Jorge Jesus foi, esta terça-feira, um dos convidados do Fórum de Treinadores da Associação Nacional de Treinadores de Futebol, que está a decorrer em Portimão.

O treinador português, sem clube desde que deixou o Al-Hilal, falou da surpreendente campanha de Rui Vitória na Arábia Saudita, elogiou Bruno Lage e traçou as comparações entre João Félix e Bruno Fernandes.

Regresso a um esquema de três centrais: "Quando comecei a minha carreira, utilizei três centrais, muito por culpa do Cruyff. Os meus primeiros 10 anos foram em 3x4x3 ou 3x5x2. Hoje mudei para outro sistema. Para mim, a evolução do futebol vai partir para isso: para que os treinadores e os jogadores, no próprio jogo, mude de sistema. É como no andebol! É o desporto onde há mais alterações no sistema tática ao longo do jogo. Jogar com três jogadores a partir de trás é mais difícil, de ensinar e de jogar. A maior parte dos jogadores não começa a jogar com três mas sim com um quarteto defensivo. São formados com uma ideia de jogo diferente. É um sistema que a mim me apaixona. Na Arábia joguei assim algumas vezes. E quando voltar ao trabalho, vou tentar novamente que a minha equipa conheça mais um sistema. Isto é um trabalho diário. Tem de haver uma evolução da ideia de jogo. Tanto a defender como a atacar."

Elogios a Nuno Espírito Santo: "O futebol holandês olha muito bem o futebol de ataque, mas não sabe defender. Quer dizer, agora já sabem. Já aprenderam alguma coisa. Em Inglaterra os treinadores estão à procura de conhecer este sistema. O NES, por exemplo, está a fazer um grande trabalho. O Conte, no Chelsea, foi campeão assim."

João Félix e Bruno Fernandes: "São dois grandes jogadores. São diferentes, mas neste momento o Bruno tem sido mais importante para o Sporting. O Sporting não está tão forte coletivamente com o Benfica e isso faz notar a sua importância. O João Félix é diferente: joga mais perto do golo, tem movimentações diferentes e é mais fácil de marcar e anular. Mas o João Félix é um jovem que vai ter um futuro muito risonho pela frente. Vai ser um dos grandes craques do futebol português dos próximos anos, mas não nos podemos esquecer que só tem 19 anos."

Jogo da Taça entre Sporting e Benfica: "É uma meia final. Todos os jogadores gostam de esta no Jamor e para lá chegar o Sporting tem de afastar o Benfica. No ano passado afastou o FC Porto... Ouvi o Bruno Fernandes recentemente a falar nisso, de que querem voltar ao Jamor, porque no ano passado foi um dia muito triste. Foi triste para todos nós, não só por perder a final, mas por tudo o que se passou. O Benfica tem vantagem de um golo, mas penso que será um excelente jogo."

Onde vai seguir o jogo? "Vou ver ao vivo. Serei um espectador normal, igual aos outros. Se não derem pela minha presença, melhor, para ver o jogo e vir embora."

Gestão de Bruno Lage: "A prioridade é o campeonato, mas numa meia-final com o teu rival não podes fazer gestão calculada. Tens de jogar tudo para estar na final, de meter os trunfos todos. Mas cada treinador é que sabe, pois são eles quem trabalha com os jogadores."

Episódios na Arábia Saudita: "Tenho algumas situações giras do que é trabalhar na Arábia Saudita. Eles rezam cinco vezes por dia e temos de coordenar isso. Em vésperas de jogo, eles não costumam trabalhar de manhã. Primeiro, porque é muito calor e depois por causa dos hábitos: primeira reza é às 5h da manhã, depois tomam o pequeno-almoço, dormem e só acordam às 11h e meio-dia. Houve um dia em que marquei um trabalho de ginásio de manhã, pedi ao Márcio Sampaio para meter um ambiente relaxado, com música (coisa que eles não gostam), com exercícios de relaxamento. No final, houve cinco que nem se levantaram. Estavam a dormir! Passaram-se cinco minutos, dez minutos… nada! Continuavam a dormir. Percebi que não podia treinar de manhã, porque eles não dormem o tempo que precisam."

Rui Vitória na Arábia Saudita: "Para mim tem sido surpreendente. O Rui Vitória estava a três pontos, depois em joguei fora e ganhei 5-1 e ele perdeu com a equipa do Pedro Emanuel, ficou a seis. Entretanto, nessa semana saio e ele fez uma recuperação espetacular. Recuperou sete pontos e agora tem um ponto de avanço. Neste momento dou-lhe oitenta por cento de possibilidades de ser campeão. Faltam cinco jogos, ele seguramente vai manter aquele ponto. O Al Hilal é muito melhor do que o Al Nassr, pensava que esta equipa ia ser campeã e que até ia aumentar a vantagem pontual, mas o Rui Vitória está de parabéns. Para os treinadores portugueses é muito bom."

Já ultrapassou os incidentes de Alcochete? "Ultrapassei rapidamente o que se passou, mas é óbvio que fica na mente. Ainda assim, isso não me impediu de ser melhor ou pior treinador ou de continuar a minha carreira. Foi um dia triste para o Sporting e para o futebol português, mas que nunca mais acontecerá. Servirá de exemplo para todas as claques. Já passou e agora há que caminhar como é normal e natural."

FC Porto e a Liga dos Campeões: "Na minha opinião, apesar de o FC Porto ter uma palavra a dizer, pois está próximo de chegar a uma final, penso que em Portugal é difícil qualquer um dos grandes chegar à final. Não é impossível, mas cada vez há mais diferença no plano económico. Neste momento o FC Porto está próximo e os seus jogadores têm esse sonho, mas digo que há equipas muito fortes pela frente."