Todos os detalhes contam e são estudados ao mais ínfimo pormenor pela Mirpuri Foundation Racing Team na baía de Cascais, onde têm intensificado a preparação com vista à vitória do VO65 português na edição inaugural da Ocean Race Europe.
Já lá vão quase três semanas de trabalho intenso de uma tripulação jovem que vai levar a sustentável embarcação ‘Racing for the Planet’, da Fundação Mirpuri, a competir na regata oceânica, que terá em Cascais o primeiro dos quatro ‘stopovers’ da competição, prevista arrancar em 29 de maio, em Lorient, França, e terminar na terceira semana de junho, em Génova.
Aos 11 velejadores de bordo, juntam-se os elementos da equipa de terra – entre os quais o conceituado Bruno Dubois, vencedor da última edição da Volvo Ocean Race com a Dongfeng Race Team -, que, coordenados, afinam os últimos detalhes da embarcação, treino de navegação, estratégias, preparação física, psicológica e alimentar, num trabalho em conjunto para tentar lidar da melhor forma possível com o imprevisível.
“Estamos praticamente prontos para sair. Vamos subir o barco para finalizar o acabamento e ficar perfeito. Temos o barco muito bem preparado, mas obviamente que com o covid-19 não é fácil planear nada. Nem logisticamente é muito fácil, mas estamos a conseguir dar a volta”, comentou na Marina de Cascais António Fontes, responsável pela equipa de terra, acrescentando ser “complicado planear, sem saber o dia de amanhã, o que se vai passar em França e se vão até mesmo conseguir entrar no país”.
Em vésperas da partida para Lorient, a Lusa embarcou como tripulante visitante no VO65 de design único. O vento soprava os vulgares ‘carneirinhos’ no mar, o que é bom para velejar, comentavam os profissionais, e a ondulação, de impor algum respeito entre leigos, para velejadores experientes parecia “água numa banheira”, como comentava o olímpico português Bernardo Freitas.
Entre a azáfama no convés, ora enrolando cabos, ora içando e mudando a posição das velas, uma delas nova e a ser testada pela primeira vez, o ‘skipper’ francês Yoann Richomme, imponente ao leme, dava indicações aos portugueses Mariana Lobato, Bernardo Freitas e Frederico Melo, ao australiano Jack Bouttell, ao gaulês Nicolas Lunven, aos ingleses Emily Nagel, Olly Young e Rob Bounce e ao espanhol Willy Altadill, acompanhados pelo ‘onboard reporter’ Martin Keruzoré.
“Estou muito contente com a minha tripulação, é jovem, mas tem bastante experiência. Sinto-me um sortudo. Partimos dia 15, vamos fazer cerca de três dias de viagem até Lorient e mais 10 dias de treino em França. Ainda temos algum trabalho pela frente, mas a equipa já está bem oleada”, considerou Yoann Richomme.
Além de garantir estar a tripulação “a aproveitar todas as oportunidades para melhorar o desempenho, desde a parte mental, nutrição, treino físico, manutenção a bordo e de equipamento”, o ‘skipper’ gaulês confessa sentir que foi “colocado tudo neste projeto.”
“O primeiro objetivo é, antes da corrida começar em Lorient, estarmos contentes com o que fizemos, porque a regata será outra história e muita coisa pode acontecer. O principal objetivo, contudo, é ganhar a Ocean Race Europe”, admitiu o homem do leme, reconhecendo que “seria bom vencer a primeira etapa, em Cascais, mas, numa corrida como esta, o mais importante é não cometer erros graves, porque, não sendo uma regata longa, não haverá muitas hipóteses de recuperar.”
Com o VO65 livre de plástico e a navegar em águas abertas, todos têm uma função específica, além da entreajuda. Emily Nagel faz, por exemplo, entre outras coisas, a análise dos dados da performance do barco e Mariana Lobato trata das questões de sustentabilidade e alimentação, transportada em caixas de inox com bamboo, dentro de sacos térmicos de serapilheira e de pano, costurados pela própria com velas antigas e aproveitadas também para sacos de roupa.
“Tem sido intenso, mas é essencial para chegarmos ao alto nível que queremos estar. A integração tem sido boa e tem corrido bem. Estes treinos foram bons para percebermos as mais valias de cada um e aprendemos uns com os outros. Adoro este trabalho de equipa”, rejubilou a atleta olímpica portuguesa, reconhecendo ser necessário, por vezes, “mudar o ‘chip’ e não ser muito rígida” com os rapazes.
Nesta reta final da preparação, a equipa portuguesa está alojada no mesmo local, onde fazem avaliação de vídeos, assim como da telemetria do barco, e partilham as refeições preparadas pelo ‘chef’ Duarte Alves, com base numa alimentação isenta de glúten, reforçada em hidratos de carbono e proteína, muito variada, com poucos açucares e alimentos orgânicos, nacionais e de alto valor nutricional.
A alvorada é cedo e às 7:30 é hora de ginásio, antes do pequeno-almoço, e da deslocação de bicicleta para a Marina de Cascais, de onde partem habitualmente para cinco a seis horas de treino no mar.
“A primeira semana foi bastante dura. Fizemos duas tiradas ‘offshore’, uma de 24 horas e outra de quatro dias, mas foi importante para treinar para esta regata de etapas curtas, que não nos permitirá entrar na rotina. Vamos todos ao limite e dormir muito pouco, por isso é preciso treinar tudo isso, assim como as alterações das velas e as manobras para tentar estar o mais sólido possível e minimizar ao máximo os erros”, avançou Bernardo Freitas, antes da Lusa abandonar o barco português, na sua versão 100% sustentável, rumo a mais um treino até Sesimbra com vista à ambicionada vitória na Ocean Race Europe.
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