A triatleta Hoi Long vai falhar os Surdolímpicos no Brasil devido às medidas anti-pandémicas impostas no regresso a Macau e segundo especialistas a falta de contacto internacional está a pôr em causa o desenvolvimento de desporto do território.
Por estes dias, a triatleta Hoi Long deveria estar a representar Macau nos Jogos Surdolímpicos (01 a 15 de maio), em Caxias do Sul, no Brasil. Mas “devido à política de quarentena de Macau”, a desportista de 37 anos acabou por não avançar com a inscrição.
Além do “risco muito elevado” de infeção no Brasil, o que “afetaria a preparação” para os Jogos Asiáticos em setembro – entretanto soube-se que foram adiados - as restrições impostas no regresso a casa são, de acordo com Hoi Long, uma limitação.
Macau registou até ao momento 82 casos de covid-19 e tem mantido duras restrições fronteiriças desde o início de 2020.
Os residentes que regressam ao território de zonas consideradas de risco elevado são obrigados a cumprir, no mínimo, 14 dias de quarentena num hotel e mais sete dias em casa. Quem vem do Brasil, classificado pelas autoridades locais como um país de “risco extremamente alto”, tem ainda de apresentar três testes à covid-19, realizados nos cinco dias que antecedem a viagem.
Ao contrário de Macau, onde a esmagadora maioria dos desportistas são amadores, os atletas de outros países “não precisam de ter um trabalho”, nota à Lusa Hoi Long, também funcionária do Instituto do Desporto (ID).
“Necessito de permissão do ID para ir ao Brasil, seja para me concederem licença de trabalho ou para participar na prova”, apontou a atleta, salientando que, desde 2020, riscou anualmente do calendário desportivo pessoal entre “quatro a seis” provas internacionais.
À Lusa, o presidente da Associação de Desporto de Surdos de Macau lamentou a ausência de Hoi Long nos Surdolímpicos, até porque teria provavelmente “boas probabilidades” de trazer medalhas para casa.
Questionado sobre as consequências que o afastamento das provas internacionais pode ter na carreira da atleta, Ao Chi San foi categórico: “Vai ter impacto nos seus objetivos e programa formativo”.
Já quanto ao encerramento das instalações desportivas em Macau, nos primeiros tempos da pandemia, Hoi Long avaliou que este prejudicou sobretudo os atletas mais jovens do território.
“Sem muita experiência em competição, perderam o foco e a motivação”, analisou a atleta, que está a fazer um doutoramento na Universidade de Desporto de Xangai.
Também as equipas de hóquei locais têm sido “bastante afetadas, sobretudo ao nível da competição” pela crise sanitária mundial, realçou o presidente da Associação de Patinagem de Macau (APM).
Durante estes anos, não tiveram “nenhum contacto internacional”, disse António Aguiar. E clarificou: “Se houver quarentena, o próprio governo não nos deixa participar”.
“O desenvolvimento do hóquei em patins e em linha assentam muito na competição e na possibilidade das nossas equipas poderem competir a nível internacional”, continuou o responsável, considerando que, hoje, as equipas da modalidade em Macau estão, “do ponto de vista competitivo, mais fracas do que estavam antes da pandemia”.
Se não houver um alívio das restrições de entrada e o contacto com o mundo permanecer estacionado, a progressão do desporto “vai atrasar-se ainda mais em relação a outros países”, prevê o líder da APM.
Campeã asiática por dez vezes, a seleção de hóquei em patins de Macau viu serem adiados os torneios asiáticos e mundiais da modalidade em 2020 e 2021, respetivamente. Aguiar espera que a equipa viaje no final de outubro até Buenos Aires, na Argentina, para jogar no mundial, onde o responsável vai estar enquanto membro da direção da Federação Internacional de Desportos sobre Patins (World Skate).
A Lusa contactou o ID para saber se estão a ser estudadas medidas para facilitar a deslocação dos atletas da região, como quarentenas mais curtas ou a flexibilização das licenças no local de trabalho, ao que o departamento do Governo respondeu que se mantém “atento à situação”.
Numa resposta por escrito, o ID refere que “tem prestado colaboração no regresso” de atletas a Macau, dando como exemplo o caso de Hoi Long, que participou nos Jogos Nacionais para portadores de deficiência, no ano passado, altura em que “lhe foi concedida dispensa de comparência ao serviço durante o período de observação médica”.
Hoi Long sublinhou, porém, que a aposta de Macau continua a estar focada no desporto regular.
Portadora de deficiência auditiva, a atleta compete em torneios de desporto adaptado, mas também regular, em provas de triatlo, atletismo e ciclismo.
“O meu objetivo não devem ser os Surdolímpicos, não foi por isso que eles [o Governo] me colocaram no programa de atletas de elite, [...] foi para me preparar para os Jogos Asiáticos e, se os Jogos Surdolímpicos ou Paralímpicos da China afetarem qualquer plano para o triatlo [nos Asiáticos], tenho de pôr o triatlo em primeiro lugar”, disse.
A atleta lamentou o desconhecimento que persiste sobre a educação e formação desportiva de uma criança com deficiências e sublinhou a importância que pode representar uma medalha no desporto adaptado.
“É assim que é a sociedade, que pensa que o desporto para deficientes não é tão competitivo quanto o desporto regular”, disse.
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