de representação.
Promessa eleitoral de Villas-Boas, a auditoria forense revelou práticas da gestão de Pinto da Costa que “impactaram negativamente a saúde financeira e a reputação” do FC Porto, num momento em que já estavam em curso as Operações Pretoriano e Bilhete Dourado.
A primeira investiga as alegadas agressões e ameaças a sócios e o clima de intimidação numa Assembleia Geral (AG) de aprovação da revisão estatutária portista, em novembro de 2023, quando o atual dirigente era potencial candidato à sucessão de Pinto da Costa.
As autoridades focaram-se na atuação da claque Super Dragões, liderada por Fernando Madureira, único dos 12 arguidos que está em prisão preventiva desde fevereiro de 2024 e um dos quatro sócios do FC Porto expulsos nove meses depois pelo Conselho Fiscal e Disciplinar do clube - a votação dos respetivos recursos seria suspensa em janeiro, por ocasião de uma AG que confirmou a suspensão por meio ano de outros dois associados.
Na qualidade de representante legal da SAD, que se constituiu como assistente e exigiu cinco ME de indemnização civil, alegando danos reputacionais e prejuízos financeiros, Villas-Boas falou no julgamento da Operação Pretoriano, a decorrer desde 17 de março.
Uma certidão extraída desse processo despertaria a Operação Bilhete Dourado nos dias iniciais da nova gestão, com suspeitas de conluio entre funcionários do FC Porto e uma empresa associada e membros dos Super Dragões na distribuição e venda de ingressos para jogos de futebol do clube, que seriam, depois, comercializados no ‘mercado negro’.
Alguns colaboradores da sociedade Porto Comercial fazem parte dos 13 arguidos desse processo, que acelerou a revisão dos protocolos com as claques, cujos benefícios foram reduzidos já depois de Fernando e Sandra Madureira, sua esposa e também visada na Operação Pretoriano, renunciarem aos cargos de presidente e ‘vice’ dos Super Dragões.
Unânime nas urnas e intransigente em punir quem tenha lesado o FC Porto, André Villas-Boas tem sido criticado por franjas emocionalmente ligadas a Pinto da Costa, com o qual esfriou ainda mais as relações e o desejo de honrá-lo na designação do museu do clube aquando dos resultados da auditoria, lançados a um mês exato da morte do antecessor.
Aos 87 anos, Pinto da Costa foi evocado por figuras de diversos quadrantes sociais, mas não pelos rivais lisboetas Benfica e Sporting, com o atual líder portista a acatar o pedido feito pelo apelidado “presidente dos presidentes” para que não fosse ao seu funeral, por entre várias homenagens do universo ‘azul e branco’ dentro e fora do Estádio do Dragão.
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