A atleta Conceição Grare acentuou no domingo o estatuto de totalista mais veterana da Maratona do Porto, ao completar duas dezenas de presenças na sua prova predileta, sobressaindo pela popularidade e carisma no pelotão nacional.

“Desde a edição inaugural, que ditou a minha primeira maratona, a família da Runporto acolheu-me sempre muito bem. Já tenho mais de 50 maratonas, mas não posso passar sem esta. Para mim, continua a ser a melhor a nível de relações de amizade, de cuidados na organização… É tudo maravilhoso”, vincou à agência Lusa, após ter cortado a meta.

Conceição Grare, que celebrou 71 anos em 19 de julho, terminou o percurso de 42,195 quilómetros entre Porto, Matosinhos e Leça da Palmeira em 3:57.11 horas, ficando no 1.682.º lugar da classificação geral, que consagrou o ugandês Abel Chelangat ao fim de 2:10.01, e em 165.ª no setor feminino, dominado pela queniana Naom Jebet, em 2:30.00.

“Foi cansativo, porque tinha estado há cinco semanas a correr nos 50 anos da maratona de Berlim [cronometrou 3:40.52 horas], mas tive aquela vontade de estar cá a ajudar e a mostrar companheirismo. Tenho tempos espetaculares no Porto, mas o objetivo para este ano era só terminar e ficar feliz. Queria fazer menos de quatro horas, pois nunca fiz uma maratona acima disso”, notou, competindo em representação do PAC Running Academy.

Terceira classificada entre as mulheres em 2011, quando estabeleceu em 3:09.16 horas o seu melhor desempenho de sempre no evento portuense, atrás da queniana Pauline Chepchumba, vencedora, e de Alice Basílio, segunda, Conceição Grare foi recebendo diversas manifestações de afeto do público antes, durante e depois da prova.

“[As pessoas] Estão sempre a dar-me entusiasmo e dizem que sou uma inspiração. Esta minha participação tinha algo muito especial: foi dedicada a uma colega do nosso grupo de treino, a Cláudia, que está no hospital. Era para ser a primeira maratona dela e eu só queria ainda mais fazer a prova por ela”, partilhou, enquanto apontava para a camisola predominantemente azul, na qual carregava consigo uma fotografia estampada da amiga.

Além das 20 presenças na estrada, Conceição Grare competiu na edição virtual de 2020, em plena pandemia de covid-19, e figura num restrito elenco de 15 totalistas, que foram homenageados pelo diretor-geral da Runporto, Jorge Teixeira, em 29 de outubro, durante a apresentação do 20.º aniversário de uma das mais participadas maratonas portuguesas.

“Vou continuar até onde a minha saúde der. O Jorge Teixeira diz sempre isto: até aos 35 quilómetros, a maratona é com as pernas. Depois, é a cabeça a funcionar e há que ter força para ir até ao final”, admitiu, estando acostumada a fazer “seis treinos por semana”.

De porte franzino, Conceição Grare já totalizou centenas de quilómetros em maratonas internacionais, passando por Berlim, Madrid, sendo nona da geral em 2013, Roma ou Paris, onde chegou ao recorde pessoal de 2:59.26 horas em 2011, então com 57 anos.

“Há que ter fé e vontade de chegar a uma meta. Não é olhar para o tempo, mas dizer ‘eu consegui fazer 42 quilómetros’. Aquela sensação que se tem no fim é indescritível. Mesmo que estejamos todo o caminho a sofrer, não há nada igual como acabar e ter esta emoção”, assumiu, num dia em que era a mulher mais velha em competição no Porto.

Residente em Vila Nova de Gaia, que ficou ausente do trajeto deste ano, devido às obras de construção da Ponte D. Antónia Ferreira, impedindo a habitual travessia sobre o rio Douro através da Ponte D. Luís I, Conceição Grare só descobriu o gosto pelas corridas aos 48 anos, quando estava emigrada há quatro décadas na Suíça e trabalhava como contabilista.

A estreia na meia maratona de Greifensee, no cantão de Zurique, estimulou-lhe novos horizontes competitivos e de socialização, que seriam abraçados com regularidade, ao voltar a Portugal dois anos depois e ingressar nos treinos da Porto Runners, sob apoio emocional e logístico do marido, mas sem necessidade de seguir uma dieta rigorosa.

“Acho que sou um mau exemplo para todos [risos]. O Jorge Teixeira dá-nos os treinos e diz-me que não vale a pena estar a pedir para que eu só faça 10 quilómetros. Eu faço logo 20. Agora, sou capaz de voltar atrás para ir buscar amigos e incentivá-los a acabar a prova. Tenho prazer em fazer isso”, acrescentou esta fã de longas distâncias, que já enfrentou com sucesso a ultramaratona anual de 100 quilómetros de Millau, em França.