Depois de duas derrotas diante dos históricos rivais, uma delas pesadíssima, o Benfica vive - indiscutivelmente - o pior momento da época.

Perante um cenário de absoluta frustração, patente logo após o final do jogo nas declarações de Rui Costa e Schmidt, quisemos perceber qual a melhor forma de recuperar psicologicamente os jogadores, inundados num mar de críticas ainda no decorrer da partida.

O Sapo Desporto esteve à conversa com João Prates, treinador de futebol licenciado em Psicologia no Desporto, que projetou o futuro a curto prazo da equipa encarnada, não sem antes questionar o facto de ter sido João Neves, o segundo mais novo do plantel, a dar a cara após a hecatombe do Dragão.

Do ponto de vista coletivo, o treinador - 'especialista' em manutenções - não tem dúvidas: "Se não existir uma reação forte com boas exibições e bons resultados, o resto da época poderá ser penoso para o Benfica."

João Prates, treinador de futebol licenciado em Psicologia no Desporto
João Prates, treinador de futebol licenciado em Psicologia no Desporto

Antes de mais: Schmidt

Uma viagem rápida às redes socias logo após o final do clássico deixa evidente a insatisfação dos adeptos encarnados. Mas, apesar da equipa não estar isenta de responsabilidades para a maioria dos benfiquistas, Roger Schmidt acaba por ser o principal alvo da maré de críticas. O desagrado pelas opções do treinador alemão não são de agora, longe disso, mas a pesada derrota com o FC Porto seguida do desaire em Alvalade, deixam Schmidt numa posição de maior fragilidade. A famigerada 'teimosia' continua a ser a principal mancha no percurso do técnico desde a chegada a Luz.

Para João Prates, treinador formado em Psicologia no Desporto, o trabalho de recuperação mental dos jogadores já terá começado, mas alerta para a importância de uma conversa de grupo, durante a qual todos devem ter a palavra, incluindo os jogadores.

"Sob pena da derrota com o FC Porto deixar mossa, faz sentido uma conversa aberta, em grupo e com alguns jogadores, individualmente, mas sobretudo sem rodeios, um diálogo franco. O foco deverá estar no próximo jogo, do género 'o primeiro remate do jogo tem de ser nosso, o primeiro canto', esse tipo de desafios. Fortalecer laços, um jantar em equipa pode fazer milagres", lembra o treinador que orientou, no seu último projeto, o Dziugas, da Lituânia, onde ajudou a assegurar duas manutenções consecutivas - a oitava do currículo.

FC Porto-Benfica
FC Porto-Benfica créditos: MIGUEL RIOPA / AFP

Estará a equipa com o treinador?

Contudo, alerta, é essencial que o grupo ainda esteja ao lado do treinador, o que nesta altura, segundo João Prates, é apresentado como um desafio adicional, a avaliar pelos sucessivos episódios de desconfiança relativamente às opções do treinador desde o início da temporada.

"O Benfica tem sido muito irregular e é expectável que Schmidt esteja a sofrer neste momento mais delicado. O treinador é um dos causadores da instabilidade", começa por dizer João Prates, antes de questionar as escolhas do técnico alemão ao longo da temporada e a gestão que tem sido feita do plantel.

"No futebol é essencial, sempre que possível, permitir que os jogadores atuem nas suas posições de base. (...) A opção pelo ataque móvel deixa três avançados, recentes contratações, no banco. [Marcos Leonardo, Casper e Arthur Cabral]. Para além da opção tática ser questionável, como se sentirão estes jogadores? O próprio Kokçu, o Aursnes, a jogar diversas vezes em zonas menos conhecidas, onde se sentem menos confortáveis. É importante pensar como se sentem estes atletas dentro e fora do campo", alerta.

Começando por reconhecer a enorme pressão a que Schmidt está sujeito, consequência do lugar que ocupa, o técnico recorda que as dúvidas relativamente às opções do técnico germânico "começaram logo no início da época" , aquando da "gestão dos casos Vlachodimos, mas também com Ristic". Situações que, acredita, podem ter influência, mesmo que indireta, no atual momento das águias.

FC Porto-Benfica, 24.ª jornada da I Liga
O desalento dos jogadores encarnados. EPA/JOSE COELHO créditos: epa11197423

João Neves, sempre ele

Tem sido uma das maiores figuras desta época, e voltou a sê-lo no final do embate no Dragão. O jovem médio, de apenas 19 anos, foi o escolhido para dar a cara após o absoluto descalabro. João Prates começa por afirmar não saber quem foi responsável pela escolha de João Neves para falar na zona de entrevistas rápidas - até pode ter sido o próprio - mas na opinião do treinador de 50 anos,  a decisão é representativa da situação em que o Benfica se encontra.

"Depois de uma derrota a roçar a humilhação, era expectável que aparecesse um jogador mais experiente - João Mário, por exemplo, já que Otamendi tinha sido expulso -, e nunca João Neves. Não está em causa a sua resiliência, mostrou uma enorme personalidade após o jogo e deu um enorme exemplo de liderança na forma como respondeu às perguntas, mas não nos podemos esquecer de que falamos de um jogador que tinha perdido a mãe há uma semana e meia. Penso que devia ter sido protegido e ter sido dada voz a um jogador mais velho", critica o treinador que tem no seu currículo passagens pela Arábia e pela Noruega.

Assim, para o técnico, o jogo de quinta-feira assume-se como absolutamente crucial.

"É uma competição diferente, mas é o primeiro após a humilhação do Dragão. Terá de provar uma reação forte da equipa para fazer esquecer as últimas duas derrotas, mas não só, porque importa lembrar que os jogos com o Toulouse também se traduziram em exibições cinzentas".

O perigo, diz Prates, aumenta pelo facto das dinâmicas do grupo não parecerem tão fortes, afirmando que "se não existir uma reação forte com boas exibições e bons resultados, o resto da época poderá ser penoso para o Benfica."