A necessidade de harmonizar regulamentos, fomentar mecanismo de proteção e implementar um tratado para a integridade e transparência no desporto foram algumas das conclusões preliminares da 1.ª fase do Estudo Global sobre Propriedade de Clubes, hoje apresentada.

O mentor do estudo à escala global, que abrangeu 25 clubes a nível mundial, que na primeira fase, realizada de 2014 a 2018, incidiu nos aspetos legais, é o português Emanuel Medeiros, da Sport Integrity Global Alliance (SIGA), que considera “chegado o momento de agir”.

“O propósito do estudo é apresentar dados concretos, objetivos e independentes sobre a realidade à escala mundial, alicerçada numa análise profundo a 25 países, que permite identificar aqueles que são os aspetos em comum, mas também as lacunas e fragilizadas”, considerou Emanuel Medeiros, no Porto.

O estudo visa ainda detetar “o que se tem que fazer para reforçar a abordagem coletiva, a colaboração, seja direcionada a aperfeiçoar o enquadramento jurídico, seja para reforçar o escrutínio e a vigilância que operações desta grandeza, que envolvem milhões, justificam”.

“As nossas expectativas para esta primeira fase, atendendo aos dados preliminares que apresentámos, são perfeitamente justificadas, a indústria do desporto, envolvendo os governos e os reguladores, tem aqui um instrumento concreto, objetivo, independente, para trabalhar”, referiu.

No caso concreto do futebol, e apesar de a regra dominante ser a proibição de uma entidade singular ou coletiva deter o controlo sobre sociedades desportivas, o estudo revela que “em alguns países ainda se está na pré-história em matéria da regulação desportiva”.

“Há uma grande lacuna que deve ser colmatada pelos governos, pelos reguladores, pelas entidades que superintendem o futebol à escala mundial, continental e nacional”, disse Emanuel Medeiros.

O responsável da SIGA considera ainda que este estudo “rigoroso e exaustivo” abre um espaço para todos os interessados que procuram de uma forma construtiva e positiva contribuir com o seu conhecimento e experiência a instigar as reformas que há muito se fazem sentir.

“É chegada a hora da verdade. Vamos continuar a dialogar, mas agora arregaçando as mangas e pondo em prática aquilo que há muito carecemos”, defendeu Emanuel Medeiros, apelando à “mobilização de esforços, energias, vontades e recursos”.

Para Emanuel Medeiros, o Estudo Global sobre Propriedade de Clubes não é um exercício académico, mas sim o ponto de partida para o desenho de um conjunto de reformas e compromissos a alavancar à escala mundial, e que envolva governos, organizações desportivas, patrocinadores e público em geral.

Uma das medidas defendidas é a criação de um sistema independente de rating, que permita avaliar de forma independente qual é o estado das modalidades desportivas e das organizações em relação a necessidades elementares como a boa governança, integridade financeira, transparência e escrutínio dos fluxos financeiros, origem dos capitais e proteção de menores.

“Há uma tomada de consciência generalizada. Há quase como uma exigência de ação, mais do que discursos de circunstância. Nós não visamos apontar o dedo acusador a ninguém, mas colaborar de forma construtiva”, sustentou Emanuel Medeiros.

As conclusões da 1.ª fase do Estudo Global sobre Propriedade de Clubes apontam ainda para a necessidade de reforçar as medidas que os protejam de investidores pouco idóneos, que pretendem apenas umas plataformas para evasão fiscal, lavagem de dinheiros ou viciação de resultados para apostas.

“(Em relação a Portugal) felizmente temos à frente das instituições pessoas de grande craveira intelectual, com provas dadas no desporto nacional e internacional, com responsabilidade. Penso que o momento chegou para se unir esforços e arrancar para o desenho inclusivo e construtivo, para que a integridade do desporto seja colocada no topo da agenda e seja concretizada pelas reformas que há muito se fazem sentir”, disse Emanuel Medeiros.

Em relação à atual situação que se vive um pouco pelos vários campeonatos, “mais do que um remédio”, Emanuel Medeiros defende “a aplicação de um verdadeiro antídoto”, sobre a forma de “um conjunto de políticas e práticas há muito necessárias”.

“É necessário haver um reforço significativo dos parâmetros financeiros, segundo os quais os clubes e SAD participam nas competições profissionais, e um escrutínio maior em relação à idoneidade dos investidores nas sociedades desportivas”, sustentou.

Fernando Veiga Gomes, presidente da comissão da legislação de desporto da Union Internacionale des Avocats (UIA), corresponsável na elaboração dos dados recolhidos pelo inquérito promovido por Manuel Medeiros, defendeu a necessidade de “proteger os clubes da infiltração de capitais ou de gente com menos escrúpulos na estrutura dessas SAD”.

A solução, de acordo com Fernando Veiga Gomes, passa pela implementação de três medidas simples.

Um sistema que permita revelar quem são os acionistas até ao último beneficiário efetivo, para se poder monitorizar situações de conflito de interesse, um sistema de controlo prévio sobre quem são esses investidores e a apresentação de um registo criminal.

A apresentação das conclusões preliminares da 1.ª fase do Estudo Global sobre Propriedade de Clubes decorreu integrada numa sessão sobre Direito Desportivo, do programa do 62.º Congresso da Union Internationale des Avocats (UIA), no Centro de Congresso da Alfândega, no Porto.

O estudo foi elaborado pela Union Internacionale des Avocats (UIA), a Sport Integrity Global Alliance (SIGA) e o Centro Internacional para a Segurança no Desporto (ICSS INSIGHT).