Os ex-futebolistas Jorge Baptista e Pinheiro e o treinador Ulisses Morais foram os únicos a ‘vingar’ na I Liga após a campanha dos Dragões Sandinenses, então na III Divisão, até aos ‘quartos’ da Taça de Portugal, em 1999/00.
“Vou ser um bocadinho desagradável, mas a verdade é que houve alguns que fizeram carreira e outros não, se calhar porque nem todos tinham a mesma determinação em sair da sua região. Agora, era uma equipa com atributos e qualidades tremendas, que todo e qualquer treinador procurava. Faziam de cada jogo uma oportunidade e respeitavam com intransigência a posição do técnico”, contou à agência Lusa Ulisses Morais, de 62 anos.
Na terceira época pelos gaienses, após despontar na Naval 1.º de Maio, o escalabitano logrou colocar pela penúltima vez um clube do quarto escalão entre os oito finalistas da prova ‘rainha’, façanha igualada 22 anos depois pelo Leça, do Campeonato de Portugal.
“Uma campanha destas naturalmente chama a atenção e motivou o interesse de alguns empresários, mas as coisas são completamente diferentes hoje em dia e a visibilidade é outra. Na altura, lembro-me que apenas o jogo com o Sporting foi televisionado. Agora, creio que também existe uma abertura diferente para a aposta em jovens dos escalões inferiores, que anteriormente se via mais de lado”, enquadrou o ex-médio Paulo Gomes.
O clube de Sandim brilhou ao afastar Juventude de Ronfe (2-0), Cabeceirense (4-2) e Elvas (2-0), todos do quarto escalão, sempre após prolongamento, Paços de Ferreira (1-0), da II Liga, Vilanovense (2-0), da II Divisão B, e Estrela da Amadora (2-1), da I Liga, ‘caindo’ frente ao Sporting (0-3), prestes a sagrar-se campeão nacional 18 anos depois.
“A Taça de Portugal tem essa particularidade. É como se fosse um sonho e aproxima o pequeno do grande. A partir daí, quando uma equipa de escalão superior joga com uma de nível inferior, normalmente só tem a perder. Se ganhar, é normal. Se perder, é um escândalo. Já a equipa da divisão inferior não tem mesmo nada a perder. Se perder, é normal. Se ganhar, é um feito inesquecível e é isso que move essas equipas”, admitiu.
Apesar da subida falhada à II Divisão B, face à quinta posição na Série B da III Divisão, com 54 pontos, os Dragões Sandinenses, que nunca participaram nas ligas profissionais, deram “um primeiro passo” para “as pessoas estarem atentas” a certas individualidades.
“Têm de ser jogadores de fibra, pois nessas alturas é necessário demonstrar que reúnem qualidade, caráter, força e capacidade emocional. Vários jogadores da nossa equipa provaram que tinham qualidade e vieram a confirmar isso mais tarde”, observou Paulo Gomes, que rumou em 2000/01 à Naval 1.º de Maio, consumando a estreia na II Liga.
Os defesas Barreto e Elísio e o médio Xano já tinham atuado nesse escalão, que acolheu ao longo das temporadas seguintes o guarda-redes Jorge Baptista, os médios Pinheiro e Sérgio Rebordão e os avançados Paulo Campos e Lourenço, bem como Ulisses Morais.
“Tinha à disposição gente com futuro, mas que não tinha visibilidade. Era o meu caso e o da maior parte dos jogadores, que eram de uma região que sempre deu e vai continuar a dar muitos jogadores de futebol”, vincou o técnico, campeão da II Liga em 2003/04 pelo Estoril Praia, que tinha conduzido no ano anterior ao triunfo na Zona Sul da II Divisão B.
Essas duas promoções seguidas levaram Ulisses Morais, que não treina desde 2018, a estrear-se em 2004/05 na I Liga, na qual somou 193 partidas em nove épocas, repartidas por Gil Vicente, Marítimo, Naval 1.º de Maio, Paços de Ferreira, Académica e Beira-Mar.
“Além de bom técnico, transmitia valores que hoje em dia se estão a perder, mas que se refletiam dentro de campo, onde todos éramos fundamentais. Provou a qualidade do seu trabalho, nomeadamente no jogo na Amadora, no qual estávamos privados de cinco ou seis jogadores, incluindo eu, por castigo, e vencemos na mesma”, ilustrou Paulo Gomes.
Ao invés do ex-médio, de 46 anos, que atualmente comanda os sauditas do Al Khaleej, outros nove atletas dos Dragões Sandinenses acompanharam Ulisses Morais rumo ao Machico, então na II Divisão B, em 2000/01, com Jorge Baptista a sobressair nesse lote.
“Já tinha experienciado essas emoções na Taça de Portugal [em 1996/97] e quisemos repeti-las, com vontade, motivação e esperança de que, se no passado conseguimos, se calhar iríamos também conseguir naquele ano. Isso ajudou a que, passadas três épocas, tenhamos feito uma campanha muito idêntica”, rememorou o ex-guarda-redes, de 44 anos, presente no primeiro acesso dos gaienses aos quartos de final da prova ‘rainha’.
Atual treinador de guarda-redes dos sauditas do Al Taawon, Jorge Baptista ainda voltou em 2003/04 ao clube de Sandim, então a competir no terceiro escalão, imediatamente antes de se estrear na I Liga e reencontrar no Estoril Praia, já com Litos no lugar de Ulisses Morais, o ex-médio Pinheiro, debutante ao serviço do Gil Vicente, em 2000/01.
Já os Dragões Sandinenses competiram em campeonatos nacionais até se fixarem em 2008/09 no futebol distrital portuense, cuja Divisão de Honra disputam esta época, sob a presidência de Manuel Gomes, que tinha sido adjunto de Ulisses Morais em 1999/00.
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