Apostar ou não na formação de jovens portugueses? Esta é uma das questões que os clubes profissionais da I e da II Liga se debatem na hora de fazer contas à vida: Formar o produto é muito importante e a bandeira do futebol é o jogador. Na teoria pode ser assim, mas o contexto sócio-económico obriga os clubes a uma solução de "consumo rápido" como a contratação de jogadores estrangeiros que entrem de caras nas equipas.
O jogador jovem precisa de tempo para se ambientar, para crescer e é isso que lhe permite evoluir. Nos três grandes tem-se conseguido formar, potenciar e vender por muitos milhões. Mas no restante leque de clubes profissionais em Portugal, a realidade é bem diferente.
O espaço do jogador português nos principais campeonatos profissionais em Portugal, Liga Nos e Liga LEDMAN LIGAPRO, foi a debate, nesta quinta-feira, na sede do Sindicato de Jogadores Profissionais futebol.
No painel intervieram Joaquim Evangelista, presidente do Sindicato de Jogadores de Futebol, José Couceiro, treinador do Vitória de Setúbal, Joaquim Milheiro, coordenador técnico das seleções jovens nacionais, e Armando Evangelista, treinador do Penafiel.
O resultado do estudo SJPF é elucidativo. Há cada vez menos jogadores portugueses utilizados nas ligas profissionais.
No estudo levado a cabo pelo Sindicato de Jogadores, a taxa de utilização de jogadores nacionais na Liga NOS baixou de 46% para 43% e é a mais baixa desde 2011/2012.
Só na faixa étária a partir dos 29 anos é que se inverte essa tendência. Na principal Liga Nacional, o V. Setúbal é o clube que aposta mais nos jogadores portugueses, seguido do Tondela e do Paços de Ferreira.
Em 2017/2018, Na I Liga foram utilizados até ao momento 147 estrangeiros (57%) contra 109 portugueses (43%) num total de 251 jogadores
O FC Porto e o Moreirense são as duas equipas que utilizam um menor número de jogadores portugueses.
Para José Couceiro, antigo presidente do Sindicato do Jogadores Profissionais de Futebol, e atual técnico do Vitória de Setúbal, o facto do clube sadino ser o clube que utiliza um maior número de jogadores portugueses é apenas uma questão circunstancial. O antigo dirigente recorda que a aposta na formação sempre deu os seus frutos no futebol português e que Portugal tem que apostar naquilo que é forte, que é formar jovens jogadores, embora não distinga portugueses de estrangeiros.
José Couceiro: "Portugal foi campeão do mundo em 1991 e a Lei Bosman só surgiu em 1995. Sempre que há grandes gerações de jogadores, isso reflete-se mais à frente".
"Quando olho para um grupo de jogadores, não há divisão entre nacionalidades, assim como não há raças nem religiões. O problema é que durante a Lei Bosman houve falta de visão dos reguladores que fizeram as regulamentações. Somos fortes naquilo que faz o futebol que são os jogadores".
Mas a problemática reflete-se sobretudo no equilíbrio entre a excelência dos resultados desportivos e a formação de jovens talentos nos clubes. Couceiro considera que os jogadores jovens deviam ser lançados em outros espaços competitivos, onde pudessem jogar. O crescente desejo dos clubes em obter triunfos e lucros a todo o custo não permite que os jovens possam evoluir, como acontece nas equipas B, e para isso tem que lhes ser dado a possibilidade de jogar e poderem errar sem verem comprometida a sua carreira, como muitas vezes acontece. "É bonito colocar um jovem, mas depois ele erra, morre", atirou.
- As equipas bês dos clubes ressurgiram em 2012/2013 e os jogadores jovens passaram a ter um espaço competitivo para poderem evoluir.
A formação pode ser o recurso do clube que não tem capital para investir. Na segunda liga, a realidade é ainda mais dramática. De acordo com dados do SJPJ, a tendência para a diminuição da aposta no jogador português manifesta-se pela quinta época consecutiva. O Penafiel é uma excepção.
Armando Evangelista, técnico do clube nortenho, sublinhou o facto do Penafiel dar "preferência ao jogador português". Contudo, relembrou que os clubes o que querem "é potenciar para haver dividendos".
Armando Evangelista deixou mesmo uma pergunta no ar: "Será que temos formação em número suficiente para sustentar 38 equipas nacionais"?
Armando Evangelista: "Será que temos formação em número suficiente para sustentar 38 equipas nacionais?
Joaquim Milheiro, coordenador técnico da FPF para as seleções jovens, considera fundamental o aproveitamento dos jovens talentos. O responsável de formação diz mesmo que Portugal tem que aumentar o campo de recrutamento, dada a diferença para a Alemanha "145 mil jogadores para dois milhões", mas ainda assim sublinha que as seleções portuguesas são "altamente competentes contra seleções com maior base de recrutamento".
Joaquim Milheiro: "Portugal tem 145 mil jogadores federados. A Alemanha tem dois milhões. Mas não deixamos de ser altamente competentes"
Joaquim Evangelista, presidente do SJPF, considera que todos são reguladores, "treinador, dirigentes" e são esses agentes que têm que fazer "compreender as suas preocupações" à Federação Portuguesa de Futebol. O dirigente ressalvou a preocupação em fazer diante da Federação e do próprio governo "a defesa do jogador português".
José Couceiro discorda do facto dos clubes e treinadores serem reguladores, criticou o modelo do futebol em Portugal e diz-me mesmo contra os empréstimos. O técnico considera que sem os clubes pequenos fortes, a Liga em Portugal nunca será forte.
"Sou contra os empréstimos e contra a inibição de utilizar esses jogadores. Temos de pensar como um cartel, pois os nossos interesses são comuns. Nós nem sequer conseguimos influenciar os reguladores", sublinhou.
Couceiro deixou uma mensagem de esperança e relembra que o melhor no futebol são as pessoas. E é este mesmo o capital mais importante do futebol português.
"O que temos de melhor no nosso futebol são as pessoas. Cristiano Ronaldo, José Mourinho, Fernando Gomes".
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