Campeões de basquetebol universitário há menos de uma semana, a festa da equipa da AEFMH acabou por não durar muito... O sucesso desportivo que têm alcançado voltou, mais uma vez, a ser ofuscado pela falta de financiamento para poderem representar Portugal nos EUSA Games 2024, na Hungria, em julho. Em conversa com o SAPO Desporto, o treinador, Miguel Polici, e o subcapitão, Hugo Maricato, destacaram a resiliência de uma equipa "com uma ligação sem igual".

O caminho da equipa de basquetebol masculino da AEFMH começou a ser traçado em 2021 e desde aí que os resultados estão à vista de todos. Em 2021/2022 conquistaram os primeiros campeonatos universitários, tanto em Lisboa, como a nível nacional e apesar da dificuldade conseguiram marcar presença no Campeonato Europeu, muito por causa do treinador que recorreu a investimento privado para poder tornar o sonho, uma realidade.

"O nosso treinador tem uma empresa de têxtil e conseguiu avançar com um empréstimo à Associação de Estudantes, o que acabou por cobrir o dinheiro necessário, sendo que, o empréstimo acabou por ser pago pela Associação ao longo dos anos", explicou Hugo Maricato.

Mas, houve também uma união de "toda a comunidade estudantil da região de Lisboa" que acabou por aliar-se à causa da equipa: "Algumas associações de estudantes de faculdades ou universidades doaram, ou disponibilizaram-nos algum valor monetário a título de empréstimo, vários privados contribuíram com o que podiam, e os nossos colegas da faculdade também se uniram e doaram", começou por contar o treinador, Miguel Polici.

Na temporada seguinte o segundo lugar acabou por gerar a possibilidade de representarem Portugal, mas, desta vez, a falta de financiamento não permitiu que o sonho se realizasse. Este ano, após voltarem a ser campeões universitários de basquetebol em Lisboa e a nível nacional, correm o risco do mesmo voltar a acontecer...

"A associação de estudantes não tem a capacidade e o treinador não conseguia com a empresa dele avançar com um novo empréstimo", afirmou o subcapitão em conversa telefónica com o SAPO Desporto, enquanto pelas ruas de Algés, com mais três colegas tenta arranjar financiamento.

Para além de tentarem "outras formas de dinamizar" a colheita de fundos, como "lavagens de carros ou vendas de rifas", a equipa de basquetebol da AEFMH acabou por criar uma conta no Go Fund Me para tentarem conseguir cinco mil, dos 19 mil euros necessários. O valor mais baixo do que o necessário tem uma razão, já que "a plataforma só deixa retirar o dinheiro quando chega ao objetivo proposto", revelou Miguel Polici.

"Temos estes cinco mil euros no Go Fund Me porque temos de pagar uma porção entre segunda ou quinta-feira, ainda não há um prazo definido por falta de organização da EUSA (entidade que organiza os jogos universitários). Mas, é entre, no mínimo, três mil euros e, no máximo, cinco mil", explicou o subcapitão que espera ainda que o "restante financiamento, cerca de 11 a 12 mil euros, seja doado pela Faculdade de Motricidade Humana e pela Universidade de Lisboa", numa altura em que ainda não obtiveram resposta das entidades.

"Nós representamos a Universidade de Lisboa nos campeonatos da Europa e nunca existiu qualquer tipo de financiamos. O desporto universitário tem de ter um maior reconhecimento na região de Lisboa. Atualmente, o Norte tem uma grande vantagem, o desporto universitário é muito bem organizado e apoiado. Os clubes que rodeiam estes estabelecimentos de ensino apresentam equipas muito mais competitivas, e acabam por ver o desporto universitário como uma importante etapa na formação de jogadores e de treinadores, que é o meu caso", explicou Miguel Polici.

Quanto a um possível apoio da Federação Portuguesa de Basquetebol, a situação é diferente.

