O único campeão nacional de futebol pelo Belenenses ainda vivo, Manuel Andrade, disse à Lusa ser um motivo de orgulho representar o plantel de 1945/46 no centenário do clube lisboeta, mas considera que a homenagem peca por tardia.
“Felizmente, ainda estou cá. É um motivo de grande orgulho representar o plantel campeão nacional. Não estou muito habituado a estas coisas, mas fico satisfeito por poder gozar dessas regalias. Só tenho pena que não tenham começado há mais tempo, enquanto os outros eram vivos”, confessou.
Com 92 anos de idade, Manuel Andrade lamentou não ser mais reconhecido pelo Belenenses e, apesar de a sua presença no dia do centenário estar confirmada, garante que não foi convidado pela direção, na qual apenas conhece o presidente.
“Vou estar presente no dia do centenário, mas não fui convidado por ninguém da direção. Nem sabem que eu existo, estou mais ligado aos veteranos. O Belenenses tinha a obrigação de falar e divulgar determinadas coisas sobre o título. Ninguém sabe o que se passou há 70 anos”, criticou.
Manuel Andrade recordou histórias da inédita conquista do clube lisboeta, em 1945/46, na qual foi o melhor marcador, com apenas 18 anos.
“Tinha 18 anos, era o mais novo da equipa. Estreei-me num jogo memorável com o FC Porto. Aos 15 minutos, estávamos a perder 2-0, mas ganhámos 3-2, com três golos apontados por mim. Fui o melhor marcador nessa época, com 20 golos em 14 jogos, apesar de alguns só me darem 19 golos. Não me preocupo com isso”, lembrou.
O Belenenses conquistou o campeonato nacional em Elvas, numa vitória por 2-1 em que Manuel Andrade apontou um dos golos, mas nunca sentiu a fama num futebol que, como diz, era muito diferente do atual.
“Há 70 anos, o futebol era muito diferente. Na minha altura, falava-se de um jogo até ao dia seguinte e nunca mais se falava no assunto. Hoje, podem estar um mês a falar sobre a mesma coisa”, disse.
Manuel Andrade saiu do Belenenses e contou com passagens pelo Sporting, dos ‘cinco violinos’, e pelo Estoril, apesar de reconhecer que o maior feito da sua carreira desportiva foi a conquista do campeonato nacional pelo clube do Restelo.
“No Sporting, estive só de passagem. Já sabia que não iria jogar muito, porque tinham o Peyroteo, que era um senhor. Apesar de ter feito um brilharete na época anterior, não o iam tirar para me meter a mim. Ainda joguei com os ‘cinco violinos’, fui titular num jogo em Bilbau”, contou.
As recentes polémicas entre o Belenenses e a SAD não foram ignoradas por Manuel Andrade, que não compreende o facto de a SAD ter ficado com a equipa da I Liga, pois afirma que o verdadeiro clube é aquele que milita, atualmente, na segunda divisão distrital de Lisboa.
“Não consigo compreender como é que um clube tem uma equipa na I Liga e outra nas distritais. Se por acaso o das distritais chega lá acima, estou para ver como resolvem isso. A SAD é uma coisa que existe há meia dúzia de anos e o clube tem 100 anos. A primeira categoria do futebol devia pertencer ao clube e não à SAD, que é apenas uma parte administrativa”, disse.
Apesar de reconhecer não gostar muito de ver o futebol português, preferindo a Liga inglesa, Manuel Andrade revelou ter uma admiração especial pelo treinador Jorge Jesus, que considera estar a fazer “um trabalho extraordinário” e que os jogadores entendem as suas ideias de jogo.
“O futebol evoluiu em relação à minha altura. Tenho uma admiração muito especial pelo treinador Jorge Jesus, que revolucionou o futebol e tem feito um trabalho extraordinário por onde passa. Sabe falar com os jogadores, que percebem sempre aquilo que ele quer”, confessou.
O Belenenses, fundado em 23 de setembro de 1919, comemora 100 anos de existência segunda-feira, numa data assinalada por cerimónias religiosas e homenagens a grandes figuras do clube, como Pepe, Matateu, Vicente Lucas e o plantel campeão nacional de futebol, em 1945/46.
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