O presidente do Comité Olímpico de Portugal (COP), José Manuel Constantino, falecido no domingo, após a melhor Missão lusa em Jogos, trouxe espírito erudito ao desporto nacional, avalia o professor catedrático e antigo colega de curso Carlos Neto.

"Vai ficar na história pelo seu pensamento crítico, que não era influenciado por questões de natureza política ou de ideologia partidária. Era um homem livre e tinha, acima de tudo, uma capacidade de raciocínio, de oratória e de pensamento crítico absolutamente fora do normal. Naquilo que lhe era possível fazer, dentro dos condicionamentos existentes no financiamento e nas políticas do país, desbravou um caminho que fica imerso no desenvolvimento desportivo dos portugueses", apontou o docente da Faculdade de Motricidade Humana (FMH) da Universidade de Lisboa, em declarações à agência Lusa.

José Manuel Constantino faleceu no domingo, aos 74 anos, devido a doença prolongada, deixando para trás quase quatro décadas no dirigismo desportivo luso, durante as quais liderou o Instituto de Desporto de Portugal, a Confederação do Desporto de Portugal e o COP, tendo sido eleito como sucessor de José Vicente Moura em 26 de março de 2013.

"Teve um contributo fundamental como presidente do Instituto de Desporto de Portugal e em várias instituições. Tentou seguir os grandes princípios do olimpismo com profundidade e organização, apelando aos valores e à ética no desporto de formação e de alta competição. Vários governos passaram por si desde 2013, mas manteve sempre um projeto único no COP", notou, evocando o primeiro licenciado em Educação Física (1975) na presidência da entidade máxima do desporto em Portugal.

José Manuel Constantino estava prestes a terminar o terceiro e último mandato no COP, organismo que presidiu nas duas melhores Missões nacionais a Jogos Olímpicos, com a conquista de quatro medalhas em Tóquio2020 e Paris2024, volvida a estreia no Rio2016.

"Era um homem extremamente culto, que buscava sempre conhecimento e aprofundava questões relacionadas com as políticas do desporto. Tinha uma visão muito esclarecedora e iluminada sobre como deveria ser o desenvolvimento desportivo em Portugal", frisou Carlos Neto, ao recordar um "trabalho para a história" na autarquia de Oeiras, onde o seu amigo dirigiu o Departamento dos Assuntos Sociais e Culturais, entre 1996 e 2002, e o Conselho de Administração da empresa Oeiras Viva, de 2006 a 2013.

Autor de livros e artigos publicados sobre desporto, Constantino era considerado um dos grandes pensadores sobre o fenómeno em Portugal, sendo mesmo reconhecido com os títulos de Doutor Honoris Causa pelas Universidades do Porto (2016) e de Lisboa (2023).

"Além das qualidades pessoais, ele tinha uma grande capacidade académica, mas também técnica, científica, pedagógica e profissional. Deu um contributo inestimável do ponto de vista das lutas estudantis durante e depois do 25 de Abril, até à criação e integração dos Institutos Superiores de Educação Física na universidade. Essa é uma das suas grandes conquistas e foi algo fantástico", pontuou.

Em novembro de 2023, Carlos Neto foi padrinho do doutoramento Honoris Causa atribuído pela FMH a José Manuel Constantino, que recebeu as insígnias do reitor da Universidade de Lisboa, Luís Ferreira, num momento solene testemunhado por diversas personalidades, incluindo o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

"A última entrevista dele [à revista Visão, em julho] é de um sábio, porque coloca, de forma muito clara, questões sobre o plano estratégico do desenvolvimento desportivo nacional e diz tudo aquilo que é fundamental. Deixou esse legado antes de morrer, assim como é extraordinário que tenha morrido na noite de encerramento dos Jogos Olímpicos Paris2024. É um homem que deixa saudades, pois tinha uma grande capacidade de liderança, de convívio e de amizade para com os seus semelhantes e o povo português", admitiu.