O técnico revelou que "há conversas por parte da Federação Académica do Desporto Universitário (FADU) no sentido de responsabilizar a Universidade de Lisboa e a Faculdade de Motricidade Humana pelo financiamento da prova", uma vez que, a competição é homologada pela FADU, Polici explica que "a Federação Portuguesa de Basquetebol pouco tem a ver com o torneio, apesar que há dois anos terem sido uma boa ajuda".

"Há dois anos entrámos em contacto e a Federação auxiliou-nos com a quantia de mil euros, quando precisávamos de 12 mil. Neste ano, estamos a contar entrar em contacto ainda hoje (sexta), mas sinceramente não sei se iríamos pedir ajuda monetária. Claro que gostaríamos, mas não sei", acrescentou o subcapitão.

A equipa de basquetebol universitário da AEFMH
créditos: AEFMH

A falta de apoio ao desporto em Portugal é um tema que vemos recorrentemente na agenda noticiosa, questionado sobre este assunto o suspiro de Hugo Maricato foi bastante percetível: "Em Portugal desde que acompanhamos e vivemos o desporto sempre passámos estas dificuldades, principalmente, alguns de nós que jogámos a um nível mais alto, vemos isto desde os níveis mais baixos aos mais altos, da formação aos seniores".

"Não há apoio e não há, principalmente, investimento. Nos últimos três anos vemos muito investimento pelas casas de apostas nas principais ligas feminina e masculina de basquetebol, o que tem trazido muita visibilidade. Mas, a verdade é que, se não estou em erro, com um investimento de cerca de dois milhões em cada uma das duas Ligas, ainda falta muita coisa no desporto", prosseguiu.

Miguel Polici vai ainda mais longe, assumindo que "o desporto universitário está mal implementado no nosso país", já que "ganhava muito mais se as várias federações andassem de mãos dadas com as universidades".

O treinador acrescentou ainda que apesar de "super competitivo", o campeonato universitário acaba por estar mal organizado a nível de calendarização: "Se os calendários fossem programados tendo em conta a competição nos clubes ou das avaliações nas licenciaturas e mestrados, a valorização seria bem maior e acredito também que por se tornar em algo mais sério e credível, o seu financiamento seria muito superior, minimizando o risco de aparecer uma situação igual há que a minha equipa de basquetebol vive nos últimos 3 anos".

Mas, adversidades é uma coisa que não afeta esta equipa, que apesar de estar junta há apenas três anos é como se de uma família se tratasse e em que o grande objetivo não é "apenas e só lutar por trazer medalhas e campeonatos, mas por ter mais momentos juntos".

"A nossa equipa é caso de estudo, treinamos tal e qual uma equipa federada, a nossa faculdade nesse aspeto é impecável. O amor pela modalidade é o que nos une e o que nos faz treinar é o facto de termos mais uma oportunidade para estarmos todos juntos a divertir-nos a jogar o que mais gostamos", explicou Polici.

"Temos cerca de 15 ou 16 jogadores, mas cerca de oito ou dez deles estão desde o primeiro ano. Criámos uma ligação que, isto parece cliché, mas eu nunca vi. Estive em seleções nacionais na formação e joguei na Segunda Liga e nunca vi uma ligação tão grande como equipa. Acabámos por ficar todos amigos e lutamos sempre pelos nossos objetivos, apesar de tudo, é o que nos acaba por motivar", afirmou Maricato antes de fazer uma confidência:

"Neste momento estou na rua, em Algés, com três dos meus colegas de equipa à procura de ajuda, de financiamento. Eles estão aqui à minha frente a rir-se porque sabem que é verdade. Só queremos estar juntos e representar a faculdade é algo que nos dá mesmo muito gosto, por isso só nos focamos naquilo que podemos controlar", concluiu.

Até há data da publicação deste artigo (26 de abril, às 18h38) a equipa da AEFMH conseguiu amealhar 315€ dos cinco mil necessário no Go Fund Me.