A câmara térmica do Laboratório de Aerodinâmica Industrial da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra permite fazer um processo de aclimatação aos atletas de alta competição, que vão competir em zonas com condições climáticas adversas.
Vários desportistas nacionais, de diferentes modalidades, têm treinado nos últimos anos na câmara térmica para que o seu organismo se adapte às caraterísticas dos locais em que vão disputar provas, com vista a melhorarem a sua performance desportiva.
"O organismo responde a situações de stress de forma violenta e exagerada e quando vamos para um clima em que essas caraterísticas são adversas, acontece um aumento da frequência cardíaca exagerado, aumento exagerado do consumo energético, uma diminuição da eficiência energética, o que em termos desportivos e da performance é desastroso", explicou à agência Lusa o investigador Amândio Santos.
Segundo o fisiologista e coordenador da prestação de serviço para atletas de elite, a câmara térmica permite ao longo de vários dias adaptar o organismo "a lidar com essas situações e a torná-lo mais eficiente, pois perde menos volume plasmático, a frequência cardíaca baixa, a economia de esforço é cada vez maior e o organismo reage de uma forma muito mais amena depois de passar por este processo".
O laboratório esteve a trabalhar para os campeonatos do Mundo de Atletismo em Doha, que decorreram em setembro, e já o tinha feito para os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro (2016), e, neste momento, está já de baterias apontadas aos Jogos Olímpicos Tóquio2020.
"Nesta câmara já passou a seleção nacional de fundo e meio-fundo do atletismo português e alguns dos nossos melhores ciclistas e os marchadores nacionais João Vieira, Ana Cabecinha e Salomé Rocha [fundo], entre outros", salientou Amândio Santos.
Neste momento, acrescentou, o laboratório está " a alargar o leque a outras modalidades que tenham uma longa duração, como ciclismo e o triatlo, pois as provas mais longas são aquelas em que [os atletas] sofrem mais com as condições climáticas adversas".
"Sem dúvida que é uma ajuda para os atletas. Obviamente que os resultados são um processo multifatorial, em que existem muitos outros fatores, desde a preparação, controlo da ansiedade, todos os aspetos psicológicos, a nutrição, mas a câmara térmica dá uma aprendizagem a nível energético, quais as vias que vamos utilizar, como é que temos de hidratar, como é que o organismo reage a estas situações adversas e vai ajudar muito os atletas a lidar com essas situações", sublinhou.
Ao nível dos atletas de alta competição, Amândio Santos diz que já está "habituado a que as respostas sejam individualizadas", salientando que o marchador João Vieira foi um atleta que fez "o processo de aclimatação com maior facilidade".
"Ele aclimatou-se muito bem, enquanto outros atletas tiveram muitos problemas, tivemos de ter estratégias completamente diferentes, durações completamente diferentes, mecanismos de arrefecimento completamente diferentes, porque as dificuldades deles eram muito maiores para aclimatar", disse.
Salientando a importância da câmara térmica na preparação do marchador, Amândio Santos frisou que "um organismo aclimatado se torna muito mais eficiente".
"Toda a energia que o João Vieira tinha disponível para a prova era necessária, portanto, se a gastássemos de uma forma exagerada no início, dificilmente ele teria tão bons resultados" na prova, na qual se sagrou vice-campeão do mundo de 50 quilómetros marcha, referiu.
Inicialmente, a câmara térmica do Laboratório de Aerodinâmica Industrial foi desenvolvida para estudar diversos ambientes de trabalho, dada a sua capacidade para variar a temperatura e a humidade.
Há cerca de quatro anos "houve um contacto com a Faculdade de Ciências do Desporto para o desenvolvimento de metodologias experimentais para apoio nas avaliações das performances dos atletas”, porque há “capacidade para desenvolver software e sistemas de medição para diferentes finalidades", explicou o professor Manuel Gameiro, que coordena o Grupo de Investigação em Energia, Ambiente e Conforto da Associação para o Desenvolvimento da Aerodinâmica Industrial (ADAI).
"Na altura, chegou-se à conclusão que era interessante utilizar também aquelas instalações para poder proporcionar aos atletas condições semelhantes às que eram esperadas nos locais onde iam fazer as competições", recordou.
Numa primeira fase, o objetivo passou por observar "de que forma essas condições alteravam as prestações dos atletas, mas depois evoluímos de modo a aclimatarmos os desportistas, preparando-os sob o ponto de vista fisiológico e psicológico para os locais onde vão competir".
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