O anúncio da criação de uma Superliga europeia de futebol, com 12 dos principais clubes de Inglaterra, Itália e Espanha, provocou uma agitação sem precedentes, com a oposição de governos e federações ao projeto marginal à UEFA.
Desde 1998 que tem estado patente a ambição dos grandes clubes europeus se juntarem numa competição, mas o projeto tem sido sempre adiado face à adaptação do formato da Liga dos Campeões pela UEFA, assegurando a presença regular destes emblemas na fase final.
A iniciativa tomou forma no domingo, dia 18 de abril, com o comunicado de 12 fundadores (AC Milan, Arsenal, Atlético de Madrid, Chelsea, FC Barcelona, Inter Milão, Juventus, Liverpool, Manchester City, Manchester United, Real Madrid e Tottenham), que, além de regerem a competição, asseguram a presença anual, juntamente com outros oito clubes.
O anúncio ocorreu na véspera de a UEFA divulgar os planos para o novo modelo da Liga dos Campeões, aumentando a principal competição europeia de clubes para 36 equipas, a partir de 2024/25.
- O que move os 12 fundadores? Porquê agora?
Os 12 clubes fundadores da Superliga anunciaram a nova competição horas antes de a UEFA divulgar o novo modelo das competições europeias a partir de 2024/25. No caso da Liga dos Campeões, a prova vai aumentar de 32 para 36 clubes e vai deixar de existir a fase de grupos, passando a ser uma liga única.
O presidente do Real Madrid, Florentino Pérez, também designado presidente da Superliga, afirmou na segunda-feira que a Superliga é uma competição que vai “salvar o futebol”, explicando que a ‘Champions’ só é atrativa a partir dos quartos de final.
Os impactos financeiros da pandemia de covid-19 nos clubes, com os jogos a decorrerem na sua grande maioria à porta fechada, foi outro dos argumentos para avançar com esta prova.
- Quem são os 12 fundadores e quantos clubes vai ter a Superliga?
AC Milan, Arsenal, Atlético de Madrid, Chelsea, FC Barcelona, Inter Milão, Juventus, Liverpool, Manchester City, Manchester United, Real Madrid e Tottenham são os 12 clubes fundadores.
A ideia é ter mais três clubes fixos na Superliga, enquanto as restantes cinco vagas serão atribuídas por mérito desportivo, qualificando-se anualmente, com base no desempenho da época anterior. Serão, assim, 15 equipas fixas na Superliga, mais as cinco vagas, num total de 20.
- Porque estão quase todos contra a Superliga?
O facto de a nova Superliga ser uma ‘competição fechada’, em que 15 clubes têm lugar garantido todas as épocas, sobrando apenas cinco vagas, está no centro das críticas.
UEFA, governos, federações, clubes e jogadores condenam este modelo por não ter em conta o “mérito desportivo” das equipas ao ter lugares fixos, ao contrário da Liga dos Campeões. O organismo que tutela o futebol europeu fala em "ganância" dos clubes envolvidos.
- Qual o formato da competição? Em que difere da Liga dos Campeões?
A época arrancará em agosto, com dois grupos de 10 equipas e os jogos, em casa e fora, serão realizados a meio da semana, mas todos os clubes participantes continuarão a disputar as respetivas ligas nacionais.
Os três primeiros classificados de cada grupo e os vencedores de um ‘play-off’ entre o quarto e o quinto posicionados disputarão os quartos de final, em duas mãos, seguindo-se a fase a eliminar até ao jogo decisivo, em terreno neutro.
Já a Liga dos Campeões é atualmente disputada por 32 equipas, numa fase de grupos com quatro equipas em cada. Os dois primeiros de cada grupo seguem para as fases a eliminar.
A partir de 2024/25, a ‘Champions’ será alargada para 36 equipas e numa liga única, com cinco jogos em casa e outros tantos fora. Os oito primeiros avançam para os oitavos de final, enquanto as restantes vagas nesta fase a eliminar vão ser decididas em ‘play-off’ entre os nono e 24.º classificados.
- Quando é que vai começar a Superliga?
Os 12 clubes envolvidos não revelaram ainda uma data oficial para o seu início, apesar de existirem documentos anteriores que apontavam para a época 2022/23.
O presidente do Real Madrid referiu que a ideia é que a nova competição possa arrancar o quanto antes, explicando que as alterações da UEFA a partir de 2024 vão chegar tarde ao futebol.
- Quais os valores envolvidos nesta nova competição?
Os clubes fundadores da Superliga receberão um pagamento único no valor de aproximadamente 3,5 mil milhões de euros, destinados exclusivamente a investimentos em infraestruturas e a compensar o impacto da pandemia de covid-19. Este valor significa cerca de 230 milhões euros para cada clube.
A Superliga não divulgou ainda os prémios que cada clube irá receber por vitória, empate ou derrota, nem em relação aos apuramentos para as fases seguintes da competição.
Os organizadores referem ainda “pagamentos de solidariedade” que irão crescer em linha com as receitas da competição e que se espera que venham a superar os 10 mil milhões de euros.
- Quanto lucram os clubes com a Liga dos Campeões?
Além do prémio de participação, as receitas dos clubes participantes na Liga dos Campeões variam em função do desempenho na prova, do 'ranking' da UEFA a 10 anos e do ‘market pool’.
