Carrega consigo não só a bandeirola, mas principalmente a responsabilidade. O enorme peso de representar da melhor forma a figura da mulher na arbitragem, no futebol, no desporto. É isso que diz sentir quando está em campo. Foi sobretudo isso que lhe passou pela cabeça quando se tornou a primeira árbitra assistente a arbitrar um jogo do patamar mais elevado do futebol em Portugal.

Em Vila do Conde, num Rio Ave-Chaves, o momento não passou despercebido a ninguém: jogadores, treinadores, dirigentes, público. A 13 de agosto de 2023, Andreia Sousa deu o passo que mais nenhuma mulher tinha conseguido dar. E o passo em frente foi, para a árbitra assistente de 37 anos, o maior da carreira até então, conforme nos descreveu. Mas o topo da montanha não era aquele. Em junho deste ano, tornou-se a primeira mulher a integrar o grupo de árbitros da I Liga masculina em Portugal. Mas a escalada ao topo promete não ficar por aqui.

É assim que pensa quando nos fala do Euro 2025. Falta menos de um ano. Assim permita o corpo da assistente natural de Braga, entretanto a recuperar de uma complexa lesão que a impediu de cumprir na prática o que já está conquistado no papel. Outubro está já ali, confidenciou-nos otimista.

Ao SAPO Desporto, a assistente detentora da insígnia FIFA desde 2016 contou-nos como um simples anúncio de jornal definiu parte da sua vida, falou-nos dos atrasos na arbitragem portuguesa por comparação a outros países da Europa e revelou-nos como se consegue ser árbitra assistente internacional com dois filhos e uma profissão paralela, que sempre manteve até hoje. Venha daí. Mas atenção, não fique em fora-de-jogo. Fá-lo-ia com a pessoa errada.

Andreia Sousa no jogo de estreia como assistente na I Liga, em Vila do Conde.
Andreia Sousa no jogo de estreia como assistente na I Liga, em Vila do Conde. Andreia Sousa no jogo de estreia como assistente na I Liga, em Vila do Conde. créditos: © 2023 LUSA - Agência de Notícias de Portugal, S.A.

Como um anúncio de jornal lhe mudou a vida

Laurinda Lopes, Maria de Abreu Carvalho, Maria Gabriel Quaresma, Berta Tavares, Sandra Bastos, Ana Brochado, Sara Alves, Lília Martins. Estes nomes dizem-lhe alguma coisa? Provavelmente para a grande maioria não. O que não deixa de ser bem representativo da forma como olhamos para a arbitragem feminina em Portugal.

Todas elas foram ou são árbitras que desbravam ou desbravaram o caminho de tantas mulheres na arbitragem portuguesa. Laurinda Alves, primeira árbitra de sempre em Portugal, é nome maior de uma história com passado recente, ou não tivesse Portugal apenas 50 anos de democracia.

Seguramente haverá outras causas para o notório crescimento da arbitragem feminina em Portugal. À notória evolução do futebol feminino será sempre atribuída uma quota parte de responsabilidade. Mas foi também por Laurinda Alves que surgiram, surgem e vão continuar a surgir, cada vez mais, casos de sucesso de mulheres na arbitragem. Andreia Sousa é um deles.

Tinha 20 anos e estava a acabar o curso de Informática de Gestão na Universidade do Minho, quando uma folha de jornal foi suficiente para virar de forma assertiva uma página entre as muitas da sua vida.

"Gostava de desporto, não praticava futebol, mas gostava de ver e de jogar. Eu e a minha prima éramos muito próximas, continuamos a ser, mas na altura muito próximas a nível desportivo. Encontrámos um anúncio no jornal para entrar na arbitragem e pensámos, porque não? À pergunta feita por si mesma, Andreia respondeu com a inscrição no curso de arbitragem na Associação de Futebol de Braga, cidade onde nasceu e vive até hoje.

Cumprido o curso, acabaria mesmo por entrar no mundo da arbitragem, à época como juíza principal e não como assistente, função a que se dedicaria bem mais tarde em exclusivo numa "decisão muito ponderada". Primeiro apitou os jogos femininos na primeira divisão, depois os masculinos apenas na distrital de Braga.

