O projecto do presidente da FIFA, Gianni Infantino, de ampliar para 48 o número de seleções presentes no Mundial do Qatar em 2022, o que obrigará países vizinhos a receber alguns jogos da competição, poderá provocar um aumento nas tensões diplomáticas na região.
Segundo analistas contactados pela AFP, o Qatar, país escolhido inicialmente para acolher a sede da competição com 32 seleções, não tem capacidade estrutural para receber 48 equipas. Perante este problema estrutural do Qatar, o Kuwait e Omã poderiam receber alguns dos jogos do Mundial sendo que os dois países não se envolveram na crise do Golfo, iniciada em 2017 entre Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Bahrein e Egito, de um lado, e Qatar do outro.
Longe de harmonizar uma região politicamente turbulenta, a proposta da FIFA de aumentar o Mundial 2022 para 48 países poderá aumentar as tensões na região e colocar tanto o Kuwait como Omã numa posição ainda mais delicada em relação ao bloqueio na região liderado pela Arábia Saudita, peso pesado no Oriente Médio.
- Cinco potenciais candidatos -
"Há um risco muito real que a ampliação do Mundial 2022 ao Kuwait ou a Omã deixem estes dois países mais vulneráveis e que sofram a mesma pressão regional que o Qatar tem sofrido desde 2017", afirmou Kristian Coates Ulrichsen, investigador da Universidade de Rice, em Houston.
"A ideia de um campeonato do Mundo que inclua o Kuwait e Omã, mas não a Arábia Saudita ou os Emirados Árabes, poderia supor uma amargura considerável em Riad e Abu Dhabi", acrescentou o investigador.
Para passar de 64 jogos (no formato com 32 seleções) a 80 (com 48 seleções), seria necessário organizar algumas partidas fora do Qatar, num país vizinho. "Nenhum país é favorito, cinco têm o direito a manifestar-se: Bahrein, Kuwait, Arábia Saudita, Omã e Emirados", adiantou uma fonte próxima à FIFA.
Devido à crise política, parece complicado neste momento que Arábia Saudita, Emirados e Bahrein possam organizar em conjunto com o Qatar um grande evento desportivo.
Em junho de 2017, o Qatar foi alvo de um embargo diplomático e económico por parte de Riad e seus principais aliados na região, que acusam Doha de apoiar grupos islâmicos radicais e criticam a aproximação ao Irão, grande rival da Arábia Saudita.
O Qatar negou sempre as acusações de apoio a grupos extremistas islâmicos e acusou os adversários de querer reduzir o país a um Estado vassalo. Kuwait e Estados Unidos tentaram mediar as conversas entre as duas partes, mas sem sucesso.
Andreas Krieg, do King's College de Londres e que atuou como conselheiro do governo do Qatar, reconhece que Kuwait e Omã "têm problemas com a Arábia Saudita e com os Emirados".
As tensões entre Kuwait e Arábia Saudita vêm da repartição das áreas petrolíferas entre os dois países, enquanto que Omã foi criticado por supostamente ter deixado passar pelo seu território carregamentos de armas iranianas enviados a guerrilheiros do Yémen contra Riad.
- Dois blocos de três países -
"O projeto da FIFA de ampliar a outro país o Mundial 2022 irá reforçar o sentimento de que o Golfo está dividido em dois blocos de três países cada", considerou Krieg.
A FIFA apresentou na semana passada em Miami um estudo de viabilidade que recomendava ampliar o número de seleções em 2022.
"Chegámos à conclusão de que é possível passar de 32 para 48 seleções se algumas condições forem cumpridas", declarou Infantino. A decisão final sobre o assunto será tomada em junho, em Paris.
A UEFA já afirmou considerar que a expansão "não é realista".
Este aumento de seleções irá traduzir-se em 16 partidas a mais disputadas nos mesmos 28 dias da compatições. Especialistas questionam-se como é que os estádios e as infraestruturas de Kuwait e Omã poderiam responder positivamente aos rigorosos critérios da FIFA.
Com todas estas questões é pouco provável que o Mundial possa vir a ser uma resolução política para a região, afirmou James Dorsey, investigador da Rajaratnam School of International Studies de Singapura e autor de 'The Turbulent World of Middle East Soccer' ('O Turbulento Mundo do Futebol no Oriente Médio', em tradução livre).
"A crise do Golfo não irá resolver-se a jogar futebol", alertou.
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