O cabo-verdiano Jordin Andrade sentiu o fim da carreira no atletismo na primeira curva da eliminatória dos 400 metros barreiras dos campeonatos do mundo, no sábado, quando a lesão no joelho esquerdo o obrigou a abandonar a competição.

Aos 30 anos, o antigo barreirista do Sporting, nascido em Washington, nos Estados Unidos, disputou em Eugene, no estado norte-americano do Oregon, os seus segundos campeonatos do mundo, depois da estreia em Londres2017, quando ficou pelas eliminatórias, com 50,32 segundos.

Inspirado pelo tio Henry Andrade, também olímpico na mesma disciplina por Cabo Verde em Atlanta1996, Jordin esteve nos Jogos do Rio2016 - nos quais se tornou no primeiro representante do país africano a chegar a umas semifinais - e de Tóquio2020.

“Quero começar por agradecer e honrar Cabo Verde, pela oportunidade que me deram para representar o país, porque tem sido uma experiência incrível, não podia pedir mais do que o que me ofereceram e espero que inspire muitos jovens”, iniciou Jordin Andrade, filho de emigrantes cabo-verdianos nos Estados Unidos, em entrevista à agência Lusa.

A simpatia e boa disposição camuflavam o momento da despedida do estádio Hayward Field, na ‘cidade do atletismo’ norte-americana, onde, em 2015, estabeleceu o seu recorde pessoal em 49,24 segundos, após o abandono precoce, por lesão, da primeira série das eliminatórias dos metros 400 barreiras dos Mundiais.

A correr como individual, depois de ter representado o Sporting, que deixou de o apoiar, as dificuldades de representar um pequeno país acentuam-se: “Fiquei sem poder viajar, deixei de poder pagar o meu treinador, deixei de poder pagar o arrendamento da minha casa, pelo que tive de arranjar dois empregos para viver”.

“Não é fácil ser um atleta falido. Representei o Sporting durante quatro anos e só fui pago por um. Eu adoro atletismo, até como adepto. Eu hoje senti o ambiente e pensei logo: eu vou fazer isto, vamos lá! Mas superei a primeira barreira e a primeira dor, mas, na segunda, senti logo que o meu corpo tinha de parar e parei”, explicou o 56.º do 'ranking' mundial.

Sem a oportunidade de se dedicar a 100% ao atletismo, Jordin mudou-se de Raleigh, na Carolina do Norte, onde tinha um treinador a tempo inteiro, para Dallas, no Texas, para se dividir por dois empregos, como professor substituto e trabalhador no aeroporto.

“E é muito por isso que eu estou neste estado hoje – Jordin chegou à zona mista do Hayward Field a coxear, depois de ter desistido da sua eliminatória – eu não pude pagar a um fisioterapeuta e tenho recorrido a um estudante para ter a minha recuperação”, lamentou à Lusa, recordando ser agora orientado em ‘part-time’ e treinando praticamente sempre sozinho.

Já em 2021 uma lesão quase o afastou dos Jogos Olímpicos, mas o recurso a um treino alternativo ainda o levou ao Estádio Olímpico de Tóquio.

“Depois do meu primeiro ano em Dallas, tentei forçar, porque estava muito ansioso por competir, e, em vez de estar melhor, estava a piorar, um mês antes apostei em treino de bicicleta e, em Tóquio, na primeira vez no ano que corri sem dores, melhorei um segundo o melhor tempo da temporada (50,64), é por coisas como estas que eu gostava de ter um treinador, uma equipa de apoio”, referiu.

Sem isso, apesar de assegurar continuar “rápido” e que poderia continuar a carreira, Jordin Andrade já olha, seriamente, para o seu futuro longe das pistas.

“Vou começar a estudar para ser quiroprata. Gostava de fazer muito pelo meu país, mas preciso, precisava de dinheiro, mas a minha carreira parece estar cada vez mais perto do fim por coisas como estas. Cabo Verde apoia-me, e estou agradecido, porque me apoiam a continuar, mas, como vivo nos Estados Unidos, não é suficiente para sobreviver, sem mais nenhum apoio”, concluiu.