Quarta-feira, 21 de maio de 2003. A cidade de Sevilha enche-se de escoceses e portugueses que se deslocam à capital da Andaluzia para verem as suas respetivas equipas disputarem de novo uma final europeia: Celtic e FC Porto eram os adversários da final da Taça UEFA 2002/2003.
Mas antes, voltemos atrás no tempo.
Numa altura em que a segunda competição da UEFA ainda era disputada apenas em eliminatórias, ao contrário do que acontecia com a Liga dos Campeões - desde 1991/92 tinha uma fase de grupos, que só chegaria à Taça UEFA em 2004/2005 - o FC Porto começava a sua caminhada na prova com uma goleada por 6-0 contra os polacos do Polonia Warszawa, na 1.ª mão da 1.ª ronda. A segunda mão trouxe uma derrota por 0-2, insuficiente para impedir a equipa de José Mourinho de rumar à próxima fase.
Depois de bater o Austria Viena por 3-0 na 2.ª ronda (1-0 na 1.ª mão e 2-0 na 2.º), os 'dragões' recebiam os franceses do Lens na 3.ª ronda (equivalente aos dezasseis-avos de final), vencendo por 3-0 no antigo Estádio das Antas, resultado que colocou a equipa portista nos 'oitavos' apesar da derrota por 0-1 em terras gaulesas.
Seguiram-se os turcos do Denizspor, que foram cilindrados por 6-1 no Porto na 1.ª mão, resolvendo quase na totalidade a eliminatória logo no primeiro jogo (na 2.ª mão registou-se um empate a duas bolas). A verdade é que apesar desta equipa 'azul-e-branca' estar habituada a boas primeiras mãos tudo mudou quando surgiu o Parathinaikos pela frente nos 'quartos' impondo uma derrota em casa aos 'dragões' por 1-0 no primeiro jogo.
A reviravolta estava guardada para Atenas, uma semana depois. Derlei marcou logo aos 16 minutos e só 87 minutos depois, já no prolongamento, o avançado brasileiro voltou a marcar colocando o FC Porto nas meias-finais da Taça UEFA.
Ali perto das Antas, também se festejava. Isto porque o Boavista, que se havia sagrado campeão português dois anos antes, derrotava o Málaga nos penaltis e carimbava passagem às meias-finais onde encontrou a equipa... do Celtic.
O Celtic, convém recordar, chegava às 'meias' depois de deixar pelo caminho Blackburn, Celta de Vigo, Estugarda e Liverpool e defrontava os 'axadrezados' por um lugar na final de Sevilha.
Voltando ao Estádio das Antas: o FC Porto recebia os italianos da Lazio, que colocaram os 'dragões' em desvantagem logo aos seis minutos com golo de Claudio López. Mas Maniche, do meio da rua, não deixou os visitantes festejarem por muito tempo e fez o empate aos 10 minutos. Derlei aos 28' colocou o FC Porto em vantagem, vantagem que só viria a aumentar na segunda parte, com Derlei a bisar aos 50' e Hélder Postiga aos 56' a carimbarem a reviravolta 'azul-e-branca' em casa e a colocar pé e meio na final de Sevilha.
No mesmo dia, mas na Escócia, o Boavista empatava com o Celtic e trazia a decisão final para o Bessa.
A 24 de abril de 2003, Boavista e FC Porto lutavam por conseguir aquilo que o futebol português só viria a alcançar em 2011: duas equipas portuguesas numa final europeia. Ao FC Porto bastou o empate em Roma e aos 'axadrezados' também só bastava um empate, graças ao golo fora. Contudo aos 79 minutos, Larsson (recorde o nome) colocava os escoceses em vantagem, que já não fugiu colocando o Celtic na final de Sevilha.
Voltemos então a 21 de maio de 2003.
O ambiente no Olímpico de Sevilha (diz quem lá estava, porque este que vos escreve tinha só seis anos) era quente, não só atmosfericamente - com uma temperatura acima dos 30 graus - mas também metaforicamente, e não era para menos.
Além da atuação das La Ketchup - "Aserejé, ja deje tejebe tude jebere", contribuir para animar as hostes, convém recordar que FC Porto e Celtic regressavam a uma final europeia depois de longos anos afastados das mesmas.
