Esta sexta-feira, o jornal 'Record' revelou a carta de rescisão que Rafael Leão enviou ao Sporting no passado dia 14 de junho, um mês depois dos ataques à Academia de Alcochete.
"O signatário, oriundo de uma família humilde e pobre, integrou desde criança o centro de formação do Sporting Clube de Portugal, usualmente conhecido por ‘Academia de Alcochete’, onde residiu praticamente até aos dias de hoje e ali fez toda a sua formação pessoal e profissional. Reconhecimento e gratidão que apenas considera abalados pelo desequilíbrio comportamental de alguns dirigentes da Sporting SAD, a que a grande instituição Sporting Clube de Portugal é alheia", começou por reconhecer Rafael Leão.
"Tomando por referência os mais virtuosos valores da centenária instituição, bem como de todos aqueles que para si sempre foram ídolos, julgou nela poder continuar a crescer pessoal e profissionalmente com a necessária segurança e estabilidade. Valores que nos últimos meses viu ruir, com a certeza que com o estado atual das coisas o seu temor, medo e insegurança são irreversíveis. O que, muito a contragosto e com uma infinita mágoa, obriga o signatário a decidir-se pela desvinculação contratual com esta SAD. Os adeptos, simpatizantes e sócios da instituição não podem nem ser inflamados, nem ‘arremessados’ pelos dirigentes contra aqueles que diariamente trabalham em prol do engrandecimento da mesma, unicamente para gáudio e ego (desses dirigentes). Assim, num ápice, os atuais dirigentes da SAD do Sporting Clube de Portugal conseguiram destruir um sonho que o signatário veio alimentando e construindo até aos 19 anos de idade", continuou.
Bruno de Carvalho
Nessa mesma carta, o jogador de 19 anos relata ainda alguns episódios que envolvem o antigo presidente do Sporting, Bruno de Carvalho.
"É público que o signatário, e o plantel em geral, nunca beneficiaram do apoio do Sr. Presidente", começou por afirmar, acrescentando que "foi comum que o subscritor fosse interpelado na rua acerca da prestação da equipa, abordado por adeptos insatisfeitos e que repetiam as palavras que o Sr. Presidente, publicamente, proferia. Passou o subscritor a ter dificuldade em levar uma vida normal, por ser alvo de animosidade na rua, em restaurantes, e até nos meios de comunicação social".
Rafael Leão revela ainda que chegou a ser ameaçado por Bruno de Carvalho, depois do jogador ter partilhado o comunicado que os elementos do plantel de Jorge Jesus partilharam nas redes sociais após os comentários do presidente na sua conta de Facebook, em que criticava a prestação da equipa frente ao Atlético de Madrid.
"A situação ficou deveras pior, quando o pai do subscritor recebeu um telefonema do Sr. Presidente, afirmando e ameaçando: "o puto que tire o comentário, senão vai haver problemas". O subscritor temeu intensamente pela carreira profissional e nessa noite não dormiu sequer um minuto".
O ataque a Alcochete
Por fim, o jogador de 19 anos aborda os ataques de 15 de maio à Academia de Alcochete, dizendo que "nos 3 dias seguintes em que o signatário permaneceu na Academia do Sporting em Alcochete não conseguiu sequer dormir ou reagir. As cenas do dia 15 atormentavam-no a cada instante. Decidiu sair e refugiar-se em casa do pai António Leão. Por ter identificado um dos agressores, o terror adensa-se em cada dia que passa e a verdade é que, nos dias de hoje, acorda em sobressalto e teme sair à rua".
"Por muito que tente convencer-se da possibilidade, a verdade é que não vai conseguir voltar mais ao local onde passou oito anos da sua vida, que apesar de ter sido a casa que o acolheu, foi onde passou pela experiência mais traumática que alguma vez possa ter memória. Nem nos dias em que a fome tanto o atormentou", revela ainda Rafael Leão, em comparação com as dificuldades pelas quais passou na infância.
"Alguns atos colocaram em causa a dignidade profissional e pessoal, a confiança, o bom nome e até infelizmente a segurança. O senhor presidente atribuiu a culpa dos resultados à falta de profissionalismo e dos colegas", afirmou ainda lembrando uma expressão usada por Bruno de Carvalho:"A crítica pública – sempre severa – de uma entidade patronal com o alcance nacional e internacional que tem a SAD do Sporting coloca uma pressão profissional e pessoal altamente adversa aos atletas. Adversa até ao livre exercício de uma vida pessoal e familiar normal. Especialmente nos atletas profissionais de futebol, atenta a sua maior exposição pública. Essa mesma entidade patronal, que ao não assegurar a segurança no local de trabalho permitiu que o signatário e os seus colegas de equipa um episódio de verdadeiro horror, declarou publicamente que foi ‘chato’. Entende o signatário, enquanto jogador do Sporting, que os factos que vivenciou tornam impossível manter a relação de trabalho".
"A forma como o ataque a Alcochete ocorreu não pode deixar de configurar negligência grosseira que confere justa causa de resolução do contrato de trabalho", conclui Rafael Leão.
O jogador de 19 anos foi um dos nove elementos do plantel de Jorge Jesus que rescindiram contrato unilateralmente com o Sporting. A eles juntaram-se ainda Rui Patrício, William Carvalho, Gelson Martins, Rúben Ribeiro, Daniel Podence, Bruno Fernandes, Bas Dost e Rodrigo Battaglia - sendo que os últimos três acabaram por regressar aos 'leões'.
Comentários