A sorte é a divisa do crescente fenómeno das apostas desportivas em Luanda, um escape para o desemprego de muitos jovens, sobretudo agentes promotores e apostadores, cujo rendimento diário pode ultrapassar os 100.000 kwanzas (182 euros).

O jogo tem sido o recurso de muitos angolanos, sem emprego e com a necessidade de se sustentarem, que tentam diariamente a sua sorte em cabines de apostas ou bancadas improvisadas, facilmente visíveis por quem circula em Luanda.

Os agentes promotores, maioritariamente das operadoras Primeira Aposta (Premier Bet) e Mota, Tavares & Barros (Elephant Bet), afirmam que o número de apostas desportivas aumenta todos os dias, um crescimento que se traduz também nos seus rendimentos mensais.

As apostas desportivas, em grande parte para jogos dos campeonatos da Europa, têm um valor inicial de 200 kwanzas (30 cêntimos) e atingem até 5.000 kwanzas (nove euros), independentemente das condições e “habilidades” dos apostadores.

Rodeado de vários apostadores, Guilherme de Assunção Benjamim, agente da Premier Bet, tem a sua bancada improvisada na rua Lueji Ankonda, distrito urbano do Sambizanga e diz que o ofício requer “muito esforço e vontade”.

“Porque se não tiveres vontade para trabalhar não vais conseguir”, disse à Lusa, referindo que naquele perímetro, onde trabalha há três meses, a procura pelos ‘tickets’ (fichas) acontece mais no começo e no fim do dia.

As máquinas, uma espécie de mini-impressoras expostas na mesa dos agentes, têm capacidade para emitir até 90 ‘tickets’, dos quais 80 vão para os apostadores. Os restantes são ‘tickets’ no valor de 10.000 kwanzas (18 euros) para bónus, em dias em que há mais jogos e de grande procura.

O bónus é disponibilizado pela empresa como forma de estimular os jogadores que mais apostas fazem em dias de grandes duelos, sobretudo nos campeonatos europeus.

Uma máquina eletrónica por cima da bancada e um rolo de papel para imprimir os ‘tickets’ são os instrumentos de trabalho de Guilherme, 26 anos, que no final do dia apresenta um relatório das receitas arrecadadas junto do operador.

Cada máquina tem um limite. “Esta máquina, por exemplo, o limite é de 80 ‘tickets’ com ‘voucher’ (comprovante) de 10.000, propriamente isso dá 90 ‘tickets’”, referiu, dando conta que o seu rendimento diário varia em função da procura e do número de fichas vendidas.

“Se tirares quatro dias a emitires ‘tickets’ e ‘voucher’ acredito que podes encontrar acima de 50.000 kwanzas [89 euros] na conta que já dá para pelo menos fazer alguma coisa”, acrescentou, considerando ser este um mecanismo para não estar desempregado.

“De momento é (o trabalho) que me apareceu e tinha que aguentar com isso, agora ficar sentado acho que não é o certo”, rematou Guilherme de Assunção Benjamim.

À bancada deste agente da empresa Premier Bet, cuja cor verde renova a esperança de quem ali acorre para tentar a fortuna, o jovem Nelson Mandela, 23 anos, afirma que com as apostas desportivas se “ganha sempre qualquer coisa, dependendo da sorte”.

“Já ganhei sim muitas vezes, vale a pena apostar, aqui mesmo o que vale é a sorte, porque há muita gente que também está a ganhar e a jogar”, disse à Lusa.

Quando há mais jogos, sobretudo aos fins de semana, há mais apostas e destas surgem o rendimento dos agentes, como disse Mateus Paulo, há quatro anos na atividade, em mais um dia de atendimento aos apostadores.

No interior de um quiosque, uma estrutura de ferro construída para o efeito, Mateus Paulo, agente da empresa Elephant Bet, fez saber que as apostas funcionam muito bem e o dia-a-dia tende a ser melhor para os dois lados, para o agente e apostadores.

Na Estrada Direita de Cacuaco, logo após a Comarca Central de Luanda, Mateus, de 34 anos e há quatro dedicado à emissão e venda de fichas, revelou que o seu rendimento diário varia entre os 40.000 kwanzas (72 euros) e os 100.000 kwanzas (179 euros).

“O limite máximo são 100.000 kwanzas/dia, e no final do mês o rendimento total é consoante as diárias, o trabalho é rentável”, referiu.

A modalidade das apostas, a lista das equipas e as datas dos respetivos jogos de futebol, a qualidade das equipas e as probabilidades de se ter uma ficha vencedora norteiam as conversas de apostadores presentes em locais de apostas.

Frederico António, trabalhador por conta própria, cuja sorte já lhe bateu a porta por quatro vezes, com ganhos que variaram entre os 13.000 kwanzas (23 euros) e os 120.000 kwanzas (218 euros), não dispensa oportunidades de colocar a sorte à prova.

“Sim, mais um dia de aposta e vamos ver onde vai bater a sorte, já ganhei quatro vezes e vale a pena apostar”, afirmou, após ver a sua ficha imprimida pelo agente Mateus Paulo.

“Isso é praticamente uma matéria, onde deves estar por dentro do sistema de jogo e também tens de conhecer as equipas, mas outros que não conhecem as equipas também ganham e por isso é que se chama sorte, é ir apostando para se ter probabilidade de ganhar”, acrescentou ainda o apostador.

O Instituto de Supervisão de Jogos (ISJ) angolano anunciou, em finais de janeiro passado, que 26 entidades estão autorizadas a operar no país em três segmentos de jogos, nomeadamente jogos de fortuna e azar, jogos sociais (mais explorados na componente de apostas desportivas) e jogos online.

A entidade, tutelada pelo Ministério das Finanças, arrecadou cerca de 5,8 mil milhões de kwanzas (10,5 milhões de euros) no terceiro trimestre de 2022, arrecadações lideradas pelos jogos sociais, que representarem um aumento de 185 por cento em relação ao igual período de 2021, como noticiou a Lusa.