Treinar em regime pós laboral sempre foi algo natural para Andreia Sousa, habituada há vários anos a sessões trissemanais depois do trabalho que mantém em simultâneo. Uma decisão tomada a pensar, sobretudo, na estabilidade. Os avanços na arbitragem têm sido notórios, reconhece, mas não os suficientes para que sejam oferecidos contratos de trabalho. Nenhum árbitro em Portugal tem contrato de trabalho. O que significa, no caso das mulheres, árbitras ou assistentes, não assegurarem qualquer apoio do Estado no momento da gravidez e da maternidade. O mesmo acontece com os homens, por exemplo, em caso de baixa por doença. Para receberem o respetivo vencimento, os árbitros em Portugal passam recibos verdes, como outro qualquer trabalhador independente.

Apesar disso, no caso de Andreia o gosto pela arbitragem foi-se sobrepondo aos obstáculos que foi encontrando. Em 2013 ascendeu ao quadro masculino do Pró Nacional e em 2016 recebeu a insígnia FIFA, altura em que passou a fazer jogos na Europa como árbitra assistente e, aqui em Portugal, na distrital de Braga, os primeiros masculinos apenas no segundo escalão.

Decidir ser mãe com um calendário na mão: "A gravidez foi planeada para não perder épocas"

Em 2017, a primeira interrupção, a primeira gravidez.

"Como ascendi a FIFA no ano anterior, não queria perder muitas épocas. Então, a gravidez foi mais ou menos planeada para não perder épocas. Tive a sorte de conseguir engravidar na altura que pretendia. Acabei a época anterior a fazer jogos já grávida, tinha dois meses de gravidez quando fiz o último jogo, entretanto suspendi a atividade para o nascimento do meu filho. Nasceu em outubro e em dezembro voltei a fazer os testes para não perder essa prova que iniciou em setembro."

Em 2020, e depois de um período sem grandes avanços na arbitragem e que coincidiu com um novo projeto profissional, nasceu o segundo filho. Neste caso, apesar de bem recebida, a gravidez não foi planeada. Tudo porque para uma atleta, neste caso árbitra, o planeamento de uma gravidez implica ponderáveis acrescidas, um cálculo meticuloso que implica estudar quais os meses ideais para parar, para recuperar, sem prejudicar em demasia a época desportiva, mas sobretudo a vida familiar. Contudo, o facto da segunda gravidez ter coincidido com a COVID-19 acabou por minimizar a sua ausência dos relvados, uma vez que tudo parou, a começar pelo futebol.

"Sempre quis ter filhos, sempre tive isso em mente, trabalhar e ter filhos. Mas isso requer muito da nossa parte. Não se vêem muitas jogadoras e árbitras com filhos, é preciso um planeamento diferente por comparação com a carreira dos homens. Um filho obriga sempre a uma paragem muito prolongada. E no nosso caso, como não temos contrato, simplesmente estagnamos na nossa atividade. Não recebemos, não temos qualquer apoio. Nunca tive problemas porque sempre trabalhei ao mesmo tempo e tive direito à licença de maternidade por outra via."

"Para quem vive só da arbitragem é muito difícil. É claro que este caminho tem de ser desbravado"

Já com dois filhos, Andreia queria dedicar-se a 100% ao seu grande objetivo na carreira de árbitra: integrar as competições masculinas nacionais, ou seja, primeiro e segundo escalões. A meta estava traçada, mas o regresso foi bem mais custoso do que esperava. O natural impacto da segunda gravidez exigiria, só por si, um enorme esforço de recuperação física, exigência que aumentaria substancialmente com as exigentes provas de acesso ao futebol masculino nacional. "Voltar ao campeonato e ter de fazer algo tão complicado como as provas masculinas foi um processo muito complexo. Ainda pensei abandonar, mas as coisas correram bem."

Não desistiu e em 2021 foi recompensada por todo o esforço pessoal e familiar. Começou por se integrada no quatro AAC2, a apitar jogos da II Liga masculina, para um ano depois seguir para a Colômbia, onde participou na Copa América Feminina.

Em 2023, com uma pós-graduação pelo meio (!), estreou-se na I Liga masculina, acabando por cumprir  quatro jogos nessa época. O desempenho acabaria por se reconhecido, ao terminar a época entre os quatro primeiros classificados na categoria de Árbitro Assistente C2 (AAC2), juntamente com João Morte, Miguel Martins e David Soares. Todos acabaram promovidos à categoria AAC1 para a temporada de 2024/25, agora a decorrer.

A lesão: "A nossa fisionomia não é a mesma de um homem, os valores de análise definidos eram altos"

Tudo corria bem. Mas uma lesão no gémeo decorrida de um treino de potência impediu-a de apitar qualquer jogo até então.

