Portugal superou apenas em um lugar a melhor classificação de sempre no Europeu de andebol, mas a sexta posição no Euro2020 pode representar um salto gigante para a modalidade, após 14 de anos de ausência dos grandes palcos.
Apesar da derrota sofrida no sábado frente à Alemanha, por 29-27, no jogo de atribuição do quinto e sexto lugares, a seleção portuguesa despediu-se com o estatuto de grande surpresa do Europeu, que a levou a superar o sétimo lugar alcançado em 2000, na Croácia, anterior zénite da participação nacional na prova.
"Estamos nos seis melhores da Europa, que é como estar nos seis melhores do mundo. A Europa pode contar com Portugal, mas não podemos parar, ainda temos de fazer muito no nosso país. Espero que não demore tanto tempo, porque foram 20 anos", disse o selecionador português, Paulo Pereira, após o encontro com os germânicos, realizado em Estocolmo.
Portugal deixa o Euro2020 com um saldo de quatro vitórias - apenas menos uma do que o total alcançado nas cinco participações anteriores - e outras tantas derrotas, numa caminhada em que bateu ‘colossos' como a França e a Suécia e em que chegou a sonhar com a qualificação para as meias-finais.
"Deixei escrito no balneário: obrigado. Só. Só temos de agradecer. Estes atletas são excecionais", revelou Paulo Pereira, que, após ter superado a fase preliminar na competição, proferiu a expressão "o céu é o limite", que marcaria o resto da campanha lusa.
Portugal tinha acabado de eliminar a campeoníssima França, que venceu por 28-25 na estreia no Grupo D da ronda preliminar, no qual cumpriu sem igual brilhantismo a tarefa de vencer a Bósnia-Herzegovina (27-24), antes de perder com a ‘supersónica' Noruega (34-28), medalha de bronze.
A derrota em Trondheim com uma das anfitriãs do campeonato foi duplamente penalizadora, uma vez que os resultados entre as equipas apuradas transitam para a ronda principal, mas o histórico triunfo por 35-25 sobre a Suécia, quatro vezes campeã mundial, olímpica e europeia, manteve o olhar fixado no "céu" que Paulo Pereira apregoara.
O triunfo sobre a anfitriã do Grupo II da ronda principal, em Malmö, parecia capaz de lançar Portugal até para algo mais do que a melhor classificação de sempre, mas o sonho de subir pela primeira vez ao pódio desvaneceu-se nas derrotas com a Islândia (28-25) e a Eslovénia (29-24).
Seguiu-se a vitória categórica sobre a Hungria, por 34-26, que colocou a equipa nacional na inédita posição de discutir o quinto lugar e atraiu ainda mais os ‘holofotes' para os seus jogadores, três dos quais estão entre os candidatos ao sete ideal: Alfredo Quintana, Rui Silva e João Ferraz.
"Ainda ninguém me perguntou pelo Gilberto Duarte", observou Paulo Pereira, ainda em Trondheim, considerando essa ‘omissão' a maior prova do sucesso da equipa que lidera. Afinal, nem se notou que Portugal disputou o Europeu sem o seu melhor jogador e marcador na fase de apuramento, devido a lesão.
Sem Gilberto Duarte, mas com o guarda-redes Alfredo Quintana, um dos três cubanos naturalizados portugueses que representam a seleção, a par de Alexis Borges e Daymaro Salina, que se assumiu como a principal figura da ‘equipa das quinas', ao ponto de ter sido designado o jogador mais valioso nos jogos com a Bósnia e a Suécia.
Quintana deixou quase sempre sentado no banco de suplentes o veterano Humberto Gomes, que, aos 42 anos, tem o dobro da idade do pivô Luís Frade, de 21, o português mais jovem no Euro2020. Um destino, ainda assim, melhor do que o de Gustavo Capdeville, terceiro guardião, o único que não chegou a estrear-se.
Antes do jogo inaugural, Humberto Gomes era mesmo o único atleta que tinha jogado na fase final do Europeu, em 2004, pois o pivô Tiago Rocha não chegou a atuar no torneio de 2006, apesar de ter sido convocado, reflexo da longa ausência de Portugal das grandes provas internacionais.
O ponta direito António Areia foi o melhor marcador luso, com 26 golos, apesar de quase metade (12) terem sido obtidos através de livres de sete metros, seguido do colega do lado oposto Diogo Branquinho, com 22, mas nenhum de penálti.
João Ferraz é, a par do ponta direito Pedro Portela, o terceiro mais concretizador, com 20 golos, registo que terá contribuído para colocar o lateral direito entre os candidatos ao sete ideal do torneio, na companhia de Quintana e do central Rui Silva.
O estratega da ‘equipa das quinas' foi outro jogador em destaque e foi por ele que passou todo o jogo atacante, como o provam os 1.300 passes efetuados e 1.292 recebidos, números que apenas são superados pelos do sueco Jim Gottfridsson, mas a grande força de Portugal foi mesmo a união do coletivo.
O sucesso de Portugal não pode ser dissociado do FC Porto, que empresta nove jogadores à seleção, ou seja, metade do grupo de 18 convocados, entre os quais Quintana e todos os intérpretes do modelo atacante ‘sete contra seis', desenvolvido pelo treinador portista, o sueco Magnus Andersson.
Ainda durante a ronda principal, Paulo Pereira lembrou a ‘geração de ouro' do andebol português, da qual Carlos Resende, jogador com maior número de jogos (22) e golos (108) no Europeu, é a maior referência, apenas para notar que, talvez, a melhor geração estivesse a fazer o seu caminho no Euro2020.
O pivô Luís Frade e o lateral esquerdo André Gomes representam uma nova geração de sucesso do andebol nacional, tendo sido peças nucleares das seleções que terminaram em quarto lugar no Europeu de sub-20, em 2018, e no Mundial de sub-21, no ano seguinte.
"Essa é a grande ambição: fazer com que esta participação não seja episódica. Acho que agora estamos em condições de estar de forma regular entre os melhores, em Europeus, Mundiais e Jogos Olímpicos", disse à agência Lusa o presidente da Federação de Andebol de Portugal, Miguel Laranjeiro, após o jogo com a Alemanha.
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