A atleta olímpica Marta Pen, que voltou à competição pela seleção portuguesa após ser diagnosticada com cancro da mama, diz à Lusa que o atletismo a preparou para esta luta e “fez parte da cura”.
“O atletismo preparou-me muito para este momento. Sendo uma pessoa com alguma exposição para coisas boas, também achei que faria sentido passar um pouco de realidade, tendo também consciência que um dos principais problemas do cancro da mama é o diagnóstico. Eu tinha 30 anos, tenho exames ao sangue normais, faço exercício... não havia absolutamente nada. No meu caso, nem o fator genético”, conta Marta Pen, em entrevista à Lusa.
Depois do 50.º lugar nos Europeus de corta-mato, no domingo, em que foi a terceira portuguesa a pontuar, Pen analisa o momento de divulgar o diagnóstico, em julho, depois de a saúde a ter ‘traído’ na campanha para estar pela terceira vez seguida nuns Jogos Olímpicos.
“Sinto que foi muito difícil, na altura em que não sabia como passar esta informação. Como atletas, é mais fácil passar momentos de superação do que fragilidade. Hoje em dia, os atletas têm muito mais responsabilidade do que só chegar à pista nas melhores condições. Acabámos por viver, de forma muito intensa, muitas metáforas para a vida de qualquer pessoa. Querer muito um objetivo e não conseguir, estar frustrado, as coisas saírem do controlo, ter uma lesão...”, reflete.
O pensamento articulado e a honestidade quanto a um tema delicado levam-na a explicar que a partilha teve, também, o condão de sensibilizar para a necessidade de atenção permanente – e especializada.
“O problema, nestes problemas, é que muitas vezes não queremos ir às pessoas certas para ouvir o que temos de ouvir. Ficamos no Google, na nossa cabeça, e o tempo vai passando. Neste caso, o tempo faz toda a diferença. Hoje, não tenho medo de perder a minha vida. Acho que, se tivesse algum descuido, principalmente em altura de Jogos, [porque] estava em estágio de altitude, e quisesse ignorar, hoje não estaria numa posição muito agradável”, admite.
Como “os casos têm de ser detetados cedo” para que os avanços na medicina, que elogia, possam surtir efeito, decidiu partilhar o processo por que passava já há meses, quando tornou público o diagnóstico em julho deste ano, “porque havia coisas positivas a passar”.
“Pela sensibilização, também pela ideia de que os atletas são invencíveis. Se acontece a uma atleta de 30 anos, acontece a qualquer um. O atletismo deu-me muitas ferramentas que me têm permitido viver este momento de forma presente”, comenta.
Como quer “ser presente” em relação ao seu problema de saúde, isso não significa “que não existe, ou que se ignore e viva num mundo cor de rosa”, mas antes “abraçar as coisas quando estão bem e entender quando não estão bem”, conseguir “ter essa calma e paz de espírito”.
“Muitas vezes vivemos num mundo em que nos ensinam que, quando as coisas não estão bem, temos de entrar em pânico. No meu caso, senti muitas vezes que algumas pessoas achavam que se estava stressada, devia estar calma, e se estava calmo, queriam stressar-me”, lamenta.
Nesse mundo, a alta competição ensinou-a a lidar com o stress, e que “não é por ter pressa que chegamos mais rápido”, aplicando “muitos ensinamentos e muitas das coisas difíceis” que foi aprendendo na modalidade.
“O atletismo fez parte da cura, e neste momento estou a fazer tudo o que é preciso para garantir que a minha saúde está em primeiro lugar. Há espaço para tudo. Consegui qualificação, por mérito, [para os Europeus de corta-mato], fui a terceira portuguesa a pontuar, fomos 10.ª classificadas, e tenho muito orgulho na minha preparação e na minha prestação, o que me deixa entusiasmada pelo futuro”, atira.
A atleta olímpica, que em julho anunciou estar a recuperar de cancro da mama, foi 36.ª nos 1.500 metros no Rio2016 e 19.ª em Tóquio2020, tendo participado nos Mundiais Londres2017 (32.ª), Oregon2022 (30.ª) e Budapeste2023 (42.ª) e nos Europeus Amesterdão2016, nos quais foi quinta, Berlim2018, sexta, e Munique2022 (19.ª).
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