"Como temos de fazer provas masculinas, necessito de fazer um treino específico de potência, começou por dizer.

"A nossa fisionomia não é a mesma de um homem, os valores de análise definidos eram altos para a competição e acabei por rasgar o gémeo"

A lesão, acredita, aconteceu sobretudo pelos parâmetros desproporcionais exigidos às mulheres nas provas pensadas para homens.

"Durante todos estes anos nas competições femininas nunca tive nenhuma lesão de maior, apenas coisas pequenas, mas realmente desde que estou no masculino fui sentido algumas lesões mais profundas e depois sofri esta lesão grave. Não rasguei por completo por pouco e realmente se as provas tivessem os parâmetros mais baixos, fazia mais sentido. Este ano já houve esse ajuste, para que a carga fosse reduzida em termos de treino para nós, infelizmente já depois de me ter acontecido isto."

É a Federação Portuguesa de Futebol quem estipula os parâmetros de avaliação do esforço físico, que antes da alteração eram acima dos exigidos pela UEFA. "Ainda bem que mudaram, é esse o caminho", apontando a sua estreia como assistente inscrita na I Liga para as primeiras semanas de outubro, quando se fará de novo história.

Andreia Sousa
Andreia Sousa Andreia Sousa créditos: © 2023 LUSA - Agência de Notícias de Portugal, S.A.

As condições dos árbitros em Portugal

Sem contratos: "A arbitragem podia ser mais valorizada"

Segundo Andreia, que reconhece o esforço da APAF (Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol) nesta batalha, a arbitragem "ainda é vista como as modalidades, podia ser mais valorizada".

Mas há melhorias, defende: "No ano passado começou um processo novo. Algumas árbitras (principais) foram selecionadas, as que têm maior potencial internacional, para integrar um projeto profissional. São sete árbitras, que desde o ano passado são profissionais da arbitragem. Desde o ano passado recebem um valor mensal. Não estou dentro desse lote, mas sei que não há contrato assinado. Há coisas ainda por esclarecer. Mas há um valor mensal e podem dedicar-se a tempo inteiro à arbitragem. O valor é pago pela Federação e pelo que sei o pretendido é abranger no futuro todo o conjunto de árbitros."

Questionada sobre se abdicaria da carreira que mantém em paralelo caso lhe fosse proposto um contrato por parte da FPF, Andreia Sousa hesita.

"Teria de pensar bem, depende muito dos parâmetros. Tenho uma atividade em consultoria informática, o que dá para ter alguma flexibilidade em termos de trabalho. Teria de analisar bem. Mas não coloco de parte essa possibilidade", afirmou, antes de explicar a exigente rotina semanal.

"Sinto que esta batalha de ser árbitra no futebol masculino, ter uma atividade laboral de 8 horas diárias, dois filhos e agora mais uma lesão complexa, é muito exigente e difícil de travar"

Noto que podia ser mais profissional ou melhor árbitra, não em termos de competências, mas em termos de estabilidade, o que neste momento não acontece. Tenho treinos três vezes por semana. 1h30min em cada dia. E com dois filhos não é fácil".

Remuneração média por jogo na I Liga: "Se compararmos com árbitros profissionais de outros países, recebem três vezes acima"

Sem contrato, os árbitros portugueses recebem através de recibos verdes. A cada mês passam um recibo, cujo valor é defino com base no número de jogos realizados. Para Andreia Sousa, a ausência de um vínculo mais sólido e estável é prejudicial e ajuda a explicar a impossibilidade de se viver em exclusivo da arbitragem em Portugal.

"Estamos atrasados, sim. Para as mulheres e para os homens. Creio que 90% dos árbitros assistentes da I Liga trabalham paralelamente, mantêm outras profissões", lembrou.

Quanto à remuneração, de acordo com a informação facultada pela APAF, varia entre os 1500€ e os 5000€ por mês, consoante a categoria.

"Na I Liga, 5000€ para o árbitro principal, 2500€ para assistentes. No segundo escalão, 3000€ para os juízes principais, 1500€ para os assistentes" (APAF)

Qualquer árbitro de primeira categoria que faça jogos na II Liga recebe pela categoria e não pela divisão em que está a arbitrar. Quanto ao número de jogos, pode variar consoante as lesões e e está dependente das escolhas do Conselho de Arbitragem. Mas em média, por mês, cada árbitro e assistente fazem três, quatro jogos.

