O treinador Artur Jorge entrou para a história do Botafogo, ao conduzir o clube carioca para o seu terceiro título de campeão do Brasil, 29 anos depois da última conquista. O técnico português mergulhou os adeptos do Fogão numa euforia sem fim, depois de os ter dado também a sua primeira Taça Libertadores da história. Depois da Taça da Liga com o Braga e a Libertadores com o Botafogo, este é o terceiro título da carreira do treinador português.

Artur Jorge torna-se no terceiro treinador português a vencer o campeonato brasileiro, depois de Jorge Jesus em 2019 pelo Flamengo e Abel Ferreira pelo Palmeiras em 2022 e 2023. Quatro dos últimos seis campeonatos brasileiros foram conquistadores por treinadores portugueses.

Este título foi conquistado com ajuda de vários jogadores que já passaram por Portugal, como Alex Telles (FC Porto), Tiquinho Soares (Nacional, Vitória Guimarães e FC Porto), Carlos Eduardo (Estoril e FC Porto), Danilo Barbosa (Braga e Benfica), Marçal (Nacional e Torreense).

Um filho de Braga à conquista da América

Natural de Braga, Artur Jorge, de 52 anos, tem uma carreira como jogador e treinador intimamente ligada ao SC Braga, principal clube da cidade, pelo qual conquistou uma Taça da Liga, em janeiro de 2024, numa final diante do Estoril Praia (no desempate por grandes penalidades, por 5-4).

Na época 2022/23, o técnico estabeleceu novos recordes de pontos (78), vitórias (25) e golos (75) no Sporting de Braga na I Liga e tornou-se no treinador dos minhotos com mais de 50 jogos à frente da equipa com melhor percentagem de vitórias (62 por cento).

Em 2022/23, atingiu ainda a final da Taça de Portugal, na qual perdeu para o FC Porto (2-0) e conseguiu ainda o apuramento para a fase de grupos da Liga dos Campeões, o que aconteceu pela terceira vez depois de 2010/11 e 2012/13, depois de ultrapassar duas pré-eliminatórias.

Antigo defesa central, Artur Jorge alinhou 12 épocas na equipa principal do SC Braga, além da formação, e em várias foi capitão da equipa.

Como técnico, começou em 2010/11 a treinar os juniores e, com uma interrupção de duas temporadas, em que orientou o Tirsense e o Limianos em escalões inferiores, voltou ao clube do ‘coração’ e à formação, em 2017/18.

Os fantasmas existiam, não tenho problema de falar sobre isso. Eu quis passar a mensagem de não olharmos para trás, mas não ignorarmos o que aconteceu e dar mais foco na história que podemos escrever daqui para frente, Artur Jorge

Artur Jorge foi ‘subindo’ até à equipa B até António Salvador o ter escolhido, na época 2022/23, para suceder a Carlos Carvalhal, outro treinador da ‘casa’.

O treinador, de 52 anos, estreou-se, assim, como técnico na I Liga portuguesa em 2022/23, tendo logrado o terceiro lugar, igual classificação que, em 2019/20, ajudou a obter para os minhotos quando assumiu o comando da equipa principal nas últimas cinco jornadas.

O Sporting de Braga tem três terceiros lugares no escalão maior do futebol português na sua história, sendo que dois deles têm ‘selo’ de Artur Jorge. A melhor classificação de sempre foi o segundo posto, conseguido em 2009/10, então liderados por Domingos Paciência.

Artur Jorge para curar a depressão botafoguense

A viver uma depressão profunda, depois de ter perdido o Brasileirão 2023 para o Palmeiras, numa prova que chegou a liderar com 13 pontos de vantagem sobre o segundo colocado, o Botafogo viu no técnico português o homem ideal para voltar a sonhar, depois de afastar Tiago Nunes devido aos maus resultados no Estadual carioca.

A humilhação do título perdido em 2023 tornou-se em tema de conversa em quase todas as conferências de imprensa, algo que irritava o técnico português.

"Os fantasmas existiam, não tenho problema de falar sobre isso. Eu quis passar a mensagem de não olharmos para trás, mas não ignorarmos o que aconteceu e dar mais foco na história que podemos escrever daqui para frente", disse o português em julho.

Depois do pesadelo de 2023, Artur Jorge transformou o Botafogo numa máquina ofensiva, em parte graças aos mais de R$ 300 milhões de reais, perto de 48 milhões de euros (R$ 1,7 mil milhões, na cotação atual) investidos em contratações esta temporada.