O Bayern Munique, que se sagrou campeão europeu na época passada, em Lisboa, arrecadou um valor recorde de 117,5 milhões de euros na ‘Champions’. A esta verba, acresce o valor do ‘market pool’, relacionado com os direitos televisivos.
Já esta época, o FC Porto assegurou 73,542 milhões de euros, depois de cair nos quartos de final da competição frente ao Chelsea, ainda sem o montante respeitante aos direitos de transmissão.
Este ano, além dos prémios de participação e de desempenho, a UEFA prevê distribuir um total de 292 milhões de euros pelos 32 clubes participantes na Liga dos Campeões, em função do valor proporcional dos países (‘market pool’).
- Como ficarão os direitos televisivos?
Os direitos de transmissão televisiva da Liga dos Campeões de futebol para Portugal foram adquiridos pela Eleven Sports até 2023/24, não sendo revelados os valores envolvidos. A operadora internacional já transmite a competição desde 2018.
Cada país tem o seu contrato para a transmissão da ‘Champions’ e não é certo o que pode acontecer aos contratos celebrados caso estas 12 equipas do ‘top’ do futebol europeu abandonem a competição.
A UEFA já garantiu que a Liga dos Campeões se realiza “com ou sem estes 12 clubes”.
- O que pode acontecer aos clubes da Superliga e aos seus jogadores na litigância com a UEFA?
O presidente da UEFA, Aleksander Ceferin, defendeu que os clubes devem ser banidos das competições internacionais e que jogadores dos clubes que alinhem numa Superliga vão ser “proibidos” de participar nas competições de seleções, como Mundiais e Europeus, ficando também proibidos de representar as suas seleções.
Em relação às competições nacionais, a UEFA explicou que serão os responsáveis dos países a decidirem, mas confia que, seguindo o caminho europeu, seja impedida a sua participação, “sempre dentro da lei”.
Sobre as competições europeias deste ano ainda em curso, nas quais ainda estão equipas do grupo de 12 fundadores, a UEFA disse desconhecer quando entram em vigor as proibições, estando a situação a ser analisada legalmente.
- Quais são os jogadores portugueses que alinham nos 12 clubes fundadores?
Este clubes contam com 11 jogadores portugueses, casos de Cristiano Ronaldo (Juventus), João Cancelo, Rúben Dias e Bernardo Silva (Manchester City), Bruno Fernandes (Manchester United), Diogo Jota (Liverpool), Cédric Soares (Arsenal), João Félix (Atlético de Madrid), Francisco Trincão (FC Barcelona), Diogo Dalot e Rafael Leão (AC Milan).
- O que aconteceu no caso recente da patinagem?
A federação internacional de patinagem (ISU) tentou impedir patinadores de participarem em competições de patinagem e patinagem de velocidade organizadas por terceiros, tendo, em dezembro último, a Comissão Europeia e o Tribunal Geral da União Europeia, a segunda instância judicial europeia, decidido que estas sanções seriam contrárias às regras da União Europeia em matéria de concorrência.
- Há competições do género noutras modalidades?
A Euroliga de basquetebol é um caso único de uma competição 'fechada' no desporto europeu. Em 2000/01, os clubes de basquetebol, pouco satisfeitos com a forma de repartição das receitas, decidiram criar a Euroliga, então organizada pela ULEB (União das Ligas Europeias) e fora do âmbito da FIBA (federação internacional).
A FIBA ameaçou os jogadores das equipas participantes de não poderem representar as suas seleções em Europeus, Mundiais e Jogos Olímpicos. Nessa temporada, houve duas ligas europeias, a da Euroliga, que registou o nome, e a da FIBA, a Suproliga, no entanto a duplicidade durou apenas um ano, já que a FIBA deu um passo atrás e na segunda edição da Euroliga já participaram todas as grandes equipas europeias.
Durante mais de uma década, a Euroliga e a FIBA tiveram uma existência pacífica, até que a federação internacional decidiu criar, em 2015, a Liga dos Campeões de basquetebol para voltar a ‘seduzir’ os grandes clubes.
A Euroliga contra-atacou, ao assinar um contrato por 10 anos com a IMG, que previa a distribuição de 36 milhões de dólares anuais entre as equipas com lugar fixo na competição.
A FIBA Europe, que rege o basquetebol europeu, chegou a ameaçar de sanções os clubes e as federações nacionais que apoiavam a Euroliga, mas acabaram por não ser aplicados quaisquer castigos.
Os lugares 'cativos' foram crescendo, sob o pretexto de garantir a “estabilidade”, e, hoje em dia, são 13 as equipas que têm assegurada a presença em cada edição da Euroliga (FC Barcelona, Real Madrid, Baskonia, Panathinaikos, Olympiacos, Fenerbahçe, Anadolu Efes, CSKA, Maccabi Telavive, Zalgiris, Olimpia, Bayern Munique, Asvel Villeurbanne), às quais se junta o Alba Berlin, que recebeu um convite válido por duas épocas.
As restantes vagas são repartidas entre os finalistas da EuroCup da temporada anterior e outros dois ‘convidados’ escolhidos pela organização da Euroliga.
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