Andreia reconhece que os valores atribuídos têm vindo a subir, mas sublinha que nas principais ligas o cenário é muito diferente. "Claro que se compararmos com árbitros profissionais de outros países, recebem três vezes acima. Mas o caminho será esse, tentarmos igualarmo-nos. Por exemplo, Espanha e França oferecem cerca de 6000 mil euros por mês, sem contar com os prémios de jogo. E têm um contrato e todas as regalias de um funcionário quando integra uma entidade patronal", comparou a árbitra de 37 anos.

A relação dos jogadores com as árbitras assistentes em campo: "Por norma, o conselho de arbitragem nomeia-nos para ficarmos no lado dos bancos"

Num qualquer jogo de futebol em Portugal é comum assistirmos a ofensas em catadupa por parte dos jogadores e treinadores dirigidos aos árbitros. Contudo, garante Andreia, a presença de árbitras em campo, incluindo as assistentes, parecem atenuar um pouco o comportamento mais agressivo dos protagonistas do jogo.

"Face à minha experiência e à das minhas colegas, notamos que existe um respeito muito grande dos jogadores. Nós temos sempre no jogo dois assistentes: um que fica do lado dos bancos, outro do lado oposto. Por norma, o conselho de arbitragem nomeia-nos sempre para ficarmos no lado dos bancos, porque realmente sentem que existe um acalmar diferente, com mais respeito para connosco. Sinto muito isso."

Andreia ainda não consegue explicar o porquê da diferença de comportamento.

"Não sei se tem a ver com o facto de ser novidade. É como se estivessem ainda a tentar perceber qual o nosso limite, a testar-nos. Mas também pode ser pela nossa postura, não sei. Eu tenho uma atitude bastante branda, tento perceber o que é um desabafo de uma falta de respeito. Tento comunicar com eles sempre com o cuidado de os ouvir, porque isso é importante para eles. Eu aceito isso, desde que o façam com respeito."

Os comentários sexistas nas bancadas e a nova realidade da I Liga: "Afinal até percebe de futebol"

Dos distritais para os nacionais, a reação do público às decisões de arbitragem são vividas de forma diferente. Não se pode dizer que a forma de acompanhar o futebol seja amplamente diferente, mas a pequena dimensão dos estádios nos escalões inferiores permite aos árbitros ouvirem facilmente os comentários do público. A discriminação por parte de adeptos nos jogos de escalão superior acaba por ser menos notória, mas também existe. Revela-se de outra forma, igualmente questionável.

"Sentia mais isso no início da arbitragem, no distrital. Não sei se é pelo facto de haver menos público e estarmos muito próximas dele, ouvíamos coisas desagradáveis, sim. Nas competições nacionais, o que ouvimos mais, do que me vou apercebendo, é de comentários do género: 'ah, afinal até percebe de futebol...', como se não estivessem à espera que tivéssemos a mesma competência por sermos mulheres. Agora, quando erro ouço o mesmo que um homem... e não é bom, claro. Sinto que faltam ao respeito na mesma, mas de uma forma que para eles é como se fosse mais carinhosa. Para nós não é, claro", referindo-se à descriminação positiva de que é vítima.

Quanto ao futebol praticado, a mudança para um palco superior sente-se sobretudo na intensidade do jogo. "As coisas acontecem muito mais rápido. Mas por outro lado senti uma grande diferença, que foi um grande alívio para mim, que tem a ver com o entendimento do futebol. Na I Liga, notei que se percebia melhor o sentido do jogo, é mais previsível para nós, apercebemo-nos mais facilmente das dinâmicas. E isso ajuda-nos.

O papel de assistente, vulgarmente conhecido por 'fiscal de linha': "Seria mais fácil ser árbitra principal"

Ficará surpreendido se lhe disser que um assistente, fiscal de linha, ou 'aquele/aquela de bandeirola', como preferir, faz em média 6 a 7 quilómetros por jogo? Acredito que sim, também fiquei. Mas há mais: Um árbitro pode chegar aos 13 quilómetros por jogo, distância que muito dificilmente um jogador de campo fará em 90 minutos. O desempenho dos juízes está, por isso, intrinsecamente ligado à capacidade física adquirida de cada um.

"Os treinos são diferentes entre árbitros e assistentes. Nós temos provas sprints de potência, os árbitros [principais] é mais ao nível cardiovascular e de intensidade", explicou-nos Andreia, que não hesita em escolher qual o papel de maior desafio para si entre os árbitros do jogo.