O FC Porto regressava ao último jogo de uma final europeia 16 anos depois da final de Viena, em que derrotou o Bayern de Munique sagrando-se campeão europeu pela primeira vez na sua história. Além disso tinha a oportunidade de se estrear a vencer a Taça UEFA, troféu que ainda não estava nas vitrines dos 'dragões'.
Por outro lado, e com um jejum bem maior, o Celtic regressava a uma final europeia, 33 anos depois de ter saído derrotado da final da Taça dos Clubes Campeões Europeus pelo Feyenoord em 1970, no Estádio de San Siro e procurava voltar a levantar um troféu europeu depois da vitória na final de 1967, no Estádio Nacional, em Lisboa, frente ao Inter de Milão.
O FC Porto entrava em campo com nomes como Vítor Baía, Jorge Costa, Ricardo Carvalho e Derlei, alguns dos nomes de uma equipa que um ano depois estaria a levantar outro troféu europeu, o maior de todos - mas isso fica para outro dia.
As coisas não começaram da melhor forma para os 'dragões' quando aos cinco minutos, José Mourinho viu-se obrigado à primeira mexida na partida. Costinha, que vinha de lesão muscular, ao limpar uma bola na lateral, lesiona-se. Ainda tenta arrancar com a bola, mas não deu mais. O médio acabou por ter de ver a final do banco, com Ricardo Costa a entrar para o seu lugar ao nove minutos.
A primeira parte foi intensa, com oportunidades de parte a parte, mas havia de ser o FC Porto a estrear o marcador ainda antes de regressar ao balneário.
Aos 45+1, pontapé de baliza de Vítor Baía que faz a bola chegar à entrada da grande área escocesa. Derlei, apesar da pressão dos homens do Celtic, consegue passar a bola para Deco, que com um chapéu, a coloca em Alenichev, que no frente-a-frente com o guarda-redes Douglas, vê o guardião defender a bola, que sobra para Derlei que não desperdiça e faz o primeiro do jogo.
A segunda parte - que começou de forma insólita com um homem todo nú a invadir o campo e a tentar marcar um golo a Baía - vinha recheada com golos, e o Celtic empatou a partida logo aos 47 minutos da partida através de um cabeceamento de Larsson (lembra-se dele?). O FC Porto voltaria a colocar-se em vantagem sete minutos depois, com Deco a colocar a bola em Alenichev que desta vez bate Douglas e faz o 2-1.
A festa 'azul-a-branca' não durou muito porque Larsson voltou a fazer das suas aos 57 minutos, quando depois de um canto voltou a usar a cabeça para empatar a partida.
Fim dos 90 minutos, tudo empatado, seguimos para o prolongamento que tinha a regra do golo de prata: se no golo de ouro o jogo terminava logo, o de prata acabava com o jogo na 1.ª parte do prolongamento, se que o golo fosse marcado nesse período de tempo, caso não houvesse golos seguia-se atá aos 120 e foi o que aconteceu neste caso.
O Celtic ficou reduzido a dez logo nos primeiros minutos, quando Baldé viu o segundo amarelo no jogo, mas o golo da vitória só acabaria por surgir no segundo tempo.
Maniche passa para Marco Ferreira que entra na grande área mas permite que Douglas 'limpe' a bola dalí de qualquer maneira. O esférico vai parar aos pés de Derlei que remata, vê a bola ainda a embater no corpo do guarda-redes dos escoceses, mas acaba por fazer abanar as redes do Celtic. Festa lançada aos 115, 'tudo ao molho e fé em Deus', Mourinho de joelhos em lágrimas, emoção que chegava à tribuna com Pinto da Costa visivelmente emocionado, como mostraram as imagens da RTP na altura.
Contudo, ainda faltavam cinco minutos e este Celtic já tinha estragado a festa ao FC Porto por duas vezes. Cinco minutos que nas palavras de Vítor Baía, em declarações à UEFA, "foram os mais difíceis" da sua vida - "sabíamos que eles iriam fazer tudo para chegar ao empate: iam jogar de forma mais direta".
O Celtic bem tentou, com Douglas a subir à grande área, mas a taça já não fugiu aos 'dragões' que voltavam a levantar um troféu europeu 16 anos depois da conquista de Viena. E em boa verdade, seria o primeiro de dois consecutivos. Mas essa história é para outro dia.
*Artigo corrigido às 19h30
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