A aplicação do regime de ‘lay-off’ simplificado pelos clubes portugueses de futebol em relação aos seus jogadores e treinadores face à pandemia de covid-19 é “dificílima”, considera o advogado Gonçalo Almeida, especialista em Direito do Desporto.

Em declarações à Lusa, o jurista faz uma distinção entre os demais funcionários de um clube ou de uma SAD e aqueles que têm contratos de trabalho de natureza desportiva, nomeadamente futebolistas e treinadores, sublinhando que a suspensão das competições é um argumento “insuficiente” para eventuais adesões ao regime previsto pelo Governo para apoiar as empresas perante a propagação do novo coronavírus no país.

“O ‘lay-off’ implica a suspensão da atividade laboral. Vamos suspender um contrato porque as competições não têm lugar? Parece-me, manifestamente, insuficiente. A prestação de um praticante desportivo vai muito além dos 90 minutos. O treino é diário, o repouso faz parte da obrigação do atleta, o cuidar da sua integridade física, etc. Se vamos suspender o contrato de trabalho, significa que o jogador pode abdicar de treinar”, nota.

No entender de Gonçalo Almeida, que trabalhou para a FIFA entre 2001 e 2006, como os jogadores precisam de manter a forma física, com vista ao futuro regresso às competições, “não se pode suspender a atividade”, invocando ainda os planos de treino e de recuperação individuais elaborados pelos clubes para este período de quarentena.

“Os jogadores estão a treinar em casa, têm planos específicos que executam diariamente. Só não estão a jogar. Falar num ‘lay-off’ e na suspensão do contrato de trabalho não me parece que seja adequado ou proporcional e necessitaria de ser devidamente adaptado, caso um tribunal entendesse, e justificado em que condições o ‘lay-off’ era aceitável”, acrescenta.

Por outro lado, o especialista em Direito do Desporto vê como “perfeitamente possível” o enquadramento da medida para trabalhadores com contratos de natureza não desportiva, elencando nesse lote “dirigentes, contabilistas, médicos ou fisioterapeutas”, entre outros.

Em Portugal, o Belenenses SAD tornou-se no primeiro clube da I Liga de futebol a anunciar a entrada parcial em ‘lay-off’ em 06 de abril. Um exemplo seguido no mesmo dia pela SAD do Desportivo de Chaves, da II Liga, que confirmou, ao abrigo deste regime, o corte de um terço do salário dos jogadores, mas esclareceu que irá além do limite máximo de 1.905 euros para os ordenados, assegurando a diferença suplementar até perfazer dois terços do vencimento.

Ato contínuo, a decisão de aderir ao ‘lay-off’ entre os clubes portugueses foi imediatamente criticada pelo Sindicato de Jogadores Profissionais de Futebol. Em comunicado, o organismo liderado por Joaquim Evangelista classificou como “escandaloso” o recurso ao expediente legal, reiterando que “o futebol profissional pode e deve comportar-se de outra forma”.

De acordo com um comunicado do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, datado de 04 de abril, pelo menos 31.914 empresas, representando um universo de 552 mil trabalhadores, já tinham solicitado a candidatura ao ‘lay-off’ simplicado.

Em Portugal, registaram-se 311 mortes e 11.730 casos de infeções confirmadas pelo novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19.

O país, onde os primeiros casos confirmados foram registados no dia 02 de março, encontra-se em estado de emergência desde as 00:00 de 19 de março e até ao final do dia 17 de abril, depois do prolongamento aprovado na quinta-feira na Assembleia da República.