"Ser árbitro assistente possuiu uma exigência diferente. Como árbitra principal, apesar da enorme responsabilidade, tenho sempre os quatro olhos, de cada assistente."

"Como assistente, não tenho ninguém para mim. Faço o meu trabalho e ainda tenho de estar atenta, a apoiar. Eu sempre defendi que o árbitro assistente não está lá só para tirar foras-de-jogo, eu também estou a arbitrar o jogo. Como fui árbitra principal não consigo desligar-me dessa vertente. Dou sempre a minha opinião. E isso é algo muito bom entre os árbitros. Ouvimo-nos muito entre nós, como equipa".

Para se ser assistente, revela-nos, há uma capacidade que deve ser adquirida desde cedo e desenvolvida constantemente, sobretudo por causa do fora-de-jogo.

"Visão periférica. Trabalhamo-la muito. Nós estamos a olhar para a frente [último jogador na linha defensiva], mas estamos também atentos ao espaço do campo onde sai a bola. Temos de estar a ver duas coisas ao mesmo tempo. Temos de ter um bom posicionamento e a visão periférica sempre alinhada. Temos de estar dentro do jogo. Não estamos sempre com o mesmo árbitro. Devemos perceber o modo de arbitrar, o que quer, o que não quer, o que sentimos nós junto aos bancos, tudo é importante, é muito exigente."

Andreia Sousa
Andreia Sousa Andreia Sousa

O clubismo em Portugal: "Deixa-me triste pensar que não vou poder levar o meu filho a um jogo do SC Braga"

O fenómeno é transversal a todos os árbitros. Em Portugal, as decisões de arbitragem servem de mote para longas discussões entre adeptos, nomeadamente com palco televisivo. Se é falta, se não é; se o árbitro é reincidente em decisões erradas com determinada equipa; se tem ligações a este ou aquele clube, enfim. Uma panóplia de opções. Ao longo das últimas décadas tem-se revelado uma tendência enraizada culturalmente e com impacto na vida dos árbitros. Andreia Sousa não é exceção.

"Deixa-me triste, sim. Não tenho clube porque na minha família nunca ligaram a futebol. Mas se tivesse não tinha problema em dizê-lo. Não tenho clube, mas sou muito aficionada pelos clubes aqui do Norte. Desde que estou na arbitragem que vou sempre ver jogos, sobretudo os do Norte, que são mais perto.

Deixa-me triste pensar que não vou poder levar o meu filho a um jogo do SC Braga. Se for, não pode ir com a camisola. E estou a falar deles, não de mim.

"Penso nessa perspetiva: De que alguém vai ver, o vai associar a mim, que surja mais tarde uma fotografia e notícias erradas ou especulações"

As referências e o sonho: "Manter-me na I Liga durante muitos anos até conseguir atingir o limite de idade"

Sandra Bastos e Stéphanie Frappart. A primeira, justifica, pela resiliência. "Nota-se pela idade que já tem, continua a dedicar-se de corpo e alma à arbitragem. Sem dúvida uma referência". A segunda, "por todo o percurso internacional" que tem trilhado.

Mas também no masculino: "Jorge Sousa e Bertino Miranda", este último um dos mais reconhecidos assistentes portugueses, que se retirou em 2016.

Não hesitou em responder assim que lhe foram pedidas as suas referências na arbitragem. E o mesmo aconteceu quando questionada sobre o que seria para si atingir o topo da carreira.

"Seria manter-me na I Liga durante muitos anos até conseguir atingir o limite de idade (50 anos). Sempre como assistente, agora já não vou mudar de área. Depois, claro, ir ao Euro 2025, na Suíça, é um grande objetivo meu. Eu tenho um senão, o facto de já estar parada e não ter jogos há algum tempo. Mas se a lesão estiver tratada em breve, sem dúvida que é expectável e viável estar no Euro, assim espero", confessou-nos a árbitra assistente já com experiência em competições europeias, sempre no feminino, incluindo na Liga dos Campeões.

Agora, chegada à primeira categoria e com o estatuto internacional de assistente FIFA já há oito anos, poderá também fazer jogos no masculino lá fora - Liga Conferência, Liga Europa ou Liga dos Campeões.

"Será esse o caminho. Quando já estiver a arbitrar os jogos masculinos na I Liga (depois da lesão) poderá surgir essa oportunidade", assumiu, sem se mostrar demasiadamente ansiosa pelo momento, mas nunca escondendo a clara primazia pela presença no Europeu Feminino 2025: "Seria um sonho".