“Culturalmente, o desporto e a escola andaram sempre de costas voltadas, mas houve uma alteração de paradigma. O sindicato, a federação e alguns jogadores de modo próprio começaram a reconhecer a importância de estarem preparados para exercer outra atividade quando terminarem a carreira”, referiu à agência Lusa Joaquim Evangelista.

Publicado em 2019, o inquérito do SJPF à literacia dos futebolistas profissionais lusos concluiu que mais de metade dos 424 entrevistados fez o 12.º ano (58,5%), um terço ficou pelo ensino básico (33,3%) e cerca de 8% obteve um diploma superior.

“Em 2003, entre 60% a 90 % dos jovens futebolistas não tinha aproveitamento escolar ou abandonava os estudos em detrimento da modalidade. A esmagadora maioria dos atletas profissionais não tinha a escolaridade obrigatória concluída, situação visível no número de casos malsucedidos na transição para outra atividade”, comparou.

Joaquim Evangelista sinaliza uma profissão de “desgaste rápido e duração limitada”, marcada por “vínculos temporários e elevada mobilidade e sinistralidade”, seja por lesão ou doença prolongada, fatores que afetam as “capacidades de ganho e progressão”.

“As dificuldades também são potenciadas por incumprimentos salariais, falta de mecanismos de licenciamento e controlo financeiro eficazes, pouca adaptação do sistema de segurança e proteção social à atividade dos desportistas profissionais, carga fiscal intensa e ausência de incentivos à poupança durante a carreira”, listou.

Fixando a educação como a “prioridade do futebol português”, o SJPF lançou em 2016 um Gabinete de Educação e Formação procurado por “centenas de jogadores”, assente na conclusão de níveis académicos e na atribuição de bolsas para cursos específicos.

Um ano depois, o conceito passou a ser partilhado com a Portugal Football School, projeto criado pela Federação Portuguesa de Futebol (FPF) para alargar a oferta formativa aos agentes da modalidade e impulsionar o amadurecimento de carreiras duais, aumentando as possibilidades de empregabilidade no futuro, dentro e fora do contexto desportivo.

“É a medida mais eficaz para combater o insucesso na transição de carreira: ao compatibilizar a certificação educativa com a vida desportiva, baixa em larga escala o período crítico entre o término da carreira e o momento em que o ex-profissional de futebol está apto ao exercício de uma nova atividade”, examinou.

Joaquim Evangelista pretende disseminar esta vertente qualificadora, em particular na “capacitação financeira” dos atletas, depois de 92,2% terem confirmado hábitos de poupança enquanto competiam, dos quais apenas 7% deixam essa gestão nas mãos de terceiros.

“Queremos ainda desenvolver mecanismos de apoio social, através de um serviço de acompanhamento psicossocial aos que não puderam beneficiar deste tipo de programa. Vários antigos jogadores estavam convencidos de que o futebol lhes garantia tudo, mas mesmos os mais mediáticos não estabilizaram só pelo estatuto”, avisou.

Além da intervenção educativa, o SJPF fomenta com a Sociedade Portuguesa de Psicologia do Desporto apoio psicoterapêutico aos jogadores no ativo ou em fase de transição, tendo erguido com a FPF em 2017 um inédito fundo de pensões, que pode ser acedido uma vez após a saída dos relvados, sem comprometer a contribuição geral.

“Entregámos a todos os grupos parlamentares a proposta para alterar o código do IRS e o regime jurídico dos fundos de pensões, permitindo o acesso em fim de carreira, lesão incapacitante ou desemprego de longa duração”, concluiu o líder sindical, determinado a lutar contra o rótulo de que todos os futebolistas são milionários e privilegiados.