Depois de o Benfica ter sido eliminado das competições europeias, o SAPO Desporto falou com Rui Lança, investigador e autor de vários livros na área desportiva, para tentar perceber o que é que correu mal no percurso europeu dos "encarnados" e que consequências isto poderá ter para o plantel.
Na opinião do especialista em gestão desportiva, Jorge Jesus geriu mal a participação na "Champions", tendo feito isso com menor "preparação" e "exigência", mesmo tendo em conta que o plantel não é tão rico como na época passada.
"O plantel oferece menos soluções do que no ano passado, especialmente em duas posições chave no Benfica: as alas, que no ano passado se distinguiram pela positiva. Mas analisando estes cinco jogos [da fase de grupos da Liga dos Campeões] e percebendo o discurso antes, durante e após os jogos, ele claramente dá menos importância a estes jogos. Também não mediu bem o facto de ter começado a Liga dos Campeões com menos preparação e menor exigência".
O antigo colaborador do Concelho Europeu e de algumas ONG’s assegura que, apesar de os jogadores sentirem mais pressão com a saída das competições europeias, Jorge Jesus poderá ter vida complicada caso não vença o campeonato.
"A eliminação é uma 'pedra pesada' que, se não for atenuada com a vitória do campeonato poderá ditar a saída de Jorge Jesus do Benfica. No entanto, temos de perceber que o Benfica nunca seria candidato a ganhar a Liga dos Campeões. A eliminação desta competição pesa mais para o lado dos jogadores do que para o treinador. Contudo, se continuarem a ser demasiadas pedras…"
Rui Lança insiste e defende que o insucesso encarnado nas competições europeias se deve à má gestão do plantel.
"Jorge Jesus não começou a sua participação a pensar no apuramento para a Liga Europa, mas sempre pensou que não iria ficar fora das competições europeias. Aí o treinador esteve mal, porque teve uma análise igual à do adepto comum quando lhe competia ter uma análise muito mais aprofundada e rigorosa. O trabalho deles é diminuir a probabilidade de haver azar e ai há claramente uma má preparação e uma má gestão. Não há necessidade de gestão do plantel nesta fase da época e, do ponto de vista emocional, este é o tipo de partida para a qual não é preciso motivar um atleta".
"Há dois mundos: há o Jorge Jesus e há o plantel"
O autor dos livros "Reservado" e "Como formar equipas de elevado desempenho" acredita que poderão surgir problemas de insatisfação no seio do plantel, uma vez que os jogadores já não se encontram numa "montra" europeia.
"Há dois mundos: há o Jorge Jesus e há o plantel. Para o plantel estes jogos [europeus] são montras, especialmente para dois jogadores do Benfica que estão na seleção argentina. O que é que o Gaitán e o Enzo Pérez poderão esperar da seleção argentina quando não vão à Liga dos Campeões ou à Liga Europa?", questionou.
O Mestre em Auditoria Desportiva assegura que o timoneiro das "águias" poderá ser obrigado a vender atletas devido à necessidade do clube de fazer dinheiro, embora aconselhe o Benfica a não se desfazer de todos os seus melhores jogadores.
"Há aqui dois problemas: eles saírem, sob o ponto de vista da necessidade de fazer uma receita ou porque pode não valer a pena ter tantos médios no plantel, uma vez que regressarão [de lesão] jogadores como Fejsa e Rúben Amorim. Depois há o facto de os futebolistas quererem sair e o Benfica não pode vender peças como Enzo, Gaitán ou Salvio de uma só vez, pois são os melhores futebolistas do ponto de vista qualitativo.
Jorge Jesus entrará agora numa fase em que a gestão do plantel será mais complicada devido às ambições pessoais dos futebolistas e Rui Lança assegura que os resultados da equipa poderão sofrer com essa situação.
"Além disso, há o facto de os jogadores ficarem no plantel contrariados. Por exemplo, Enzo Pérez não tem rendido tanto como na época passada. Jorge Jesus pode considerar uma vantagem dedicar-se apenas às competições internas, mas também está dependente daquilo que os jogadores estarão dispostos a fazer", analisou.
Para o investigador, a equipa necessita de vencer os próximos encontros para voltar a entrar no rumo certo.
"A melhor forma de dar a volta ao facto de terem sido eliminados das competições europeias passará por ganhar os próximos jogos e conseguir que os atletas se sintam motivados. Mas é preciso salientar que, se o Benfica continuasse na Liga dos Campeões, provavelmente não seria candidato [à vitória]. Por exemplo, o Sporting continua e não deverá fazer mais do que cinco jogos [chegar aos quartos de final]. Neste sentido, os jogadores do Benfica não terão a motivação de estarem nas competições europeias até fevereiro ou março e isso terá de ser gerido".
"Jogos com Académica e Braga são importantes"
Rui Lança avisa que os próximos encontros serão decisivos para o Benfica retomar as boas exibições e ultrapassar a eliminação das competições europeias definitivamente.
"Há duas datas muito importantes que são o próximo jogo contra a Académica e a partida diante do Braga, porque pode significar a eliminação de uma competição importante como é a Taça de Portugal. Um resultado negativo contra a Académica ou a eliminação frente ao Braga torna a gestão mais difícil do ponto de vista da equipa e também do próprio clube".
O especialista em rendimento desportivo defende que o facto de o FC Porto vencer frequentamente o Benfica poderá criar uma carga pouco positiva sobre os atletas "encarnados".
"Começa-se a criar uma ideia na opinião pública de que o Jorge Jesus perde muito mais pontos em jogos “a valer” como com os 'grandes'. Em alguns jogos, como com o FC Porto, o Benfica tem um historial negativo e isso poderá criar um impacto também negativo no plantel. Eu não sei se a visão de Jorge Jesus é igual àquela que os jogadores têm [quando preparam os jogos]", acrescentou depois.
A finalizar, Rui Lança não considera o clássico com o FC Porto a partida mais importante e relembra que é mais relevante vencer todas as partidas até à visita ao Estádio do Dragão, marcada para 14 de dezembro.
"Penso que se o Benfica não ganhar no Estádio do Dragão não é o fim do mundo, porque as expetativas já conduzem ao pensamento de que o Benfica não vai vencer ao Porto, mas não ganhar todos os jogos até ir jogar com o FC Porto pode tornar as coisas complicadas", concluiu.
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