A Autoridade Tributária efetuou, na manhã de quarta-feira, 67 buscas no âmbito de uma operação que apelidou de 'Operação Penálti' e que se refere a factos ocorridos entre 2014 e 2022. As SAD de FC Porto, Benfica e Sporting foram alvo de buscas, bem como o filho do presidente dos dragões, Jorge Nuno Pinto da Costa, a agência Gestifute, de Jorge Mendes, e nem as residências de alguns futebolistas escaparam.
Inicialmente, de acordo com o jornal Correio da Manhã, o primeiro órgão de comunicação a dar conta das buscas, avançou-se que estas diziam diretamente respeito à 'Operação Fora de Jogo', ainda em curso. Mais tarde, após um comunicado emitido pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), porém, ficou a perceber-se que se trata de uma nova operação, agora batizada de 'Operação Penálti', que nasce então a partir das investigações da 'Operação Fora de Jogo'.
Como surgiu a 'Operação Fora de Jogo'
Em março de 2020, o Ministério Público explicava que no âmbito de um inquérito dirigido pelo DCIAP, numa investigação a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), tinham sido efetuadas 76 buscas a diversos clubes de futebol, respetivas sociedades e dirigentes, escritórios de advogados e agentes intermediários.
Essas diligências decorreram por todo o país e investigavam negócios do futebol profissional realizados a partir do ano de 2015, as quais terão envolvido ações destinadas a evitar o pagamento das prestações tributárias devidas ao Estado português através da ocultação ou alteração de valores.
Em causa estavam factos suscetíveis de integrarem a prática de crimes de fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais. Um processo desencadeado a partir dos documentos acedidos por Rui Pinto, o principal arguido do processo 'Football Leaks'.
Esta operação levou depois à constituição de um elevado número de arguidos, entre os quais, especificou na altura a Procuradoria-Geral da República (PGR), jogadores de futebol, agentes ou intermediários, advogados e dirigentes desportivos, suspeitos da prática de crimes de fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais.
Por outras palavras, este alegado esquema teria o objetivo de ocultar rendimentos para fugir aos impostos. Ao todo, oito clubes foram investigados, entre eles Benfica, FC Porto e Sporting.
Das transferências envolvidas na investigação na altura figuravam, por exemplo, as de Pizzi, Jonas, Raul Jiménez, Jackson Martínez, Falcao ou Casillas, entre várias outras.
Em novembro do mesmo ano a 'Operação Fora de Jogo' voltou ao terreno, com o MP e o a AT a visitarem os estádios de SC Braga e Vitória de Guimarães, a casa do antigo futebolista e agora empresário Deco e a empresa Gestifute, de Jorge Mendes. Já em 2022, Jonas, antigo futebolista do Benfica, foi retido à chegada ao aeroporto de Lisboa, também no âmbito desta operação.
Até esta data, estão constituídos 134 arguidos na 'Operação Fora de Jogo'.
O que traz de novo a 'Operação penálti'
A 'Operação Penálti' deriva agora dessa 'Operação Fora de Jogo', podendo dizer-se que se trata de um novo capítulo da mesma. Segundo uma nota divulgada pelo DCIAP, as diligências levadas a cabo na manhã de quarta-feira foram efetuadas nas áreas de Lisboa, Porto, Braga, Viana do Castelo, Aveiro e Setúbal e investigam factos ocorridos entre 2014 e 2022, sobre os quais existem indícios de vantagens patrimoniais ilegítimas, fiscais e contra a segurança social, no valor global de mais de 58 milhões de euros.
Em causa nesta operação estão "suspeitas de prática de crimes de fraude fiscal qualificada, fraude contra a segurança social e branqueamento de capitais, ligadas com celebração ou renovação de contratos de trabalho desportivo, pagamento de comissões e circuitos financeiros que envolvem os intermediários nesses negócios, bem como utilização de direitos de imagem".
Os negócios investigados terão visado ocultar ou criar obstáculos para a identificação dos valores reais dos rendimentos e consequente subtração das obrigações fiscais.
Para já, as SADs de Benfica e Sporting confirmaram terem sido constituídas arguidas, depois das buscas realizadas nos Estádios da Luz e de Alvalade. As suspeitas de fraude sobre os dois grandes de Lisboa referem-se a contratos e transferências de jogadores que remontam ao período em que Luís Filipe Vieira e Bruno de Carvalho eram presidentes dos respetivos clubes.
No caso específico do Sporting, os negócios em análise referem-se às transferências de Bas Dost, Naldo, André Pinto, Rúben Semedo, Battaglia, Beto Pimparel e Schelotto.
Na Luz estão em causa três transferências: Rafa, Chiquinho e Vlachodimos. Também as transferências a envolver Gonçalo Guedes (do Benfica para o PSG, do PSG para o Valência e do Wolverhampton para o Benfica) estarão a ser investigadas.
O FC Porto foi igualmente alvo de buscas, tendo os inspetores da Autoridade Tributária passado pelo Estádio do Dragão e pelos serviços jurídicos do FC Porto, na Torre das Antas, mas para já não há ainda confirmação de que os azuis e brancos tenham, também, sido constituídos arguidos. As buscas decorreram ainda na casa de Alexandre Pinto da Costa, agente de futebol e filho de Jorge Nuno Pinto da Costa, presidente do FC Porto.
As buscas de quarta-feira abrangeram também as casas de vários jogadores - fala-se das residências de três jogadores do Benfica (Gonçalo Guedes, Chiquinho e Vlachodimos) - e a Gestifute, empresa de Jorge Mendes. Ao todo, foram executados 67 mandados de busca, sendo que no total do processo de investigação foram definidos até agora 47 arguidos (24 pessoas coletivas e 23 pessoas singulares), entre eles jogadores de futebol, advogados, dirigentes desportivos ou agentes.
E que consequências tudo isto pode trazer?
O SAPO Desporto falou com o advogado Diogo Soares Loureiro, especialista em direito desportivo, que nos explicou as implicações ao nível jurídico desta 'Operação Penálti'.
Diogo Soares Loureiro lembrou que estamos numa fase muito precoce de recolha de indícios que possam demonstrar se a evasão fiscal ou branqueamento de capitais se verificou ou não.
Assim, o advogado frisa que, para já, é prematuro esperar que existam consequências "a não ser que algum dos visados não queira colaborar com a justiça". Desta forma, só depois de analisada toda a documentação poderemos ter consequências.
E essas consequências, explica Diogo Soares Loureiro, no caso da fraude fiscal qualificada podem passar por penas de prisão que podem ir até cinco anos, sendo que no caso do branqueamento de capitais a moldura penal pode ir até 12 anos.
Já desportivamente, de acordo com outros especialistas jurídicos da área, a investigação poderia acabar por resultar na perda de pontos ou mesmo em descidas de divisão, embora esses mesmos especialistas considerem que este caso dificilmente terá efeitos a nível desportivo.
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