A Superliga chinesa de futebol arranca esta semana com dezenas de ‘estrelas’ internacionais, mas a falta de formação dos jovens jogadores chineses compromete as metas do país para a modalidade, segundo alguns treinadores portugueses.

"Eles têm aqui um grande problema, que já muita gente identificou: a falta de formação dos jogadores chineses", apontou à agência Lusa o treinador português Jorge Castelo, que foi adjunto do brasileiro Mano Menezes nos chineses do Shandong Luneng, na época de 2016.

Lavezzi, Hulk, Óscar, Gaitán ou Mascherano são alguns dos nomes sonantes do ‘desporto-rei’ que alinham em equipas do principal escalão chinês, que conta com os técnicos portugueses Paulo Bento (Chongqing Dangdai Lifan), Vítor Pereira (Shanghai SIPG) e Paulo Sousa (Tianjian Quanjian).

O investimento chinês na modalidade reflete o desejo de Pequim de converter o país numa potência futebolística à altura do seu poder económico e militar.

A única vez que a China participou num Mundial foi em 2002, mas o presidente chinês, Xi Jinping, quer colocar o país entre as melhores seleções do mundo até meados do século.

Jorge Castelo, que é professor de metodologia de treino de futebol da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias de Lisboa, e fez parte de equipas técnicas de Benfica e Sporting, alertou, no entanto, para a importância em edificar as bases primeiro.

"A China tem 130 vezes mais população do que Portugal e não encontra nem um Cristiano Ronaldo, ou um treinador ou árbitro de topo", afirmou.

O português apontou o Shandong Luneng, no qual esteve durante três anos, como exemplo de um sistema de formação incapaz de produzir talentos, apesar do investimento.

O Luneng tem um centro de estágio para equipa principal com seis campos e cerca de 400 funcionários, a 200 quilómetros da sua academia, que acolhe 300 jovens futebolistas, e inclui 36 campos relvados, escola, restaurantes e hospital.

"Existe ali da melhor maquinaria e infraestrutura do mundo, mas faltam técnicos e organização. Não é o dinheiro que resolve o problema, mas as ideias”, sublinhou Castelo.

O treinador Paulo Santos, que no ano passado venceu os Jogos Nacionais da China - uma espécie de Jogos Olímpicos chineses -, ao comando do Shaanxi Chang'an Athletic, reconheceu que "a rede de prospeção chinesa é ainda muito curta".

"Muito provavelmente um (Lionel) Messi ou um Cristiano Ronaldo estarão por aqui. Só que o miúdo deve ser muito pobre e não tem acesso ao futebol. Eles precisam de ramificar completamente a sua rede de prospeção", disse Paulo Santos, à Lusa.

A entrada de capital no futebol terá mesmo agravado o problema, com os clubes a agarrarem-se a contratações milionárias - o mais caro de sempre é o médio brasileiro Óscar, que custou 71 milhões de euros ao Shanghai SIPG - para aumentarem a competitividade, negligenciando o jogador local.

A Associação Chinesa de Futebol aprovou, entretanto, uma taxa de 100% sobre contratações acima dos 6,2 milhões de euros (45 milhões de yuan), visando travar o ‘boom' dos gastos com jogadores estrangeiros, que em 2017 se fixou em cerca de 409 milhões de euros.

O antigo defesa sérvio Marko Zoric, que chegou à China em 2005, disse concordar com a medida e lembrou à Lusa que na sua altura havia "mais qualidade" entre os jogadores chineses.

"Havia quatro ou cinco jogadores chineses em equipas europeias", recordou Zoric, referindo-se a Li Tie e Li Weifeng, que alinharam nos ingleses do Everton e Shao Jiayi, que atuou nos alemães do Energie Cottbus.

Zoric, que na China jogou no Tianjin Teda e no Shenzhen Asia Travel, notou que a maioria dos jogadores estrangeiros a rumar ao país ocupa posições de ataque, tirando oportunidades aos jovens jogadores locais.

"Hoje tens 32 equipas profissionais na China. Em todas, o ponta de lança é estrangeiro. Sendo assim, quem é que vai marcar pela seleção da China", questionou.