Crianças obrigadas a ficar "penduradas" nas argolas de ginástica por chegarem atrasadas ao treino, a abrir excessivamente as pernas em exercícios de alongamentos, proibidas de ir à casa de banho e de beber água durante sessões mais prolongadas. Estas são algumas formas de abuso físico e psicológico levados a cabo por treinadores da Federação Britânica de Ginástica a várias crianças, menores de 12 anos, e que constam do relatório elaborado pela magistrada Anne White.
A investigação, encomendada em 2020, custou cerca de 3,5 milhões de euros e conta com mais de 400 depoimentos de crianças ginastas. As conclusões foram conhecidas esta quinta-feira e divulgadas por grande parte da imprensa britânica: dezenas de crianças ginastas sofreram abusos físicos, mentais e alguns até mesmo de ordem sexual, além de intimidações e humilhações por parte dos seus treinadores.
De acordo com o 'Whyte Review', nome que foi dado a este relatório, os abusos desdobravam-se nas mais variadas formas: controlo obsessivo do peso das ginastas, o que resultava em privação de comida e de água, ao ponto de várias crianças terem de esconder barras energéticas nas meias; algumas ginastas revelaram que durante os alongamentos alguns treinadores forçavam tanto as pernas - alguns chegavam mesmo a sentar-se em cima delas - ao ponto de não saberem como as pernas simplesmente "não se partiam"; abusos emocionais e insultos - como por exemplo chamar as atletas de "gordas" e "baleias".
A isto juntam-se ainda 30 entrevistas em que são detalhados abusos sexuais que não foram levados a sério quando reportados. Entre 2008 e 2016, a Federação nem sequer guardava registo de queixas feitas contra os seus treinadores, escreve o jornal 'The Guardian'.
"Uma pessoa imagina quantos escândalos desportivos serão necessários até o governo entender que precisa de agir para proteger crianças que participem no desporto. Ouvi relatos extremos de ginastas que escondiam comida, por exemplo, debaixo do telhado ou da cama dos seus quartos, porque existiam treinadores que faziam inspeções de estilo militar às suas malas de viagem, à procura de comida", lê-se nas conclusões finais do relatório.
O "White Review" teve o aval da UK Sport [responsável pelo investimento no desporto olímpico e paralímpico no Reino Unido] e da Sport England [órgão público fundado pelo Departamento da Cultura, Média e do Desporto do Reino Unido] e foi iniciado depois de terem sido feitas centenas de denúncias de abuso na Federação Britânica de Ginástica.
O mesmo estudo explica que esta cultura disciplinar acabou por ser ainda mais incentivada com o sucesso desportivo. Até 2008, nenhuma ginasta britânica tinha conquistado uma medalha olímpica, sendo que desde então o Reino Unido conseguiu somar 16 pódios.
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