A acusação do processo 'e-toupeira' diz que Paulo Gonçalves, enquanto assessor da administração da Benfica SAD, e no interesse da SAD, solicitou a funcionários judiciais que lhe transmitissem informações sobre inquéritos, a troco de bilhetes, convites e merchandising.
“José Silva (oficial de justiça) e Júlio Loureiro (escrivão e observador de árbitros), com a promessa de tratamento privilegiado junto do Benfica, designadamente para assistência a jogos em condições favoráveis, aceitaram proceder como solicitado [por Paulo Gonçalves”, sustenta a acusação do Ministério Público (MP), a que a agência Lusa teve hoje acesso.
Segundo o despacho do procurador do MP Valter Alves, do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa, tais processos “incidiam sobre investigações na área do futebol ou a pessoas relacionadas com este desporto, designadamente inquéritos em curso e em segredo de justiça, em que era visada, ou denunciante, a Sport Lisboa e Benfica – Futebol SAD, ou os seus elementos”.
Os processos pesquisados pelos dois funcionários judiciais, através da plataforma informática Citius, abrangiam também casos “relativos a clubes adversários e seus administradores ou colaboradores”.
O procurador do MP sustenta que os dois funcionários judiciais “tudo fizeram para favorecerem o Benfica e seus elementos nas investigações em curso, permitindo, se necessário, a dissipação antecipada de elementos de prova”.
“Agiram com o propósito de evitar que o clube (Benfica) e Paulo Gonçalves fossem acusados, julgados e condenados numa pena, permitindo a destruição ou ocultação de prova”, refere a acusação.
No inquérito, o MP concluiu que, uma vez na posse de tais informações, pretendiam Paulo Gonçalves e a Benfica SAD, presidida por Luís Filipe Vieira, antecipar diligências processuais em que seria visada a Benfica SAD e seus membros, ou obter informações sobre adversários, ou ainda informações antecipadas de decisões judiciais “tudo em benefício da SL Benfica – Futebol SAD”.
“Também em benefício e no interesse da SL Benfica -Futebol SAD, Paulo Gonçalves e a Benfica SAD, foram oferecendo, pelo menos, nas épocas desportivas 2016/2017 e 2017/2018, e até 03 de março de 2018, convites e produtos de merchandising a Júlio Loureiro, de forma a criar condições de permeabilidade por parte deste observador de arbitragem, tendo em vista decisões favoráveis, conhecimento privilegiado de informações desportivas e de pessoas e contactos ligados à arbitragem”, descreve a acusação do DIAP de Lisboa.
Como recompensa, adianta o MP, os dois funcionários judiciais receberam da Benfica SAD, através de Paulo Gonçalves, ou algum intermediário deste, “convites e bilhetes para assistirem gratuitamente a jogos de futebol no Estádio da Luz, em Lisboa, designadamente no 'Anel VIP', incluindo acesso a lounge com comida e bebida e parqueamento automóvel”.
Estes dois arguidos terão ainda recebido indevidamente, segundo a acusação, produtos de merchandising, “como camisolas e casacos da equipa de futebol, e ainda promessa de contrato de trabalho no Museu Cosme Damião, pertencente ao Benfica, para um sobrinho de José Silva, assim como tratamento privilegiado no Estádio da Luz, designadamente acesso a espaços reservados para contacto com os jogadores da equipa principal de futebol”.
O MP concluiu que os arguidos José Silva e Júlio Loureiro fizeram uso das suas funções nos tribunais “para obter recompensas que lhes não eram devidas, sabendo assim que violavam os seus deveres legais e funcionais”.
Júlio Loureiro, acrescenta a acusação, pretendeu ainda utilizar as suas funções de observador de arbitragem, que exercia junto da Federação e da Liga Portuguesa de Futebol, “para obter proveitos para si, que sabia que não podia receber e a que não tinha direito”.
“Paulo Gonçalves e a Benfica SAD bem conheciam as funções públicas exercidas pelos funcionários e bem sabiam que estes, com as condutas descritas, que, os beneficiaram, violavam os seus deveres funcionais e legais”, sublinha a acusação do DIAP de Lisboa.
O DIAP de Lisboa entende ainda que bem sabiam, Paulo Gonçalves e a Benfica SAD, “que não podiam atuar daquela forma e que as ofertas que entregavam aos funcionários [judiciais] e observador de arbitragem (…) eram contrárias às regras do funcionamento transparente dos serviços e aos deveres funcionais inerentes aos cargos” que aqueles desempenhavam.
“Fizeram-no de forma a condicioná-los e, assim, a obterem informações reservadas a que não tinham direito, não se coibindo de atuar daquela forma, o que quiseram e conseguiram para benefício dos próprios”, salienta o despacho de acusação.
O Benfica reagiu em comunicado à acusação, prometendo “desmontar” as “absurdas e injustificadas imputações”.
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