Roberto Martinez foi o convidado do programa 'Futebol Total', do canal 11, esta segunda-feira. O selecionador nacional de futebol respondeu a muitas questões do painel, tanto de jogadores que estão na Seleção A como outros que poderão ser chamados. As expetativas de Portugal no Euro 2024, os escalões de formação e o trabalho do jogador português também foram abordados.
Evolução tática da Seleção: "A evolução é constante. É importante ter em conta o momento de forma dos jogadores. Tivemos um momento em que Guerreiro e Nuno Mendes não estavam aptos. Podíamos chamar outros jogadores, mas sabemos que eles são importantes para o futuro. Ou podíamos acrescentar mais um atacante, colocando um jogador como o Rafael Leão, João Félix ou Jota. E aí temos um jogador mais. É importante ter Cancelo e Dalot, que podem jogar nos dois lados. Temos de ter flexibilidade tática, mas não podemos fazer sempre tudo de novo. Os jogadores, o adversário e momento do jogo definem a estratégia.
Apuramento para o Euro 2024: "Foi um apuramento onde todos os jogadores deram tudo. Nós conhecemos o talento, mas o talento só não ganha jogos consistentemente, mas sim a atitude, compromisso, clareza. A paixão pela Seleção é muito grande. No primeiro dia, lembro-me de estar no aeroporto e os adeptos a mostrarem o amor pela Seleção. Vi e senti o afeto nos estádios. Gostei muito do ambiente. O adepto da Seleção sente-se parte da equipa. Precisamos disso para continuar a crescer. É uma paixão muito positiva"
Ficou surpreendido com a inteligência dos jogadores portugueses? "Não sei quantos dias precisamos de treino para executar um plano tático, mas foi uma surpresa saber que posso preparar um jogo sem treino. Os nossos jogadores são inteligentes taticamente para ganhar a ideia com vídeos e trabalhar fora do campo. Isso foi uma surpresa, porque não é normal. Num clube precisas de 50 treinos para ter uma boa sintonia numa linha defensiva, na pressão, no ataque... Visualmente o jogador tem muita inteligente, estão sempre a ver jogos. O nível da Champions ajuda a isso. Os jogadores treinam menos agora."
Expetativas no Euro2024: "Acho que há sete seleções na Europa. O Futebol europeu é muito forte. O que a Champions tem feito acelerou o futebol europeu. Espanha, Inglaterra, França, Bélgica, Itália e agora Alemanha, porque está a jogar em casa e tem jogadores de um nível para ganhar torneios, são as seleções que podem ganhar um torneio. Podemos [ganhar o Euro2024]. Para ganhar um torneio precisas de sonhar alto. Depois há um grupo de seleções que podem ganhar. Portugal tem jogadores nos melhores balneários do futebol mundial. Um jogo num Europeu é feito de detalhes e sorte. Se trabalhares muito e bem ajuda à sorte"
Cristiano Ronaldo: "Defrontei o Cristiano em 2013, pelo Everton, e foi incrível. Mas depois tive oportunidade de falar com todos antes da primeira convocatória. E foi muito importante ver uma pessoa com muita fome e respeito pela Seleção, com compromisso para ajudar. Foi uma surpresa positiva, porque foi o começo de criar um grupo novo. Para a maioria dos jogadores, o corpo falha e a cabeça aceita. No Cristiano, parece acontecer o contrário. O corpo só vai parar quando a cabeça disser que tem de parar. Ele faz tudo para estar a um nível ótimo. É incrível quando um jogador tem 38 anos, tem uns hábitos e vontade de quem tem 18. É uma capacidade incrível de repetir excelência. Tem um cérebro de elite, mas não tem limite. Foi um jogador com 53 golos. É agora olhar para o próximo objetivo. Foi importante ter o compromisso, essa fome."
Está a criar um legado? "20 anos na Seleção, são dados e estatísticas, não há nada assim. Cria um legado, sem dúvida. E acho que precisamos de utilizar isso. Mas o que um jogador jovem, quando entra no balneário e o que ganha ao estar com Pepe, Cristiano, Bernardo Silva, isso é criar um legado. Mais importante do que ganhar jogos."
Trabalho com outros selecionadores de Portugal: "A informação dos treinadores de formação é importante para preparar o Mundial de 2026 e 2030. Preciso de trabalhar cada dia e tentar desenvolver as carreiras de muitos. É engraçado falar de jogadores que estão a jogar bem na Seleção. Depois temos outros jogadores, gosto de ver miúdos, o Geovany Quenda, o um para um... Nós gostamos de treinar tudo nas duas áreas. Na formação não damos liberdade e o treino dentro de área. Tudo é jogo fácil e técnico. Precisamos de trabalhar mais o jogo de qualidade individual na área e dar liberdade em zonas específicas. Gosto quando o Ricardo Carvalho pode trabalhar individualmente com os nossos jogadores. O jogo das áreas é essencial. A melhor forma de romper uma estrutura defensiva é o um para um. O adepto gosta, nós gostamos e precisamos disso. Mas não é fácil, pois é preciso talento individual. Isso está fora do treino das academias".
