Numa carta aberta publicada no 'The Players Tribune' e dirigida a todos os 'pequenos Kylians', Kylian Mbappé olhou para o seu percurso até ao estrelato, recordou obstáculos que teve de ultrapassar, deixou conselhos aos que agora têm os mesmos sonhos que ele tinha há alguns e contou diversos momentos marcantes e curiosos, entre eles o dia em que entrou no carro de Zidane, ou um aperto de mão a José Mourinho e a quatro desconhecidos que estavam com o técnico portugues.

O internacional francês começa por explicar como a infância, passada em Bondy, nos subúrbios de Paris, influenciou o seu crescimento não só como futebolista, mas sobretudo como pessoa. Mbappé conta que o bairro é uma inacreditável mistura de diferentes culturas e salienta que viver nesse local não foi tão negativo como se possa pensar. "Há pessoas com dificuldades em todo o mundo", lembra.

"Quando era criança costumava ver os piores rufias do bairro a levarem as mercearias para a minha avó. Nas notícias essas partes nunca aparecem. Só ouves falar do mau, nunca do bom", destaca Mbappé na carta.

Mbappé explica uma das lições que aprendeu durante a sua juventude, no bairro onde cresceu. "Se andas na rua, vês 15 pessoas numa esquina e só conheces uma, tens duas opções: ou acenas e segues em frente, ou vais lá e apertas 15 mãos. Se passas por lá e só apertas uma mão, as outras 14 pessoas nunca te vão esquecer e perceberão o tipo de pessoa que és", refere.

Um aperto de mão aos amigos de Mourinho como lição de vida

Um ensinamento que Mbappé levou consigo para toda a vida e que lhe serviu até em momentos mais formais, como quando se cruzou recentemente com José Mourinho. "Levei esta parte de Bondy comigo para sempre. Ainda no ano passado, na cerimónia dos prémios 'The Best', estava a com os meus pais e vi José Mourinho do outro lado da sala. Já o tinha conhecido antes, mas ele estava com mais quatro ou cinco pessoas que eu não conhecia", recordou.

"Então, pensei 'Aceno apenas a Mourinho, ou vou lá?'. Decidi ir lá cumprimentá-lo. Apertei-lhe a mão e, naturalmente, fiz o mesmo aos amigos que estavam com ele. 'Bonjour!', aperto de mão. 'Bonjour!', aperto de mão. 'Bonjour!', aperto de mão. 'Bonjour!', aperto de mão", conta. "Foi engraçado, porque todos ficaram surpreendidos", relembra.

Mbappé continua a contar o que se passou a seguir. "Quando nos afastámos, o meu pai sorriu e disse-me: 'Aprendeste isso em Bondy'. É como um reflexo e uma regra pela qual continuo a viver. Em Bondy aprendemos valores que vão muito para além do futebol. Aprendemos a tratar toda a gente da mesma forma", salienta o jogador do Paris Saint-Germain.

À boleia no carro de Zidane

Mbappé também recordou outros momentos, como quando, aos 14 anos, foi convidado a treinar-se uns dias no Real Madrid, numa altura em que Zidane era diretor para o futebol dos 'merengues'. "Quanto tinha 14 anos o meu pai recebeu uma chamada de alguém do Real Madrid a convidar-me para ir a Espanha treinar durante as férias. Foi uma surpresa, porque chegaram mesmo a dizer ao meu pai que era o Zidane que me queria ver. Fui. Era um sonho estar ali".

Mbappé conta, depois, a conversa com Zidane. "Nunca esquecerei esse momento. Chegámos ao aeroporto e Zidane recebeu-nos no parque de estacionamento. Cumprimentámo-nos e, no carro, perguntei-lhe: 'tiro os sapatos?'. Não sei porque disse aquilo. Talvez porque, afinal de contas, era o carro do Zidane. Eu tinha posteres dele e do Cristiano no meu quarto. Parecia que estava a sonhar".

O avançado termina: "Às vezes, mesmo quando estás a viver algo, não deixa de parecer um sonho. Foi o que senti na Rússia [com a conquista do título mundial]. Todos nós somos uns sonhadores. E, felizmente, sonhar é de graça", escreve Mbappé a fechar a sua carta.