Mas início de Artur Jorge no Fogão esteve longe de ser o idealizado pelo técnico e pelos adeptos do Alvinegro carioca. Duas derrotas, para a LD Quito na Libertadores e para o Cruzeiro na 1.ª ronda do Brasileirão deixaram desconfiados os adeptos, que vinham de 5.º lugar no Campeonato Carioca 2024, que o deixou fora da disputa do título estadual.

O pesadelo com o título perdido na época anterior parecia não ter fim, mas as cinco vitórias seguidas, (três no Brasileirão) um deles diante do Flamengo, ajudou a recuperar a confiança dos adeptos.

O Alvinegro do Rio entrou nos eixos e na jornada 9 tomou a dianteira da prova. Aproveitando as escorregadelas dos adversários, a equipa de Artur Jorge foi mantendo-se na liderança ou nos primeiros lugares. A equipa foi crescendo, recebeu reforços de peso como o argentino Thiago Almada e o brasileiro Igor Jesus que se juntou a Luís Henrique para formar a equipa que melhor futebol pratica no Brasil.

O Botafogo era uma equipa talhada para grandes jogos no Brasileirão, como mostram os triunfos frente a Flamengo, Palmeiras, Fluminense, Corinthians, Atlético Mineiro, Vasco da Gama e Internacional. Os desaires com Bahia, Criciúma, Cruzeiro e Juventude não abalaram o Fogão na sua missão.

Nos derradeiros jogos, com a cabeça também muito focada na Libertadores, que viria a conquistar pela primeira vez, o Botafogo teve empates comprometedores que fizeram sonhar o Palmeiras, o Flamengo e o fantástico Fortaleza de Juan Pablo Vojvoda. Os três empates seguidos com Vitória, Cuiabá e Atlético Mineiro deixaram a equipa em igualdade pontual com o Palmeiras, mas uma vitória contundente na casa do Verdão na última ronda voltou a deixar tudo nas mãos do Glorioso carioca.

Mesmo com o início irregular na Taça Libertadores, o Botafogo conseguiu apurar-se em segundo no Grupo D e depois eliminou Palmeiras (oitavos de final), São Paulo (quartos de final), Peñarol (semifinal) até vencer o Atlético Mineiro na final por 3-1, na final, num jogo onde jogou com menos um desde os 40 segundos do encontro.

Artur Jorge iguala Jorge Jesus e Abel Ferreira e é o terceiro português a conquistar a Glória Eterna
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Apesar de a defesa nem sempre se mostrar segura (47 golos sofridos em 53 jogos até a final da Taça Libertadores), o técnico português conseguiu um encaixe perfeito com quatro jogadores de seleção na frente: o argentino Thiago Almada, o venezuelano Jefferson Savarino e os brasileiros Luiz Henrique e Igor Jesus.

O homem do plano

"Recebo os planos de jogo do treinador no meu smartphone. Nunca vi um plano seguido tão à risca, tão bem ensinado pelo treinador e tão bem executado pelos jogadores", destacou este mês o polémico magnata norte-americano John Textor, dono da SAF (Sociedade Anónima do Futebol) do Botafogo.

O modelo de jogo de Artur Jorge é inspirado no 'futebol total' eternizado pelo holandês Johan Cruyff, pelo seu estilo "dinâmico" e "ofensivo", e pela "verticalidade" e "velocidade" das equipas comandadas pelo alemão Jürgen Klopp.

"Tenho essas duas referências que me ajudaram a criar o meu próprio conceito de jogo e contextualizar", disse o português em entrevista à TV Globo.

Mas o seu maior ídolo é o craque argentino Diego Maradona.

"Maradona sempre foi a minha referência e o meu ídolo. Como jogava, a sua parte irreverente, a sua parte problemática atraia-me também. Não sou de coisas muito certinhas, gosto de dinâmica", destacou Artur Jorge.

Com um toque de Midas, Artur Jorge transformou o Botafogo na melhor equipa do Brasil na atualidade, retirando os adeptos do Alvinegro de uma depressão profunda para os mergulhar numa euforia sem fim.

Depois da conquista da Libertadores pela primeira vez, o terceiro título brasileiro, 29 anos depois de último, conquistado sob o comando de Paulo Autuori, com os golos de Túlio Maravilha na frente.

Artur Jorge já está entre os imortais do Glorioso Carioca.

* Com Lusa e AFP