"A escolha deste treinador assenta nesses princípios, quisemos um treinador com competência técnica e tática, capacidade de liderança, de gestão do grupo e de comunicação e entendemos que Marcel Keizer é o homem com perfil para este projeto. Keizer é um treinador jovem, ambicioso, apaixonado pelo que faz, sem medo de apostar nos jovens e que procura ter sempre um cunho muito próprio nas suas equipas: futebol atrativo e dominador". Estas foram algumas das palavras de Frederico Varandas, aquando da apresentação de Marcel Keizer, exatamente numa pause para jogos das seleções, depois da saída de José Peseiro.

Entrada à todo o gás com o 'Keizerball'

Keizer chegava a Alvalade com o selo da formação, pelo trabalho que tinha desenvolvido no Ajax, pelo parecia ser o homem certo para o cargo, apesar de poucos o conhecerem em Portugal.

Entrou de rompante, com duas goleadas fora de casa: 4-1 na quarta eliminatória da Taça de Portugal no terreno do Lusitano Vildemoínhos e 6-1 no terreno do Karabakh, na fase de grupos da Liga Europa. Foram sete vitórias seguintes, todas elas por números expressivos, como os 4-1 ao Aves e os 5-2 ao Nacional e ao Rio Ave. O futebol era atrativo, sim senhor e Varandas parecia ter acertado na sua escolha.

A primeira derrota ao cabo de oito jogos, veio colocar um pouco de travão na euforia dos adeptos. O Vitória de Guimarães de Luís Castro mostrou que, com organização, não era assim tão difícil anular o que já era chamado de 'Keizerball'. O Tondela foi o segundo a faze-lo, também para a Liga, duas jornadas depois do Guimarães, num jogo onde o Sporting jogou com mais um durante 35 minutos e até sofreu o tento da derrota a jogar com mais um.

A verdade é que, tirando os primeiros oito jogos, o tão prometido futebol avassalador foi 'morrendo' com o tempo, até porque os técnicos portugueses começaram a perceber como podiam explorar as debilidades leoninas. Bruno Fernandes ia resolvendo muitos problemas coletivos da equipa, como atestam os seus 32 golos e 18 assistências, numa época estrondosa do médio leonino.

Pior período coincide com primeiro troféu

O pior período de Keizer aconteceu entre 07 de janeiro e 25 de fevereiro de 2019. Após a derrota com o Tondela, empata com o FC Porto em casa, elimina o Feirense da Taça e ganha ao Moreirense para a Liga, antes de iniciar uma série de cinco jogos sem ganhar. Nesse perigo, empata com FC Porto mas vence nos penáltis e conquista a Taça da Liga, numa vitória que lhe 'caiu do céu', já que empatou aos 93 minutos, de grande penalidade, num encontro onde os 'dragões' foram superiores. Nesse período, empatou com o Vitória de Setúbal e com o SC Braga, perdeu duas vezes para o rival Benfica, na Taça de Portugal e Liga, sendo que uma das derrotas foi em casa por 4-2, para o campeonato. Seguiram-se uma derrota e um empate com o Villarreal e consequente afastamento da Liga Europa, e novo empate, agora para a Liga, com o Marítimo.

Mas dez vitórias seguidas, incluindo a que eliminou o Benfica nas meias-finais da Taça de Portugal, trouxe algumas esperanças a Marcel Keizer no Sporting. Até ao final de 2018/2019, empatou com o Tondela e perdeu com o FC Porto mas venceu a Taça de Portugal, conquistada novamente aos 'dragões', outra vez nas grandes penalidades, num encontro onde os de Conceição voltaram a ser melhores mas o Sporting mais eficaz.

O holandês terminava a época com dois troféus conquistados, num ano difícil para o Sporting, depois dos acontecimentos de Alcochete, da destituição de Bruno de Carvalho de presidente, da nomeação de uma comissão de gestão liderado por Sousa Cintra e da saída de vários jogadores, alegando justa causa, após serem agredidos pelos adeptos na célebre invasão a Academia de Alcochete no final de maio de 2018.

Pré-época preocupante antes da humilhação frente ao Benfica

2019/2020 podia ser a época de Marcel Keizer. O holandês de 50 anos ia começar do zero, escolher os jogadores que se adaptassem à sua filosofia, aproveitar os jogadores da casa que regressaram após empréstimo e fazer uma equipa capaz de atacar os títulos. Só que não se viu nada disso. Na pré-época começaram as preocupações quando os adeptos leoninos perceberam que os jovens jogadores como Matheus Pereira, Gelson Dala, Iuri Medeiros, Daniel Bragança, entre outros, não contavam para o treinador, apesar de ter chegado com o selo de técnico que aposta nos jovens. Ainda por cima, a equipa não foi capaz de ganhar nenhum dos encontros disputados na pré-época.

O humilhante derrota com o Benfica na Supertaça de Portugal deixava a nu as fragilidades de uma equipa que dependia em demasia das ações individuais de Bruno Fernandes, mas também de um treinador que parecia não ter um plano B: jogou com três defesas centrais, algo que não experimentou na pré-época e mesmo assim ficou muito a mercê dos contra-ataques rápidos típicos do Benfica.

As vitórias com Portimonense e Braga colocaram o Sporting na liderança, que apenas durou uma semana. O Rio Ave foi até Alvalade mostrar o quão banal se tinha tornado o Sporting: uma equipa incapaz de jogar sem bola, que permite que o adversário crie várias situações de perigo junto da sua área.

Mais do alternar entre o 4-3-3 ou o 4-2-3-1 ou o 3-4-3, parte dos problemas do esquema de Keizer está na má ocupação dos espaços, permitindo demasiadas facilidades aos adversários. O Rio Ave conseguiu explorar isso muito bem, daí ter vencido por 3-2 em Alvalade.

Keizer, que disse gostar de apostar nos jovens, deixou essa máxima na Holanda já que em Portugal raramente se viu essa aposta. Numa esquia que depende muito dos alas, deixou sair Iuro Medeiros e Matheus Pereira, com este último a fazer 'estragos' no Championship, depois de ter brilhado na Bundesliga na época passada. Gelson Dala, um médio ofensivo que mostrou muita qualidade no empréstimo ao Rio Ave, foi despachado para a Bélgica. Daniel Bragança nunca teve minutos. E mesmo o craque Gonzalo Plata vai sendo convocado uma ou outra vez e só conta com um minuto de jogo.

Para o Sporting, a saída de Keizer é uma oportunidade para começar do zero, depois do frenético último dia do mercado de transferências, onde viu sair Raphinha, Diaby e Thierry Correia e recebe Jesé Rodriguez, Bolasie e Fernando, todos por empréstimo, todos homens para a frente de ataque. O clube conseguiu manter Bruno Fernandes mas viu partir Bas Dost, o seu principal goleador nos últimos anos.

O holandês, de 50 anos, deixa o clube menos de um ano depois de ter assinado contrato até 2021, e três dias após a derrota sofrida pelo Sporting à quarta jornada, em casa diante do Rio Ave, por 3-2.

A equipa do Sporting, que ocupa o quinto lugar da I Liga, com sete pontos, menos três do que o líder Famalicão, vai ser comandada interinamente por Leonel Pontes, que orientava a formação de sub-23 dos ‘leões’.