Tem observado jogadores em Portugal que não jogam nos 'grandes'? "Todos os jogos há detalhes que mostram o talento. Depois é preciso consistência. Gostei muito de ver o Gustavo Sá, que tem papel importante, gosto de ver isso. João Marques do Estoril. Rodrigo Gomes também... são jogadores que têm talento para jogar na Seleção. Mas o caminho é difícil, tem que dar tudo para lá chegar. Não é fácil. Gosto de todos os jogos de Portugal. Equipas B e Sub-19. A Liga Jovem tem muitos jogos bons. É ver os jogadores com exigência máxima numa idade jovem".
Mas é difícil ser chamado pela qualidade dos que já estão? "Sim, mas é o melhor obstáculo. É importante ter a porta aberta e ter a oportunidade para entrar. Temos um grupo de 31 jogadores, não podem estar todos. É difícil. Utilizámos 31 na fase de apuramento. Ninguém tem uma razão para não continuar. Mas para o treinador é mais fácil essa situação. Mas a nível pessoal é mais difícil. Mas acho que vamos crescer".
João Neves: "João Neves chega à seleção seleção aos 19 anos. Mostrou uma personalidade e maturidade que me surpreendeu muito. A melhor forma de medir um jogador é olhar para o balneário. Diretamente dá ou não dá respeito. É como na escola, a minha filha tem quatro anos e não tem filtro. Nos balneários temos filtros, mas é a forma de demonstrar o respeito. Há coisas claras que um jogador ganha o respeito diretamente ou não ganha. E o João, aos 19 anos, nunca vi uma situação na minha carreira, que em dois dias ganhou o respeito do balneário. É marcante."
João Neves podia ser chamado mais cedo? "É importante não queimar etapas na formação dele, achava que era melhor ser importante nos sub-21 do que jogar uns minutos nos A, e Rui Jorge foi importante no seu crescimento e a analisar onde devia jogar. Podia ter ido antes aos A, mas foi boa decisão de esperar e poder dar oportunidade de ele ter papel importante no Europeu, marcar o golo, ajudou muito para voltar ao clube e ganhar a Supertaça. E no Benfica-FC Porto mostrou que teve desempenho de homem do jogo, é o momento para acelerar e é quando chega ao balneário da seleção. Mas tem a mesma dificuldade de entrar na lista de 23 quando temos lista de 31 ou 32 que mostraram que podem ajudar a seleção."
Diferenças entre seleções da Bélgica e Portugal? "Na Bélgica fomos terceiros no Mundial e os detalhes foram mínimos. Ganhar ao Brasil não foi suficiente. Portugal ganhou o Euro. Quando uma seleção vai a um torneio com dúvidas, 'por que vamos ganhar, se ninguém antes ganhou?' Aqui está presente que ganhamos. Há uma cultura de muitos exemplos, de muitos anos. Na Bélgica trabalhei a melhor geração da história. Não é fácil trabalhar para uma novidade. Mas o nível dos dois balneários é muito semelhante".
Gonçalo Inácio: "O perfil do jogador é importante. Gonçalo Inácio é o perfil mais pesquisado do futebol europeu. Central, pé esquerdo, pode jogar por dentro, com qualidade, marca golos, tem inteligência. Quando era treinador num clube era esse o perfil que não havia. Precisa de uma boa época no Sporting, porque tem um perfil importante."
Há mais jovens para dar o salto? "Há, mas como o Cândido Costa diz, é mais difícil ter a oportunidade do que ter jogadores com qualidade. Agora temos muitos jogadores para a Seleção A e é preciso um percurso... Os Sub-21 precisam de ter sucesso com essa equipa. Antes de chegar à A, tem de chegar preparado. Precisa de se preparar mais, porque o nível é estar no mesmo terreno do Bernardo Silva, do Bruno Fernandes, capitães de Manchester City e Manchester United. Tem de chegar com nível. A minha responsabilidade é trabalhar com todos os treinadores".
Diogo Costa: "Foi um dos jogadores que me surpreendeu muito. Vi muitos jogos, mas guarda-redes é uma posição que não acompanho muito. É um jogador de um nível espectacular. Treinei o Courtois, tem reconhecimento e foi o melhor do Mundial. O Diogo Costa tem nível para chegar lá. É muito completo. Contra a Bósnia em casa teve dois momentos de guarda-redes de alto nível. Precisa de ter a concentração para um momento em 90 minutos e isso é algo inato. [Ontem no FC Porto [Contra o SC Braga faz uma grande defesa a remate do Ricardo Horta.. Tem uma qualidade que permite à equipa jogar curto ou longo. É um guarda-redes moderno, que tem o melhor nível que o futebol mundial está a conhecer".
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