O documentário “Viveiro”, exibido sábado no Porto/Post/Doc, no Porto, olha para duas personagens de “bastidores” de um clube de futebol, o Sporting Clube Arcozelo, em Vila Nova de Gaia, para contar uma história quotidiana de formação.
O filme de Pedro Filipe Marques, premiado no DocLisboa com o galardão de melhor filme da competição portuguesa, está integrado na secção “Cinema Falado” do festival do Porto e será mostrado pelas 16:30 de sábado, no Teatro Municipal Rivoli.
O campo do clube de Vila Nova de Gaia, distrito do Porto, é território de sobrevivência “às adversidades do vento do Norte” e o sítio onde germinam vários futuros jogadores de futebol, ainda que o centro do filme, “muito recolhido”, refere à Lusa o realizador, se foque antes numa zona mais de bastidores.
É aí que atuam “a Dona Conceição e o Senhor Cunha”, dois roupeiros e ‘faz tudo’ do clube, que sabem o nome de todos os pequenos e ainda deixam tudo preparado, todos os dias, para que nada falte à prática desportiva, das condições do campo às roupas de cada atleta.
Pedro Filipe Marques, de 43 anos, começou por uma ideia “um pouco conceptual” e partiu, depois, para um trabalho de pesquisa de campo, e de campos, que pudessem retratar o peso do futebol de formação como “atividade extracurricular, como dantes era o ballet ou a música”.
Depois de várias pesquisas em Gaia, onde chegou a morar, acabou por chegar ao Arcozelo ao seguir uma série de equipas que jogavam num campeonato para crianças e tentar encontrar um sítio onde também pudesse filmar durante o dia.
“Durante esse processo, um dia entrei no campo do Arcozelo. Estava lá o senhor Cunha, uma das personagens do filme, e abriu-me logo as portas. [...] Disse logo que podia fazer filmagens, foi o extremo do deixar fazer, que era uma coisa que estava a ser difícil, porque até então ou ninguém estava interessado, ou eu não me interessava”, conta o realizador.
Reunidas as autorizações necessárias, sobretudo relacionadas com a filmagem de menores de idade, o cineasta acabou por gostar “logo de imensas coisas que atraíam”, conhecendo depois a Dona Conceição, a fazer ‘par’ com o Sr. Cunha, uma dinâmica a que se junta a cunhada, que também ajuda a tratar do clube e das crianças.
“Havia todo um manancial [para explorar], que eram os dias deles, que me contaram, em que trabalham de domingo a domingo, a lavar as roupas todas, a tratar do campo, e comecei a interessar-me muito por eles”.
O futebol, assim, está lá porque se “ouve constantemente”, mas o espectador vê antes “o que está atrás do futebol”, numa relação entre exterior, o ar livre e um ambiente natural, e o interior, um núcleo “de vida muito prática e com muitas conversas de adultos” em torno dos roupeiros.
Pedro Filipe Marques viu ainda uma série de relações entre “o campo, as personagens, o ambiente, as relações entre as crianças, que chegavam para treinar, e ser um sítio em que se trabalhava durante o dia”.
“Há quase uma coisa de maternidade geral do tomar conta das roupas todas, as máquinas de lavar que nunca param, o trabalho numa zona recolhida, uma espécie de bastidores, que são mais ou menos o núcleo de uma célula a germinar para que as coisas lá fora possam acontecer”, acrescenta.
Daí vem o título de viveiro, pelo ambiente protegido em que as crianças, como “na germinação das sementes” ou na associação entre as redes de baliza e os viveiros de peixes a serem criados, são preparados para irem crescendo, no futebol e na vida.
Ainda assim, “Viveiro” “não é sobre o funcionamento prático de um clube”, mas antes “sobre o estar lá”. “Passa-se no tempo em que eu lá estive, porque não intervenho. É o tempo de estar lá e quem está lá durante o dia, quando não se passa nada”, refere.
Em cima da mesa está a distribuição comercial do filme em 2020, enquanto a obra continua a percorrer o circuito dos festivais, passando desde já por Coimbra, nos Caminhos do Cinema Português, no dia 28 de novembro, entre outras competições a anunciar.
Na sexta-feira, antes da estreia no Porto/Post/Doc, o Sporting Clube de Arcozelo promove uma exibição informal do documentário, produzido pela O Som e a Fúria, com a apresentação de algumas cenas cortadas da versão final, na sede do emblema gaiense.
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