O Tribunal Constitucional de Cabo Verde rejeitou um recurso de José Veiga que pretendia o descongelamento das suas contas bancárias no arquipélago, bloqueadas há vários anos no âmbito da investigação ao empresário português.

De acordo com o recente acórdão do Tribunal Constitucional, consultado hoje pela agência Lusa, em causa está um recurso contra o procurador-geral da República em que o antigo empresário de futebol José Veiga e oito sociedades a que está ligado, incluindo da República do Congo, requeriam o “descongelamento das suas contas bancárias por violação da lei e da Constituição” cabo-verdianas.

Em concreto, o recurso interposto em dezembro de 2019 e recusado pela unanimidade dos três juízes daquele tribunal já em junho deste ano pretendia o descongelamento das contas dos requerentes no antigo Banco Internacional de Cabo Verde (BICV), atualmente International Investment Bank (IIB, do Bahrein), embora sem concretizar os valores.

Em 2017, foi noticiado em Portugal que José Veiga tinha depositado no Novo Banco de Cabo Verde (BICV, posteriormente Novo Banco e entretanto vendido ao IIB) 60 milhões de dólares (50,9 milhões de euros) de oito empresas por ele controladas, com o propósito de garantir a compra daquele mesmo banco.

No recurso, os advogados do empresário português argumentam que o historial do processo aponta que “o ato de congelamento das contas bancárias do requerente e suas representadas foi efetivado apenas com o despacho judicial de 24 de março de 2017 proferido no processo-crime em Portugal” – no âmbito da investigação ao empresário pelas autoridades portuguesas -, o qual “foi cumprido” pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de Cabo Verde e “comunicado ao banco sem nunca este despacho ter passado pelo crivo do juiz e do tribunal cabo-verdiano”.

“O que é manifestamente inconstitucional e ilegal”, lê-se no recurso, citado no acórdão.

Acrescenta que “à luz do regime jurídico da cooperação judiciária internacional entre Portugal e Cabo Verde, o limite temporal para o descongelamento deve ser aferido no âmbito do direito interno cabo-verdiano”, defendendo por isso que deve ser feita “interpretação e aplicação dos oito meses sem que se tenha deduzido acusado acusação” e “não à luz do direito português”, alegando por isso que a decisão de congelar as contas bancárias “caducou”.

“Desde 24 de março de 2017, permanecem os fundos depositados nas contas bancárias, do requerente e suas representadas congelados ilegalmente pelo PGR [procurador-geral da República], à ordem das autoridades judiciárias portuguesas, sem notícias de qualquer acusação deduzida contra o requerente e das suas representadas, tanto em Portugal, como, em Cabo Verde”, insiste o recurso.

Já o acórdão do Tribunal Constitucional que rejeita o recurso refere que a consulta ao processo permitiu “constatar que o congelamento das contas bancárias dos recorrentes fora decretado por despacho da então magistrada judicial que se encontrava colocada no 2.º Juízo Crime do Tribunal da Comarca da Praia”.

“Fica, pois, demonstrado que o senhor procurador-geral da República não ordenou o congelamento das referidas contas bancárias”, lê-se no acórdão, que ordena ainda o arquivamento.

Uma investigação divulgada em agosto de 2019 pela Global Witness afirmava que o filho do Presidente da República do Congo e deputado, Denis Christel Sassou-Nguesso, terá "extorquido mais de 50 milhões de dólares [42,5 milhões de euros] do Tesouro congolês" através de uma rede de empresas "complexa e opaca" em vários países, alegadamente através de José Veiga.

O Ministério Público cabo-verdiano avançou em outubro de 2016 com o pedido para confiscar o dinheiro que José Veiga tem no país, onde é investigado desde 2015 por suspeitas de lavagem de capitais.

O então procurador-geral da República, Óscar Tavares, afirmou à Lusa em 21 de outubro de 2016 que em causa estão “dinheiros que estavam apreendidos e congelados, depositados em contas bancárias em Cabo Verde".

O antigo empresário de futebol tentou criar um banco em Cabo Verde e posteriormente comprar o Banco Internacional de Cabo Verde, (ex-banco Espírito Santo de Cabo Verde, vendido posteriormente pelo Novo Banco ao IIB) operações que foram chumbadas, quer pelo Banco de Portugal, quer pelo Banco de Cabo Verde.

Desde 2015, corre em Cabo Verde uma investigação a José Veiga por suspeitas de utilização do sistema cabo-verdiano para eventuais crimes de lavagem de capitais, num processo autónomo da investigação sobre o empresário em Portugal.